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Em seu novo livro, Woke Racism, o professor e linguista John McWhorter argumenta que esse “despertar” é uma religião que, longe de se opor ao racismo, tende a reforçá-lo. Artigo de Elan Journo:
“Supremacia branca” define a nossa sociedade. Na verdade, a fundação de nossa nação foi em 1619, com a chegada do primeiro navio que transportava escravos africanos. Se você é “branco”, verifique seu “privilégio”. O simples fato de resultados distintos nas escolas é uma prova óbvia de racismo. Negar que você é conivente com isso só prova que você é racista.
Essas ideias são cada vez mais difundidas em salas de aula, auditórios, instituições culturais e locais de trabalho. Não se alinhe ao discurso “desperto” e será perseguido, intimidado ou despedido.
Mas os “despertos” acreditam em quê?
Começando
com pais irados em reuniões escolares, passando por protestos vulgares e
algumas vozes conservadoras, você ouvirá que os “despertos” buscam
minar a sociedade americana, inspirados pela Teoria Crítica da Raça.
Alguns políticos inclusive decidiram bani-la das escolas. Negligenciando
essa reação, algumas vozes progressistas insistem que a Teoria Crítica
da Raça é apenas uma obscura especialização acadêmica sem ligação direta
com o que é ensinado em sala de aula. O que os “despertos” buscam, na
verdade, é um acerto de contas a nível nacional com o racismo.
Em
meio a essa confusão, John McWhorter oferece uma explicação penetrante.
McWhorter, que leciona na Universidade de Columbia, é um intelectual
dissidente em questões raciais. De forma apaixonada e convincente, ele
discorda da ideia complacente de que o fenômeno do “despertar” é um
impulso sensato de combate ao racismo, afirmando que seu objetivo é
remodelar politicamente os Estados Unidos, apropriando-se da Teoria
Crítica da Raça. Mas para compreender sua crueldade inquisitorial, seu
impulso condenatório e seu poderoso domínio sobre a mente de tantas
pessoas, precisamos ver esse fenômeno sob um ângulo diferente. Em seu
novo livro, Woke Racism, McWhorter argumenta que esse “despertar” é uma
religião que, longe de se opor ao racismo, tende a reforçá-lo.
Uma nova religião
McWhorter
batiza os seguidores dessa nova religião como “eleitos”, um termo que
evoca não apenas fanatismo, mas também uma “certa presunção” de serem
“portadores de sabedoria”. Essa religião, ele aponta, exibe
características semelhantes às religiões já existentes e, na maioria das
vezes, as semelhanças que ele destaca são pertinentes. Há um suposto pecado original:
“privilégio branco”. Há uma linha de pensamento apocalíptico: o
presente é um esgoto, perdição; o progresso nas questões raciais depende
de um juízo final. Há também uma caça aos hereges, considerados não
apenas errados, mas moralmente corruptos. Assim como os católicos
medievais defendiam “perseguir judeus e muçulmanos”, os inquisidores de
nosso tempo “abraçam exatamente o mesmo tipo de missão, só mudam o
alvo”.
Os “despertos” não têm uma figura divina, mas McWhorter observa que nem toda religião precisa de uma. Chamando a atenção para a mentalidade dos seguidores, ele observa uma semelhança com as religiões abraâmicas: “Não se trata de se submeter a UM Deus. É preciso mostrar-se descrente para não ser considerado submisso”. Seguidores fervorosos da nova religião do “despertar” não sustentam crenças baseadas em fatos, opondo-se fervorosamente a eles. Os despertos também não se deixam abalar por contra-evidências.
Considere
a alegação de que, na educação, as diferenças nas notas entre alunos
brancos e negros evidências inquestionáveis de racismo. McWhorter mostra
que isso é implausível, pois não leva em conta o papel de outros
fatores causais. Entre eles está a ideia perniciosa de que ser bom na
escola é trair a própria raça. Essa ideia, sugere McWhorter de forma
plausível, provavelmente se originou em uma época em que os alunos
negros sofriam racismo por parte dos professores e tinham de suportar a
rejeição daqueles que apoiavam a segregação. Entretanto, mesmo com esse
preconceito diminuindo muito ao longo do tempo, a ideia criou raízes na
mente de muitos americanos, incluindo americanos negros.
Sentimentos acima dos fatos e da lógica
O
desprezo pela lógica é uma característica da religião do “despertar”.
McWhorter justapõe algumas de suas injunções conflitantes (homilias?):
“Os negros não podem ser responsabilizados por tudo que todo negro faz”,
mas, ao mesmo tempo, “todos os brancos devem reconhecer sua
cumplicidade pessoal na perfídia da ‘brancura’ ao longo da história.”
Temos o dever de “mostrar interesse no multiculturalismo”, mas, ao mesmo
tempo, “não é culturalmente apropriado. O que não faz parte de sua
cultura não é para você, e você não pode tentar vivenciá-la,
‘apropriando-se dela’”. Quando os negros dizem que você os insultou,
“peça desculpas com profunda sinceridade e culpa”, mas, ao mesmo tempo,
“não coloque os negros numa posição em que espera que eles o perdoem.
Eles já passaram por coisas demais”.
“Religião”,
escreve ele, “não tem lugar na sala de aula, nos corredores das
universidades, em nossos códigos de ética, muito menos em decretar como
todos os membros da sociedade devem se expressar, e quase todos nós
espontaneamente entendemos isso e vemos qualquer incompreensão dessa
premissa como retrógrada.”
Para
os adeptos desta perspectiva, o fato de que esses princípios “cancelam
um ao outro é considerado trivial”. Mas o fato de servirem “ao seu
verdadeiro propósito de revelar as pessoas como fanáticos é fundamental –
sacrossanto, por assim dizer”.
O
medo e a culpa são fundamentais para entender como os “despertos”
evangelizam. Eles têm sucesso, ele acredita, por intimidação moral e ao
aterrorizar as pessoas com a ameaça de serem rotuladas de racistas: “Nós
nos tornamos uma nação de pessoas inteligentes que atestam que
‘entenderam o recado’, tremendo de medo”.
Ironicamente,
porém, este termo encontra-se terrivelmente corrompido por causa do
imenso progresso que vimos no racismo, um fato que os “despertos” negam.
Quando a intolerância e o preconceito eram muito mais comuns e aceitos
que hoje, essa acusação não teria sido nem de longe socialmente letal,
muito menos representaria o fim de uma carreira. O progresso tem sido
“tão vívido nos últimos 50 anos que um segregacionista da velha-guarda
transportado para os Estados Unidos atual, mesmo no Sul, teria
dificuldade em não vomitar com o que visse”. Para os “eleitos”, “a vida
dos negros é importante, mas a transformação sociopolítica profunda na
forma como os negros são percebidos, não”.
O que motiva o “eleito”?
De
onde surgiu essa religião e o que motiva seus adeptos? McWhorter
rastreia suas raízes de volta à Teoria Crítica da Raça. Discutindo
brevemente essa questão, ele ilustra a influência da TCR no
comportamento dos “eleitos”, por exemplo, na elevação das “narrativas”
sobre os fatos. O que motiva os crentes dessa religião? McWhorter
acredita que não se trata principalmente de “dinheiro ou poder, mas puro
propósito, no sentido de sentir que você é importante e que sua vida
tem um fim significativo”.
Mas
os “despertos” variam em seu nível de comprometimento, e esse fato pode
explicar os muitos adeptos conformistas que seguem a multidão. E quanto
aos mais zelosos, que sentem uma necessidade contínua de expulsar os
hereges e, assim, reafirmar sua fidelidade aos olhos de seus
companheiros de seita? E os líderes intelectuais? Uma objeção aqui é que
McWhorter é excessivamente caridoso com as motivações dos “despertos”,
especialmente aqueles que exibem um interesse pessoal em negar a
realidade do progresso e desinteresse em soluções viáveis.
Tal
indiferença ultraja McWhorter. Nesse ponto, e em outros lugares, sua
indignação fica estampada. Ele se revolta contra a noção dos “eleitos”
de que, se os negros quiserem progredir, o racismo deve ser completa e
totalmente erradicado. Embora totalmente ciente da persistência do racismo,
ele rejeita a visão de que “nosso foco principal deve sempre ser a
eliminação dos vestígios do preconceito racista”, o que implica que
“esse viés é um obstáculo conclusivo para o sucesso dos negros”. Esse é
um argumento inusitado para qualquer outro grupo, e para os negros
implica que:
Nós,
e somente nós, exigimos uma vasta transformação no procedimento
psicossocial e distributivo no que é, apesar de suas falhas, um
experimento democrático funcional em que o racismo é proibido em um grau
desconhecido na história humana até 50 anos atrás, e em um grau que
teria sido considerado ficção científica 30 anos atrás.
Essa ideia retrata os negros como crianças com deficiência mental e espiritual…
McWhorter
mostra que, apesar de se apresentar como inimiga do racismo, essa
postura prejudica os negros e ofusca os problemas reais. A perspectiva
“desperta” fecha os olhos “para crianças negras sendo atacadas por
outras na escola”; “para a loucura da ideia de ‘identidade’ negra como
tudo sobre o que os brancos pensam, e não sobre o que os próprios negros
pensam”; “aos lapsos no trabalho dos intelectuais negros, porque os
negros carecem do privilégio dos brancos”.
A
conclusão condenatória de McWhorter é que a religião “eleita” é
racista, não apenas em sua concepção da identidade negra, mas também em
sua condescendência para com os negros.
Essa
conclusão é bem defendida, mas há algumas questões controversas que
McWhorter deixa de lado ou só aborda artificialmente. Entre elas está o
“privilégio branco”, que McWhorter acredita ser real em certo sentido.
No entanto, ele reforça que o importante são nossas respostas a ele. A
ideia de “racismo sistêmico” é outro termo que valeria a pena desdobrar
mais, dada sua relevância. Investigar mais essas questões fortaleceria o
argumento do livro.
Deixando a balcanização de lado
O
fenômeno do “despertar”, no relato de McWhorter, é uma espécie de força
atávica: ele nos leva “de volta às categorizações raciais balcanizadas e
artificiais que todos pensamos que queríamos superar.”
No
entanto, pergunte por que não devemos mais superá-los e os eleitos –
espere – rotulam-no como supremacista branco. Todo o foco do Iluminismo
no individualismo,
toda a permissão do modernismo para que as pessoas sejam elas mesmas em
vez de ficarem presas a classificações predefinidas, esfacela-se diante
dessa ideia de que ser qualquer coisa menos branco requer obsessão com o
fato de que você não é branco e diminuído pela possibilidade de eles
não o verem em sua totalidade.
Ao
enfrentar os “eleitos”, aconselha McWhorter, não permita ser intimidado
moralmente: enfrente-os, pare de tratá-los como o normal.
A
demanda dos “despertos” de “acabar com o racismo”, argumenta McWhorter,
é uma “versão infantil de progresso “. O racismo, escreve ele, não é
apenas preconceito, mas também atitudes e políticas persistentes: “Algo
tão multiforme e atemporal deve ser restringido tanto quanto possível,
mas é impossível simplesmente eliminá-lo. Mais especificamente, não é
necessário fazer isso.” O que deveria ser feito? McWhorter propõe três
reformas de políticas que acredita serem de alto nível, mas modestas o
suficiente para serem implementadas: acabar com a “guerra às drogas”;
ensinar adequadamente todos os alunos a ler; e tornar o treinamento
vocacional mais acessível, desfazendo a ideia de que todos devem ir para
uma faculdade de quatro anos. Ele explica como isso poderia abrir
caminhos para que os indivíduos levassem uma vida produtiva e
gratificante, e mesmo se alguém discordar dele, é claro que essas
recomendações evidenciam uma preocupação genuína com o progresso.
Inabalável em sua análise, o livro esclarece o fenômeno do “despertar” que nos rodeia.
Publicado originalmente em New Ideal.
Traduzido por Hellen Rose.
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