Tudo indica que o próximo presidente será definido no photochart, mas estamos assistindo ao maior escândalo de abuso do poder econômico e político já visto em eleições. Merval Pereira:
A
pergunta de um milhão de dólares (talvez valha até mais) é da antiga,
porém atualíssima, piada política eternizada por Marco Maciel, ex-vice
de Fernando Henrique e político de respeito de Pernambuco. Numa de suas
disputas majoritárias, o marqueteiro disse a ele, satisfeito, que as
curvas dele e do adversário estavam se cruzando, a sua ascendente, a do
outro descendente. Maciel calmamente perguntou:
—
Elas se cruzarão antes ou depois da eleição? Quando as curvas vão se
aproximando, diz-se no jargão das pesquisas eleitorais que “a boca do
jacaré está se fechando”. É o que parece estar acontecendo na disputa
entre o presidente Bolsonaro e o ex-presidente Lula, mas esse jacaré é
um tanto preguiçoso, fecha a boca devagarinho, pontinho a pontinho. No
momento já existe um empate técnico no limite da margem de erro, de dois
pontos percentuais para mais ou para menos.
Como
os institutos de pesquisas fazem questão de ressaltar, pela primeira
vez em anos, que o resultado não é um prognóstico, mas uma fotografia da
realidade no momento em que são realizadas, não há mais favoritismo na
corrida presidencial. Essa situação deve-se a que os eleitores estão
obrigados a escolher entre os dois candidatos mais rejeitados da
campanha, uma situação instável que pode ser abalada por qualquer
movimento de última hora. Mesmo que 94% dos pesquisados declarem não
pretender mudar de voto, tanto em Lula quanto em Bolsonaro.
É
inegável que estamos assistindo ao maior escândalo de abuso do poder
econômico e político a favor de um incumbente já visto desde os tempos
da República Velha. Bolsonaro criou tal clima de suspeição contra o
Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que
se tornou inimputável. Por muito menos já se cassou o mandato de
prefeitos e governadores eleitos, e isso poderá vir a acontecer caso
Bolsonaro se reeleja, mas só que tarde demais.
Os
processos do TSE são lentíssimos. Basta lembrar que a ação de abuso
econômico do candidato do PSDB em 2014, Aécio Neves, que perdeu a
eleição por uma margem mínima (51,64% para Dilma e 48,36% para ele,
diferença de 3,4 milhões de votos), foi julgada tanto tempo depois que
Dilma já havia sido impedida pelo Congresso, e o vice Michel Temer
governava.
No
momento, segundo as pesquisas, a diferença entre Bolsonaro e Lula é
semelhante, e tudo indica que a decisão será no photochart, a favor de
um ou de outro. Isso nos traz uma preocupação adicional: será que o
presidente Bolsonaro, perdendo por uma margem estreita, aceitará o
resultado ou tentará melar a eleição alegando fraude, como vem
insistindo em acusar? E Lula, perdendo nas mesmas circunstâncias, como
reagirá?
Certamente
entrará no TSE com uma ação de abuso de poder contra Bolsonaro, com
excesso de provas a apoiá-lo. Mas o TSE estará em condições de dar uma
resposta rápida a uma crise institucional tão grave? A postura do
Ministério da Defesa em relação ao relatório sobre as urnas eletrônicas é
um sinal de alerta. O ministro, general Paulo Sérgio Nogueira, recuou
do compromisso que assumira com o presidente do TSE, ministro Alexandre
de Moraes, e não entregou o relatório sobre o primeiro turno. Disse que
somente depois do segundo turno terá uma visão geral da questão.
Essa
atitude afrontosa foi tomada, tudo indica, por pressão do presidente
Bolsonaro, que quer manter essa espada de Dâmocles suspensa sobre a
cabeça de Moraes, diga-se da Justiça Eleitoral. Melhor seria se o TSE
tocasse a vida dentro da normalidade, deixando o Ministério da Defesa de
lado. Não entregando o relatório que ameaçara fazer, ficaria claro que
os técnicos militares não encontraram nada. Agora, o relatório volta a
ser uma arma contra a higidez do processo eleitoral, a ser usada caso o
resultado não seja favorável ao presidente.
O
que impressiona é como as Forças Armadas cedem a todos os desejos de
Bolsonaro, colocando-se como seus agentes políticos, o que é uma ameaça à
democracia. Seja qual for o resultado, Bolsonaro já conseguiu ampliar
os limites de sua atuação além dos marcos legais e ficou imune a sanções
mais graves. Reeleito, se sentirá mais forte para apertar o controle
das instituições, inclusive o STF.
Um
Congresso como o eleito agora, presidido pelo deputado Arthur Lira, não
terá pudores para cercear os poderes fiscalizadores que ameaçam a
predominância de políticos fisiológicos e corruptos. É o que tentam
fazer com as pesquisas eleitorais. A reviravolta já está acontecendo,
“com Supremo, com tudo”, como dissera o ex-senador Romero Jucá, alvo de
diversos processos e punido pelo voto.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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