É triste ver o democrata que disputa o Senado pela Pensilvânia mostrar dificuldades de fala e garantir que está plenamente apto para o cargo. Vilma Gryzinski:
Nada consegue competir com as eleições brasileiras, mas a campanha nos Estados Unidos
também tem seus casos estranhos. Um dos maiores envolve a disputa entre
o democrata John Fetterman, um gigante tatuado que defende a liberação
da maconha, e o republicano Mehmet Oz, que ganhou fama como “o médico de
Oprah”, por suas apresentações no extinto programa da apresentadora.
Fetterman,
que é casado com a brasileira Gisele Barreto, sofreu um derrame em maio
e ficou com sequelas de audição e de fala, que procura superar usando
um programa de computador que replica numa tela o que o interlocutor
fala. Mas suas dificuldades ficaram dolorosamente evidentes no debate
que fez com o adversário na terça-feira.
Sua
assessoria vinha conseguindo bloquear questões a respeito, inclusive
invocando o “capacitismo”, nome do reprovável preconceito por condição
física. Mas o debate indicou que ele luta para se expressar, o que é
obviamente um obstáculo para um candidato a senador, um posto que exige
capacidade para processar dados, entender legislações complexas e se
comunicar na tribuna – ou, mais realisticamente, em entrevistas de TV.
Esta
é justamente a especialidade do Doutor Oz, como seu adversário de
ascendência turca ficou conhecido na época do programa de Oprah Winfrey.
Oz é milionário e novato na política. Mesmo assim, é difícil demolir um
candidato acostumado com as câmeras. Nas tentativas feitas até agora,
já desenterraram vários episódios em que ele fala bem realisticamente
sobre um tema recorrente, o funcionamento intestinal.
Também
o acusam de crueldade no tratamento de cães de laboratório na época em
que foi pesquisador num instituto médico de Columbia. Ou de elitismo por
causa de um vídeo feito para apontar a alta nos preços de produtos
alimentícios, no qual mostrou os legumes que sua mulher havia
encomendado para fazer crudités – a pernóstica palavra em francês para
os palitinhos de cenoura e assemelhados que certamente não consta do
vocabulário das massas.
Perder
a eleição por causa de palitinhos de legumes? Vale tudo no momento,
embora Oz, que é cirurgião cardíaco, tenha que tomar cuidado para não
parecer tirar vantagem justamente de uma pessoa afetada por um coágulo
decorrente da condição chamada fibrilação atrial.
À
mediadora que perguntou se estava apto a servir no Senado, o candidato
democrata, que é vice-governador da Pensilvânia, tropeçou nas palavras e
acabou respondendo que estava pronto para “ser servido”. Quem sofre ao
ver participantes de debates tropeçar nas palavras ou no raciocínio não
deve ver esse episódio.
Para aumentar a aflição, a diferença entre os dois candidatos agora oscila entre 1% e 2%.
A
eleição do próximo dia 8 envolve 35 das 100 cadeiras no Senado e todos
os 435 lugares na Câmara dos Representantes. E, obviamente, o futuro dos
planos do governo de Joe Biden. Sem maioria no Congresso, o presidente faz muito pouco, como no Brasil.
A
aprovação ao presidente também conta. Tradicionalmente, as eleições
dessa época são uma espécie de plebiscito: se o presidente vai bem, seu
partido melhora no Congresso; se não, leva “uma sova”, como reconheceu
Barack Obama quando isso aconteceu com ele.
Biden
corre o risco de apanhar também. Na média, 58% dos americanos
desaprovam a condução econômica; 53%, a política externa; 60%, a questão
da imigração; 62%, o combate à inflação.
As
dificuldades de fala de John Fetterman evocam em algumas circunstâncias
os tropeços de Joe Biden. No mais recente dele, o presidente se mostrou
desorientado depois de um pequeno ato no jardim da Casa Branca. Tomou
exatamente o lado contrário que deveria seguir e foi gentilmente
corrigido pelos seguranças. Antes, tinha chamado o novo
primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, de Rashid Sanuk.
O
momento não está para otimismo. A eleição vem precedida pela tensão
pré-FED, que decide na próxima semana se aumenta a taxa de juros em
0,75%, o que “custaria 1,5 milhão de empregos aos americanos”, segundo
escreveu na Fox o empresário e dono de um instituto de pesquisas Mark
Penn.
A “quimioterapia econômica” envolve optar por dizimar empregos ou salvar a aposentadoria futura de milhões de americanos.
“Ninguém mais está falando em Teoria Monetária Moderna, segundo a qual déficits estratosféricos eram sustentáveis”, disse Penn.
A
campanha eleitoral reflete isso? Apontar a malignidade da inflação é um
trunfo dos candidatos republicanos e defender o governo é o ônus dos
democratas.
Uma
tarefa dura mesmo para quem não tem as dificuldades de um candidato
como John Fetterman, que deve ser, obviamente, respeitado, inclusive
pelos que apoiaram a manutenção de sua candidatura.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário