MEDIÇÃO DE TERRA

MEDIÇÃO DE TERRA
MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 31 de março de 2024

Trump deveria estar quebrado e embargado; em vez disso, ficou mais rico.

 

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI


Com prazo extra e redução de fiança para multa milionária, ex-presidente vIe fortuna disparar com a entrada de sua plataforma social na Nasdaq. Vilma Gryzinski:


A vida é uma montanha russa para Donald Trump – e um vale de lágrimas para os que torcem por sua queda.

Ele deveria ter começado a semana arruinado, com contas bloqueadas e imóveis confiscados para garantir o pagamento de uma multa jamais vista, de meio bilhão de dólares, por contabilidade fraudulenta.

Nos Estados Unidos, para que processos assim possam ter recurso, uma seguradora deve garantir o pagamento da multa, exigindo caução equivalente do processado. As instituições do ramo “deram risada” quando foram consultadas sobre a caução do ex-presidente, segundo seu filho Eric Trump: nunca tinham visto multa semelhante.

Em vez de arruinado, Trump conseguiu na segunda-feira um prazo extra de dez dias e a redução da caução para 175 milhões de dólares. E tripudiou que “vai ser uma honra” pagar.

Na terça, a coisa ficou pior ainda para seus adversários. Numa guinada inacreditável, a fortuna dele disparou para nada menos que 6,4 bilhões de dólares com a estréia de sua empresa de rede social na bolsa Nasdaq. A empresa controla a Truth Social, criada por Trump depois que foi barrado no Twitter (o nome oficial ainda era esse) e outras redes. Em um dia, ele ganhou 3 bilhões.

OUTRO PATAMAR DE FORTUNA

Passou assim de quase falido e bloqueado para a lista dos 500 mais ricos do mundo, pelos critérios do Índice de Bilionários da Bloomberg.

Embora submetido a um prazo de seis meses para vender ou oferecer sua participação acionária como garantia para empréstimos, o que não ajuda em suas dívidas com a justiça, Trump simplesmente entrou em outro patamar de fortuna.

É de fazer qualquer inimigo político arrancar os cabelos. E não faltam inimigos a Trump. Um exemplo mais recente de como ele altera o comportamento dos adversários: o site Salon publicou uma reportagem na qual procura comprovar que Trump está sofrendo de demência frontotemporal, do tipo variante comportamental.

A reportagem é baseada em “diagnóstico”, feito à distância, evidentemente, pelo psicólogo John Gartner, transformado em abaixo assinado de profissionais de saúde mental.

O site consultou a psiquiatra forense Elizabeth Zoffman para endossar a hipótese e ela listou uma série de “comprovações”. Entre elas, incluem-se “mudanças nos padrões de fala, dificuldade em pronunciar palavras, desinibição e incapacidade de controlar arroubos verbais, mudanças no movimento e na maneira de andar e mudanças na capacidade de julgamento e no controle de impulsos que expõem o agravamento de traços de personalidade caracterizados como narcisistas e antissociais”.

CONTRAPESO A BIDEN

A falta de ética deveria causar repúdio e escândalo, mas hoje atitudes assim parecem ter se normalizado. Diagnósticos à distância viraram uma prática comum quando o envolvido é Trump.

O objetivo também é claro: fazer o contrapeso à percepção predominante de que Joe Biden está em declínio cognitivo.

Não que faltem defeitos de caráter e de julgamento a Donald Trump, incluindo sua tendência a se deslumbrar com Vladimir Putin e os casos execráveis em que menosprezou mortos e feridos de guerra – em defesa dos Estados Unidos – como “perdedores”.

A lista é longa, mas depara com vários obstáculos. Um, são os eleitores trumpistas que relevam qualquer coisa que ele faça e dizem que estão escolhendo um presidente, não um candidato a santo. Outro, são os eleitores que fazem comparações e chegam à conclusão que estavam melhor na época dele.

IMIGRAÇÃO E COGNIÇÃO

O bilionário Nelson Peltz resumiu ontem o que leva muitos americanos comuns, sem a fortuna de 1,7 bilhão de dólares dele, a preferir o ex-presidente.

“Eu provavelmente vou ficar com Trump e não estou feliz com isso”, disse o megainvestidor – mais conhecido, em outros círculos, como pai de Nicola Peltz, casada com Brooklin Beckham, filho do jogador inglês e da ex-cantora.

Motivos: o descontrole na imigração, que hoje “não é um problema democrata ou republicano”, mas nacional, e “a condição mental realmente assustadora” de Joe Biden.

“Não sei o que ele sabe e o que ele não sabe. Não sei quem está falando por ele e isso é perturbador”.

Teriam os Estados Unidos dois candidatos a presidente com problemas mentais? É uma possibilidade, considerando-se a idade e alguns comportamentos. Mas só um deles acabou de ganhar 3 bilhões de dólares.

Muitos eleitores não deixarão de notar isso.
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Maduro e Milei não dão muita bola para Lula

 

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI


O que torna a situação muito complicada para o Brasil não é só o fato de exercer nesta parte do planeta muito menos influência do que geografia e economia; Argentina e Venezuela são exemplos da atração que polos opostos na política internacional exercem hoje sobre países de uma mesma região. William Waack:


O Brasil tem tido grandes dificuldades em tomar conta e, na medida do possível, conduzir o que acontece no seu entorno imediato. Os problemas surgem pela confusão entre interesse nacional e interesse pessoal do presidente da República, e pelo desrespeito a postulados básicos de política externa.

Tanto em relação à Argentina como Venezuela o governo agiu orientado por afinidades ou antipatias ideológicas, e está perdendo nos dois casos. Nos dois países resolveu “ajudar” forças políticas em contextos nos quais não dispõe de instrumentos efetivos de influência, na esperança de assim obter comportamentos “convenientes” de vizinhos.

Os resultados até aqui colhidos são evidentes em sua pobreza. Na Argentina o governo brasileiro tem de lidar com um “rival” e o que poderia ser de interesse comum aos dois países está no momento em segundo plano. Na Venezuela um governo “amigo” cria tensão internacional indesejável para o interesse brasileiro, seja por fraudar eleições, seja por cultivar ambições em relação a território de país fronteiriço.

Há uma forte ironia naquilo que une Javier Milei, o libertário de direita, e Nicolás Maduro, o ditador de esquerda. Ambos se dão em público ao luxo de eventualmente tratar a pontapés o que diz o governo brasileiro. Não estão sozinhos: há bastante tempo que nenhuma chancelaria na América do Sul perde muito sono com o que se pensa em Brasília.

O que torna a situação muito complicada para o Brasil não é só o fato de exercer nesta parte do planeta muito menos influência do que geografia e economia sugerem que o País poderia ter (e já teve). Argentina e Venezuela são exemplos da atração que polos opostos na política internacional exercem hoje sobre países de uma mesma região – desafio que o Brasil também enfrenta.

Caricatas ou não, as posturas de Argentina e Venezuela espelham um choque maior entre “aliança pró-Ocidental” versus “eixo das autocracias”. No qual o Brasil está literalmente no meio: depende da exportação para autocratas sobretudo na Ásia e da importação de insumos (de Defesa e tecnologia do agro) das democracias ocidentais. Universo ao qual pertence por história e valores.

Essa noção de delicado equilíbrio é vital para uma potência regional média, como o Brasil, com escassa capacidade de projeção de poder. Como ensinam os clássicos das relações internacionais, a maior “proteção” que um país desse tipo pode alcançar está em alianças regionais que ampliem seu peso relativo.

O que pressupõe pensamento estratégico, mobilização eficiente de recursos e, principalmente, direção e sentido dados por elites políticas e econômicas. Em gíria política chama-se isso de “pensar o País”. Estamos longe disso.
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Racha na esquerda: Maduro compra briga com governos do Brasil e da Colômbia.

 

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI


O tirano venezuelano responde com agressividade a notas cautelosíssimas de “preocupação” - é para valer ou foi tudo combinado? Vilma Gryzinski:


Nicolás Maduro quer briga. Ou quer parecer que está brigando contra “intervencionistas” vizinhos – justamente os mais amáveis e gentis diante dos abusos que precedem a farsa eleitoral de 28 de julho.

“Quem vier opinar e se imiscuir nos assuntos internos da Venezuela receberá sua pancada. Chame-se União Europeia, da direita, a esquerda covarde, pancada pura”.

Ele também reclamou que ninguém condenou o que apresenta como conspirações e terrorismo da oposição, sua mais recente encenação. “Calam-se os governos de direita, e a esquerda covarde. Não são capazes de condenar os golpes contra a paz e a revolução”.

Brasil e Colômbia, através de seus serviços diplomáticos, haviam manifestado “preocupação” depois da proibição da substituta de última hora e xará de María Corina Machado, Corina Yoris, uma professora de filosofia de 80 anos que, obviamente, não tem o carisma da líder oposicionista cassada. Mesmo assim, sua candidatura tampão pela Plataforma Unitária Democrática não pode ser protocolada no sistema.

Perseguir, proscrever e prender potenciais oposicionistas é uma prática consagrada pelo madurismo, mas até pelos padrões absurdamente tolerantes dos governos amigos de Lula da Silva e Gustavo Petro parece que foi demais.

As declarações de ambos os países, tão cheias de dedos, foram igualmente taxadas de atos de ingerência que parecem “ter sido ditados pelo Departamento de Estado”. Uma acusação ridícula, mas Maduro evidentemente não tem a menor preocupação em evitar esse tipo de característica.

Militar assassinado

As investidas contra aliados de esquerda repetem, embora em tom não tão exacerbado, a saraivada de ataques que a Venezuela normalmente faz contra Gabriel Boric, o presidente chileno também proveniente da extrema esquerda, mas pioneiro nas críticas aos abusos de Maduro e companhia. Quando dois colaboradores de María Corina foram presos, o governo Boric manteve a mesma linha e manifestou “firme condenação diante da detenção arbitrária de representantes de partidos políticos de oposição”.

Em tom muito mais categórico do que o dos diplomatas brasileiros e colombianos, a nota chilena dizia o óbvio: a prisão de oposicionistas “afeta seriamente a realização de eleições presidenciais democráticas, transparentes e livres, com participação plena de todos os candidatos e candidatas, contrariando os Acordos de Barbados endossados pela comunidade internacional”.

Maduro obviamente rasga todos os dias os acordos assinados em outubro do ano passado, com suspensão de sanções dos Estados Unidos em troca de compromissos como a realização de eleições legítimas.

O Chile tem um problema adicional: lidar com o sequestro, assassinato por asfixia e ocultação do corpo numa mala enterrada sob laje de concreto de Ronald Ojeda, um ex-militar venezuelano que conseguiu fugir da cadeia e pedir asilo político no país. O sequestro foi filmado por câmeras de segurança e atribuído a delinquentes do Trem de Arágua (ou bonde, como se diria no Brasil), uma grande organização criminosa da Venezuela. O crime espalhou medo entre asilados venezuelanos, inclusive no Brasil.

‘Jogo dos americanos’

As esquerdas tradicionalmente têm enorme dificuldade para fazer autocrítica e, na América Latina, são contaminadas pelo antiamericanismo infantil. Acham, no caso dos que são dominados pela doutrina e não pelos princípios, que criticar a Venezuela é fazer o “jogo dos americanos”.

Na verdade, é o oposto: a existência de um regime como o venezuelano, que multiplicou a miséria e a imigração em massa, é a melhor propaganda contra a esquerda que existe. Até as pessoas menos interessadas em acontecimentos políticos sabem que a Venezuela é um desastre e não querem ter nada a ver com ele.

Manual do autoritarismo

Quem acreditou nos Acordos de Barbados passou vexame. Maduro vai ganhar a eleição sem concorrentes reais e dar risada da cara dos aliados a quem chama hoje de capachos dos Estados Unidos. É um show que ele sabe protagonizar muito bem e já está montando outra encenação: mandou arrancar fusíveis e cortar a energia elétrica da embaixada argentina em Caracas, onde seis oposicionistas pediram asilo.

Criar inimigos externos é uma das jogadas mais consagradas do manual político do autoritarismo. Ele já tentou fazer isso ameaçando engolir mais da metade do território da Guiana, o chamado Essequibo e pode fazer de novo.

Escreveu Héctor Schamis no Infobae: “Maduro tem diante de si a ‘opção Daniel Ortega’, com isolamento total e completa irracionalidade. Ou regressar a 2018, com uma eleição fraudulenta, sem reconhecimento internacional e seguida de uma usurpação do poder, poder que não pode abandonar. Em qualquer um dos dois casos, condenado a viver entre a solidão e o delírio”.

Exceto, naturalmente, se os amigos resolverem, como já fizeram tantas vezes, fechar os olhos de novo e continuar tratando Maduro como “um dos nossos”, em vez de se descontaminar de sua proximidade tóxica.
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A morte do jornalismo

 

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

Teodoro León Gross lleva a cabo una disección implacable del periodismo en la actualidad, casi más en el ataúd que en la mesa de operaciones. José Antonio Montano para The Objective:


Entre los estudiantes de Periodismo (yo lo fui un par de cursos, en la Complutense) eran objeto de displicencia los profesores que enseñaban para los periódicos sin haber trabajado en los periódicos. No es el caso de Teodoro León Gross, profesor en la Universidad de Málaga, pero periodista desde mucho antes, y durante y después. Tenemos la misma edad (somos del 66) y por eso recibí con toda nitidez el espectáculo de su brillantez precoz. Con veintipocos años, a finales de los ochenta, cuando yo me hallaba envuelto en mis romas brumas pessoanas (entre las que sigo en buena parte), él ya era colaborador fijo en Diario 16 con artículos de un nivel que no alcanzaban los mayores (recuerdo uno en que citaba a Herder) y una insolente frescura (recuerdo otro en que describía cómo golpeteaba con el trote la melenita de Chano, futbolista del Málaga). En la foto de su columna se parecía a David Leavitt, cuando este era lo más.


Pasados más de tres decenios, su trayectoria ha sido extensísima en prensa, radio y televisión. Por concretar solo la primera, ha escrito entre otros, además de para aquel Diario 16, para los diarios del grupo Vocento y el grupo Joly, El País, El Mundo, THE OBJECTIVE y actualmente el Abc; en la radio colabora hoy en Herrera en Cope y en televisión dirige y presenta en Canal Sur Mesa de análisis. Ahora ha juntado esta experiencia tan completa con su potencial académico y ha escrito un libro apabullante, La muerte del periodismo (Deusto), que se ha puesto convenientemente a la venta en esta Semana Santa. León Gross lleva a cabo una disección implacable del periodismo en la actualidad, casi más en el ataúd que en la mesa de operaciones, con la que hacer un duelo lúcido en estos días fúnebres. Si al periodismo le aguarda una resurrección no lo sabemos, pero sí sabemos que para ella serían imprescindibles las lecciones contenidas en este libro.

Con el rigor y la erudición de un estudio académico (tiene empaque de tesis doctoral) y la agilidad vibrante del artículo de prensa, La muerte del periodismo analiza la crisis del otrora llamado cuarto poder, relacionándolo con el estado de nuestra democracia. El subtítulo, Cómo una política sin contrapoder degrada la democracia, indica que las dos cosas van juntas: el poder político sin el contrapoder de la prensa se adentra en turbias derivas autócratas. El autor está atento al mundo y se ha leído todos los ensayos relevantes de los últimos años, y entrelaza sus observaciones con sus lecturas para ofrecer un panorama candente que nos pone al día.

Los múltiples ejemplos extraídos de la prensa que puntean las páginas de La muerte del periodismo funcionan además como una historia político-mediática de los últimos 16 años: la crisis del periodismo podría fecharse en la crisis económica de 2008, en que los medios empezaron a no poder autofinanciarse, quedando debilitados y casi a expensas del poder político. Esto, unido a la revolución tecnológica, que ha alterado el funcionamiento del oficio y el negocio, y el sometimiento a las redes sociales, a cuyas dinámicas abaratadoras y sensacionalistas se han rendido en buena medida los medios, así como al desprestigio de la verdad y el imperio de las fake news (o noticias falseadas), han dejado al periodismo en su actual postración.

En realidad, como desmenuza convincentemente León Gross, tales defectos del periodismo no son nuevos: no hay edad de oro. Si acaso, ahora se han incrementado. La gran novedad, concluye el autor, es que el periodismo ha perdido influencia. Es decir, poder: poder para ejercer su contrapoder.
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Patologias políticas: No mar dos monstros.

 

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI


Podemos ha sido la principal formación populista que ha surgido en España, y ha cambiado la política de nuestro país. Diez años después de su irrupción en las elecciones europeas de 2014, esta es la historia de su génesis, su éxito y su caída. Antonio Elorza para Letras Libres:


La reciente floración de patologías políticas hace aconsejable un esfuerzo de comprensión, no siempre fácil de llevar a término. Solo ocasionalmente prevalecen en ellas factores estructurales, a partir de los cuales resulta posible establecer y desarrollar hipótesis interpretativas, base del ulterior análisis. La aparición del chavismo en Venezuela, los virajes hacia la ultraderecha en Europa central o el posfascismo en Italia responden a esas características. Hay otros movimientos desestabilizadores que, sin embargo, presentan mucha mayor complejidad, aun cuando por supuesto no sean fruto de una generación espontánea: registran la presencia de actores que alcanzan su protagonismo por azar o por influencias externas inesperadas, y conjugan distintos elementos heterogéneos para producir una síntesis ideológica cargada de populismo y, a pesar de ello, o tal vez por ello, eficaz. Funden rasgos de modernidad, producto de la revolución digital, con residuos arcaizantes que llegan a convertirse en núcleo de una oferta política novedosa en apariencia. El Movimiento 5 Estrellas en Italia y Podemos en España serían ejemplos de esta segunda variante, que, como la Francia Insumisa de Mélenchon, enlazan con la crisis de las formas orgánicas tradicionales de la izquierda europea, la socialdemocracia y los partidos comunistas.

Nuestro propósito consiste en facilitar algunas claves para entender el fenómeno Podemos, sin duda el movimiento populista de mayor influencia en la historia inmediata de nuestro país. En su elaboración ha jugado un papel importante el hecho de que sus promotores, Pablo Iglesias, Juan Carlos Monedero e Íñigo Errejón, fueron estudiantes primero y luego jóvenes profesores (o becarios) con quienes tuve un contacto inmediato desde mi posición –hasta 2010– de director del Departamento de Ciencia Política III en la Facultad de Ciencias Políticas y Sociología de la Universidad Complutense de Madrid (UCM). La observación participante ha sido útil, sobre todo para el periodo de gestación de Podemos.

LA OLA

La Facultad de Ciencias Políticas de la ucm contaba con una larga tradición de izquierdismo desde la década de 1960, años en que futuros politólogos y sociólogos militaron en sus etapas de estudiantes y profesores no numerarios dentro del espectro de organizaciones comunistas (del PCE, del Frente de Liberación Popular o “Felipe”, trotskistas o maoístas), con una práctica ausencia de la socialdemocracia. Al llegar la Transición, el predominio del pce era claro, si bien su rápido declive en los años ochenta, aun manteniendo una presencia continuada entre los estudiantes, se tradujo en una constante inseguridad ideológica y en una deriva radical, en cuyo curso se dio la aproximación de los jóvenes universitarios comunistas a los estudiantes próximos a ETA.

Semejante debilidad tuvo la compensación del acceso de izquierdistas postsesentayocho a cargos académicos, configurando de este modo una plataforma favorable para la recuperación de la presencia radical. Así, un personaje discreto en el orden científico, el geógrafo Heriberto Cairo, desempeñó un papel capital en la presencia académica de Pablo Iglesias e Íñigo Errejón, y más tarde como decano, de 2010 a 2018, en la hegemonía de la organización de ambos, Contrapoder. Por encima del anquilosamiento ideológico de los jóvenes comunistas, eso sí, radicales al estilo de Anguita, sus líderes habían incorporado la enseñanza de los movimientos antisistema del nuevo milenio, tales como la militancia violenta en la antiglobalización, para Pablo Iglesias, o una síntesis de vocación revolucionaria, fundiendo Gramsci y el neoperonismo de Ernesto Laclau y Chantal Mouffe, que asumió Errejón. Monedero emprendía entre tanto su andadura en busca de un nuevo socialismo, envuelto en la admiración a Chávez. Por un tiempo, fue también referencia la teoría antiglobalización del sociólogo portugués Boaventura de Sousa Santos, chavista convencido y autor de eslóganes infumables como que “el socialismo es la democracia sin fin”, cuyo Centro de Estudios Sociales en Coimbra tuvo su eco institucional entre las iniciativas de Podemos.

Aunque bien protegidos en cuanto a promoción académica y a pesar del balance favorable a la acción violenta, todo hubiese quedado en una tormenta en un vaso de agua sin el encuentro de Juan Carlos Monedero con el presidente venezolano Hugo Chávez, el líder latinoamericano que pasó a ser el punto de referencia de la naciente organización izquierdista. Monedero, hasta entonces activista de la unidad de la izquierda, se convirtió por espacio de nueve años en asesor de Chávez, quien le nombró director del Instituto Francisco de Miranda, de relaciones internacionales, en el Hilton de Caracas. A su aire, siguió ejerciendo la docencia en la Facultad de Ciencias Políticas, e impulsando la mutación de la izquierda hacia un “socialismo del siglo XXI”, que una vez cegadas las expectativas en Europa volvía su mirada hacia Latinoamérica. Cerraba el círculo el culto a Chávez, del que serán asimismo oficiantes Pablo Iglesias e Íñigo Errejón. La relación con Chávez pudo favorecer la llegada de recursos para una televisión local, Telek, donde Pablo Iglesias inició su carrera hacia el estrellato de la videocracia, y para el Centro de Estudios Políticos y Sociales (CEPS) de Valencia, a imitación del fundado por De Sousa Santos en Coimbra.

El apoyo exterior se vio reforzado por la entrada en escena de Hispantv, vinculada al régimen de los ayatolás en Irán. En Hispantv, Pablo Iglesias dirigió sus críticas contra la democracia representativa en el programa Fort Apache, más directo que su protagonismo en La tuerka de Telek. Todo valía con tal de consolidar su resistible ascenso hacia el liderazgo del discurso antisistema. Iglesias iba a lo suyo, no importaba con quién. Nada mejor que la televisión de los ayatolás para exponer que la guillotina fue un artilugio esencial para el nacimiento de la democracia, aunque en el Irán de Jomeini había y hay preferencia por la horca. Añadamos que, como harían en el futuro respecto de eta, primero, y de las sucesivas “herri batasuna”, Podemos y up mantuvieron una actitud favorable a los diferentes episodios de la Revolución iraní, y silencio o circunspección ante sus actuaciones represivas.

Entretanto, tenía lugar el asalto a la facultad, programada por el dúo Iglesias/Monedero: necesitaban una base institucional, y así nació Contrapoder, presentado en sociedad con un acto sorpresa en la cafetería del centro, en homenaje y defensa del etarra Iñaki de Juana Chaos. Curiosamente, los propagandistas de Podemos eran tan activos en la fase Contrapoder a la hora de colgar las imágenes de sus primeras hazañas como lo han sido más tarde para borrarlas o modificarlas. El acto de presentación a favor de De Juana Chaos, lo mismo que la grabación del himno rapero del grupo bajo el eslogan de “defender la alegría y organizar la rabia”, han desaparecido de YouTube, probablemente entre otros clips que informarían sobre la verdadera naturaleza del movimiento. Tampoco son localizables algunos artículos de Iglesias en Kaos en la red.

El mensaje de cambio radical, aun cuando tiene en Iglesias un fundamento leninista, buscaba un aval de legitimidad en los métodos radicales de la Revolución francesa y referencia inmediata en el antiimperialismo populista de Chávez. Para España, la proyección del espíritu antisistema se centró siempre en la descalificación del “régimen de 1978”, por haber sido un pacto entre las élites conservadoras en contra de los intereses populares. El objetivo era precisamente el empoderamiento del pueblo frente a la oligarquía, encabezada al modo de Beppe Grillo en Italia por “la casta”, la clase política. Una oposición con visos de éxito a esa trama de poder requiere un liderazgo fuerte del que Chávez es un buen ejemplo. Todo muy sencillo. Sobra en la explicación toda referencia a la crítica situación económica en la década de 1970.

Los escraches contra políticos fueron el instrumento preferido por los futuros creadores de Podemos. De particular relevancia fueron en la Facultad de Ciencias Políticas los practicados contra el exministro Josep Piqué y Rosa Díez (por dos veces, señalada por su oposición a ETA). Tenían por objetivo, de entrada, crear un grupo cohesionado, formado por estudiantes de ideología radical dispuestos a ejercer la violencia para impedir el acceso a la palabra de este o aquel político demócrata, acusado de servidor del capitalismo. Era esencial presentarse en público suplantando al colectivo del cual procedían; según su autodesignación, eran “los estudiantes” por antonomasia. Y su vocación era efectivamente ejercer el poder sobre la facultad, lo que lograrán a partir de 2008-2010, dándole un definido sesgo ideológico, de Evo Morales a Corea del Norte y frente a la democracia representativa. Al mismo tiempo, eran próximos en ideas a los sectores universitarios simpatizantes, o dependientes, de la galaxia ETA, y, lo que es más importante, estaban seguros de su impunidad al encontrarse protegidos desde arriba.

La violencia, auspiciada por la pasividad oficial, fue un medio para la conquista del primer escalón de poder, y el cinismo, su regla de comportamiento. Algo que caracterizará a los líderes de Podemos a lo largo de su existencia.

En gran medida, era un remake de la secuencia que Dennis Gansel llevó a la pantalla en su película La ola, donde recogía la historia real de un profesor ególatra y autoritario que plantea un experimento con sus alumnos para mostrar cómo en el ámbito de una clase surge “la autocracia”. Los ingredientes que configuran una mentalidad totalitaria son cuidadosamente individualizados en el filmey responden estrictamente a la experiencia de Contrapoder: a) una ideología simple y maniquea que permite la designación del otro como enemigo; b) la formación de un grupo altamente cohesionado en torno a un conjunto de signos identitarios; c) la actuación de un líder carismático, que fija los objetivos de la acción y detenta los mecanismos de control y vigilancia; d) la aspiración a ser reconocidos como únicos representantes legítimos del colectivo al que pertenecen, y e) la utilización sistemática de la violencia, tanto verbal como física, para eliminar a opositores y disidentes. En la vida política ulterior de Podemos, los modos debían moderarse, cuando la minoría activa así forjada emprendiera el tránsito a la formación de un movimiento de masas.

EL ASALTO AL CIELO

La plataforma universitaria podía resultar útil para conquistar en la ucm un reducto de poder exclusivo, coincidiendo con la elección del mentor Cairo como decano en la Facultad de Ciencias Políticas. La relación satisfactoria con el vértice se mantuvo durante los rectorados de Carlos Berzosa (2003-2011), José Carrillo (2011-2015) y Carlos Andradas (2015-2019). Eso no bastaba, sin embargo, para dar vida a un proyecto de poder alternativo.

La estructura de oportunidad política surgirá con el movimiento de masas del 15M y, frente a lo que dice la visión establecida, no porque Podemos, mutación de Contrapoder, fuese la expresión del 15M. Recuerdo a Monedero, cargado de papeles, intentando influir sin éxito sobre los acampados en la Puerta del Sol madrileña. Él mismo se encargó más tarde de explicar que no logró el objetivo de captación. Incluso en la primera asamblea, celebrada en la calle Abtao, tras las elecciones europeas de 2014, censuró la falta de definición en el 15M, lo cual no excluye que insistiera más tarde con razón en que “sin el 15M no existiría Podemos”.

La razón es bien simple: el 15M no fue una “reinvención de la democracia”, aunque sí la expresión de una crisis en la democracia representativa, la salida a la calle de una masiva demanda social, inspirada en la frustración y el malestar, que esperaba la formulación de una oferta política. A esa demanda atenderá transitoriamente con éxito Podemos, a partir de la primavera de 2014.

En marzo de 2013, la muerte de Hugo Chávez, el “inmortal Chávez” de los fundadores de Podemos, fue paradójicamente una fortuna para la viabilidad del movimiento. Sobrevivían su decisivo apoyo político y económico del pasado inmediato, la referencia y los contactos para seguir utilizando la legitimación revolucionaria procedente de América Latina, sin los costes que hubiese supuesto una vinculación total con una experiencia política dictatorial en lo político y absolutamente fracasada en el orden económico. Y quedaba el campo abierto para una amplia maniobra de captación de proyectos diversos, conjugados en su eficacia para el objetivo de conquistar el poder, justamente para eliminar el orden político vigente.

De cara a las elecciones de 2014, el reciente modelo del Movimiento 5 Estrellas, en plena etapa de ascenso, proporcionaba un instrumental nuevo, en las palabras y en las formas: los partidos dominantes, descalificados bajo la etiqueta de “la casta”; el llamamiento populista que evitaba la dureza trasnochada de la lucha de clases con la invocación de una política para “la gente”; la fórmula asociativa tomada de los “círculos” de seguidores de Beppe Grillo; la adopción de técnicas revolucionarias en el campo digital y de las comunicaciones, que desbordaban los usos tradicionales de los viejos partidos y ofrecían la impresión de una nueva democracia (para, en definitiva, enmascarar mejor la orientación caudillista).

Nada más moderno que la utilización a fondo de las redes sociales. Lo explicó Errejón a El Mundo tras el éxito electoral de mayo de 2014. Podemos tuvo más de 250.000 seguidores en Facebook, frente a los 44.000 del PP y los 61.000 del PSOE, y la situación se repite en Twitter, donde los seguidores de Pablo Iglesias multiplicaron por once a los de PP y PSOE. El millón y cuarto de votos entonces recibidos, con los cinco eurodiputados, fue el fruto de esta operación, más el complemento en la regularidad del voto por provincias, signo de que Podemos llamaba con éxito a la puerta de una franja importante de la sociedad española, realmente “indignada” con el sistema.

También moderno, aunque menos innovador, ya que existía el precedente de Berlusconi, fue el recurso a la videocracia, al establecimiento de una imagen atractiva y dominante del líder gracias a su aparición recurrente en las pantallas televisivas, cuando por fin se produjo el salto de La Tuerka a la Sexta (y con otros líderes, como Errejón, invitados a distintas televisiones para atender la demanda de un público ávido de saber quiénes eran estos jóvenes universitarios que venían a renovar el agua de la charca política). Es un tema sobre el cual insistió ampliamente Pablo Iglesias en su artículo y en su entrevista publicados por la New Left Review en 2015. No en vano las papeletas de las europeas llevaron su imagen, y no las siglas habituales de cualquier partido.

Entraba en juego, asimismo, otro recurso ligado a la revolución digital, la aparente sustitución de la democracia representativa por la verdadera democracia directa, basada en el ejercicio del voto proxy por medio electrónico y sin presencia física. En Italia, el Movimiento 5 Estrellas ha mantenido una lealtad a la promesa de partida, con reiteradas consultas sobre problemas sustanciales. En España, la recurrente manipulación de las preguntas desde la dirección, sin posibilidad de debate previo al voto, acabaron convirtiéndolo en una máscara del monopolio de decisiones ejercido desde la cúpula, léase Pablo Iglesias. Podía este utilizarlo para colar su acceso a la casta con el chalet de Galapagar, nunca para ejercer un posible contraste a sus grandes decisiones, que fuera precedido de un previo en la red. El “centralismo cibercrático”, término acuñado por la socióloga Rosanna de Rosa para el Movimiento 5 Estrellas, se traduce aquí en un revestimiento informático de la fórmula leninista profesada por Pablo Iglesias.

El asalto al cielo, con la premisa de un sorpasso al psoe, pareció dibujarse al mismo tiempo que el voto a los partidos de “la casta” caía hasta el 50 % en 2015, mientras había superado el 80 % en 2011. La eficacia de Iglesias como orador y la novedad de la oferta política hicieron que cientos de miles de ciudadanos atendieran a la convocatoria de Podemos. Iglesias supo percibir la importancia de pescar en los caladeros de malestar social creados por la crisis y los ajustes económicos, y convocó con éxito a los afectados por la pérdida de poder adquisitivo, los desahucios y el paro. Sin olvidar a los partidarios de abrirse a las reivindicaciones nacionalistas en Cataluña y Euskadi, aprobando la autodeterminación pero sin incurrir en un independentismo radical. Era un partido de masas, formado por la agregación de segmentos de malestar social (y también de voluntad de cambio).

En las elecciones generales de diciembre de 2015 la evolución ascendente pareció confirmar las expectativas optimistas, con 69 diputados y un 20% de votos, gracias a la aportación de coaliciones autonómicas, si bien las sucesivas de 2016, a pesar de la coalición con Izquierda Unida, apenas registraron una subida hasta 71 diputados. Empezó el reflujo, observable en las dos elecciones de 2019, compensado por la entrada en el gobierno de coalición PSOE-UP de enero de 2020. Finalmente la caída fue irreversible, a partir de la dimisión de Pablo Iglesias como vicepresidente de gobierno en mayo de 2021, hasta el desastre en mayo de 2023. Es una historia de sobra conocida que no tendría sentido repetir aquí.

EL ECLIPSE

La frustración de las expectativas iniciales contó sin duda, pero sobre todo cuando la evolución ascendente se cortó y puso al descubierto la contradicción de fondo entre el movimiento en mancha de aceite, de captación de grupos de izquierda con aspiraciones diferenciadas, confiados en mantener su autonomía de decisión, y la contracorriente centrípeta derivada del liderazgo único de Pablo Iglesias. La propia desintegración del grupo promotor indicó que el “leninismo” de Iglesias sería amable en el sentido que elogiaba su amigo Monedero, pero resultaba inexorable cuando entraban en juego las opciones políticas de primera importancia. De ahí los abandonos escalonados, la creciente desconfianza y, finalmente, la fragmentación y el fracaso electoral que acabaron caracterizando a Unidas Podemos.

Ignacio Varela ha ofrecido en El Confidencial una explicación del fracaso de Pablo Iglesias en el asalto fallido al cielo del poder, a pesar de que su planteamiento estratégico haya sido acertado. El “teorema de Pablo Iglesias” unía dos ideas. La primera, que “la alianza estable de las formaciones de izquierda de ámbito nacional con todos los partidos nacionalistas de vocación disgregadora” proporcionaba una suma de votos imbatible, siempre que se estableciera “un cordón sanitario sobre la derecha democrática” (para lo cual Vox fue una bendición). Añadiríamos que ese afortunado planteamiento requería –y requiere– un maniqueísmo extremo, la satanización del conjunto de la derecha, para mantener en pie la coalición heterogénea de gobierno, lo que puede llamarse “un país de enemigos”. La segunda, que una vez formada la alianza, la orientación antisistémica acabaría determinando la orientación, léase degradación, de la política propia del componente central, el Partido Socialista.

Desde el punto de vista de la prioridad otorgada por Pablo Iglesias primero a la erosión y, más tarde, a la destrucción del “régimen del 78”, tal perspectiva se encuentra en vías de realización, gracias a la importancia decisiva que el azar de unas elecciones ha otorgado a los partidos independentistas. Ocurre, sin embargo, que la deriva populista del bloque, que Podemos hubiera debido encabezar, en la visión de Iglesias, ha sido asumida por Pedro Sánchez, lo mismo que su premisa de satanización de la derecha, por lo cual ha sido él quien quedó desplazado.

Solo existe el recurso de que en medio de su confusa acción en el gobierno, cargada eso sí de ambición personal, Yolanda Díaz convierta a su arca de Noé en un instrumento político que enlace con la función desestabilizadora que Iglesias pensó para Podemos. En cuanto al caudillo del movimiento izquierdista, con su inexplicable apartamiento del gobierno, en mayo de 2021, parece haber llegado al final de sus expectativas políticas. Parece.

A fin de cuentas, la trayectoria política de Pablo Iglesias recuerda la de aquel pez depredador de El submarino amarillo de los Beatles, que va devorando uno tras otro a los pobladores del mar de los monstruos y acaba devorándose a sí mismo. Lo que ya no resulta evitable es la polución por él introducida en el agua, y tampoco elimina el riesgo de que, como en el caso de las lagartijas, tenga lugar una regeneración.

Los últimos movimientos de Yolanda Díaz, el regreso a primera fila de Errejón y salidas de demagogia pura y dura, como la de proponer la devolución del tesoro de los Quimbayas del Museo de América, apuntan a que el monstruo renacido ya está ahí. Nada tiene de extraño que su primera actuación consistiera en devorar, no sin dificultades, los restos del monstruo que lo engendró. ~

Antonio Elorza es ensayista, historiador y catedrático de Ciencia Política de la Universidad Complutense de Madrid. Su libro más reciente es 'Un juego de tronos castizo. Godoy y Napoleón: una agónica lucha por el poder' (Alianza Editorial, 2023).
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Nossos descendentes considerarão ridículas as afetações ideológicas de hoje

 

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A política febril e polarizada não será superada nesse século e os que falam em nome da democracia alimentam esse cenário. Via FSP, a crônica de Luiz Felipe Pondé:


É comum se lamentar que estamos polarizados. Estamos, sim, e não deveremos superar essa fratura neste século. Pelo contrário, deve piorar. No Brasil e no mundo, aqueles que falam em nome da democracia são os mesmos que alimentam a polarização desde o início.

A política quando militante é sempre febril. Sempre foi. As redes só ampliaram a capilaridade desse ódio político e o tornaram visível como a luz do sol. Na democracia, a soberania é popular e o povo gosta de desentendimentos militantes quando faz política. A intenção é aniquilar o inimigo.

A condição da política é como um espetáculo circense em que se usa armas de verdade. Política sempre foi um circo, hoje a palhaçada está aniquilando a fé pública nas instituições.

Comparado à direita, hoje, o PT é anacrônico na sua operação. A direita atual detém o monopólio do fazer político pós-moderno. A direita é populista, a esquerda é histérica. A tendência da política é se radicalizar cada vez mais, e, por isso mesmo, o ódio crescerá entre aqueles que se julgam a favor ou contra a história. A democracia hoje tende à violência entre populismo e histeria. A direita cospe quando fala, a esquerda é uma farsa moral.

É engraçado quando alguém usa argumentos do tipo "estou do lado certo da história". Este argumento foi usado tanto por nazistas quanto comunistas no século 20. A história não tem lado certo porque ela não tem sentido algum. Este argumento é pura retórica fajuta para deslegitimar quem está do outro lado que não o seu.

A direita hoje detém o anseio das populações que se sentem prejudicadas pelo discurso elitista da esquerda gourmet –a única que sobrou. Grande parte da população está de saco cheio –na Europa e nos EUA– dos riquinhos que querem imigração ilegal para pagarem babás e empregadas baratas em suas casas.

Nos EUA, a classe média alta, graças a turma que atravessa a fronteira vindo do México quase morrendo –e para a qual os inteligentinhos aqui derramam lágrimas de crocodilo–, pode usufruir de serviçais mais baratos. Quem disser o contrário é mentiroso ou não sabe nada da realidade americana. Daí os riquinhos votarem nos democratas, hoje partido da elite americana.

Já os americanos pobres, que poderiam ser esses serviçais, ou aceitam salários menores –que em comparação com o Brasil são verdadeiros salários maravilhosos– como os ilegais, ou ficam sem emprego. Quando votam no Trump, os inteligentinhos os xingam.

Mas, a opção deles é racional com ou sem xingamentos da elite.

Já no Brasil, o povo está de saco de se ferrar na mão de bandidos e usuários de drogas defendidos pela moçada riquinha dos direitos humanos, de ver suas concepções de vida serem humilhadas pelos que acham que ou você aceita a "revolução de gênero" e similares ou você é um lixo cultural, enfim, cansados de serem considerados o esgoto da inteligência política. E isso não deve mudar. Uma vez tendo aprendido a rota da militância através do uso das redes, o povo de direita não vai recuar, por isso, é fundamental regular as redes, certo?

Veja duas pautas na moda. Uma é o baseado do bem. Imagine que fumo um de vez em quando, e que, obviamente, compro do narcotráfico. Não seria lógico supor que mesmo que meu baseado seja legal, continuo a alimentar o narcotráfico? Não seria mais lógico legalizar as drogas e pronto? Por que não? Já sei: quem sabe o narcotráfico e seus representantes nos poderes da república não queiram perder seus lucros infinitos. Pagar impostos sempre foi para os fracos.

Os iluminados da elite intelectual não toleram a imbecilidade obscurantista da imensa maioria do povo brasileiro que é contra o aborto. Disfarçam sua condescendência arrogante para com esses ignorantes falando em "educação". Por que? Porque supõem que quem não concorda com o principio liberal da escolha individual –por trás dos que são a favor da escolha individual pelo aborto– é gente estúpida.

Imagino que nossos descendentes –se existirem– vão nos considerar ridículos com nossas "afetações ideológicas". O século 21 ainda vai nos humilhar muito.
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Conto de fadas amazônico

 

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

Imagens idílicas de Lula e Macron em Belém escondem o descaso histórico com a região. Lygia Maria para a FSP:


O presidente do Brasil de mãos dadas com o presidente da França saltitam pela mata da Ilha do Combu; num barco ao pôr do sol, miram o horizonte com ternos sorrisos. As imagens, que parecem saídas de um conto de fadas amazônico, servem bem à propaganda política de cunho ambientalista, mas escondem o descaso histórico dos governos locais e federal com a região.

No ranking dos cem maiores municípios classificados por indicadores de saneamento básico, Belém ocupa a 93ª posição, com apenas 19,88% da população ligada à rede de esgoto e ínfimos 2,38% de dejetos tratados.

A capital do Pará —cenário das idílicas fotos de Lula e Macron na recente visita do mandatário francês— sediará a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP-30) no ano que vem.

Os alertas de desmatamento na amazônia caíram 29,7% em fevereiro, na comparação com o mesmo período de 2023. O problema é que, ainda assim, é o maior índice registrado desde o início da série histórica do sistema Deter do Inpe, em 2016. No mesmo mês, o Copernicus, observatório europeu, apontou que a emissão de carbono por queimadas no Brasil foi a maior desde 2003.

Na Terra Indígena Yanomami, entre 2022 e 2023, o número de garimpeiros caiu de 20 mil a 3.000, mas o de indígenas mortos foi de 343 para 363. Mesmo considerando a provável subnotificação anterior, o dado é vexatório. Enquanto isso, em outras regiões da Amazônia Legal, como na Terra Indígena Sararé, a área de extração ilegal de ouro explodiu de 36 hectares em 2022 para 252,3 hectares até outubro de 2023.

Saneamento precário, desmatamento, garimpo e infração de direitos dos povos indígenas são problemas crônicos da amazônia que exigem políticas contínuas, interdisciplinares e de longo prazo.

Houve, por óbvio, descalabros sob Bolsonaro. Mas o PT governou o país por 14 anos até a atual gestão, e a realidade cruel que assola a região permanece, encoberta sob a narrativa de um conto de fadas amazônico.
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Veto a cerimônias sobre 1964 não apaga a realidade dos fatos e a memória viva



Golpe militar de 1964 foi em 31 de março ou em 1º de abril? | CNN Brasil

Tanque bloqueia o trânsito próximo ao Palácio Laranjeiras,

Dora Kramer
Folha

O veto a cerimônias oficiais pode até ser visto como sinal de conciliação, mas não apaga os fatos dos idos de março e o golpe em abril há 60 anos. Os militares sabem disso. Percebem que gestos não substituem a realidade.

E a verdade é que uma ruptura institucional efetivada e prolongada por 21 anos tem teor de gravidade bem maior que a recente tentativa frustrada de golpear as instituições. O tempo não as separa, antes exibe um traço de união a ser mantido no radar de todos.

INSPIRAÇÃO – Os golpistas de lá inspiraram os conspiradores de cá. A diferença é que estes se depararam com circunstâncias diversas, e para eles adversas, das que asseguraram o perverso êxito daqueles.

O empenho do presidente Luiz Inácio da Silva na defesa de sua posse e da democracia em geral realmente não combina com a proibição de que o governo promova atos em memória de episódio perverso da quadra brasileira, cuja história é vasta em episódios assemelhados durante o século 20.

Ocorre, porém, que o veto presidencial é aceno dirigido, não impede ninguém, grupo político ou social, de se manifestar individual e/ou coletivamente para marcar a data com a veemência que considerar adequada.

MEMÓRIA VIVA – É o que está acontecendo até em decorrência da decisão de Lula. A partir das críticas a ele, o debate em torno dos acontecimentos e consequências do golpe de 1964 ganhou dimensão correspondente à importância do marco.

Não há uma decisão de Estado que vede homenagens à memória. Não se exige da sociedade que se submeta a uma decisão de governo. Se a liderança tem suas razões para não liderar, os liderados que atuem sem exigências paternalistas.

Lula faz um movimento estratégico, enquanto militares de alta patente são alvos de investigação e prisão sob os ditames do regime civil. Algo inédito, cujo significado não deve ser subestimado, mas visto como resposta compatível com as nossas peculiaridades. Goste-se ou não, é como fazemos.


 

Brasil elogia Corte Internacional por exigir medidas de Israel em Gaza

 

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O Ministério das Relações Exteriores (MRE) do Brasil elogiou, em nota publicada neste sábado (30), a decisão da Corte Internacional de Justiça (CIJ) que determinou que Israel adote medidas adicionais para garantir o fornecimento de serviços básico e assistência humanitária aos palestinos na Faixa de Gaza.

“O governo brasileiro saúda a adoção, em 28 de março, pela Corte Internacional de Justiça (CIJ), de novas medidas cautelares, no âmbito do processo instaurado pela África do Sul contra Israel, com base na Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio.”

A CIJ é o principal órgão jurídico das Nações Unidas (ONU) que julga denúncias de crimes contra Estados. Na última quinta-feira (28), a Corte emitiu decisão, por 14 votos contra dois, exigindo que Israel adote medidas cautelares adicionais para evitar a degradação da vida do povo palestino.

O Itamaraty recordou que as medidas determinadas pela CIJ têm “caráter vinculante”, o que significa que os países signatários da ONU concordaram em respeitar as decisões do Tribunal.

Ainda segundo o MRE, “o governo brasileiro espera que [as medidas] possam resultar em urgente alívio humanitário para Gaza e em ambiente de diálogo político que permita um cessar-fogo definitivo, a libertação imediata de todos os reféns e a retomada de negociações para a solução de dois Estados”.

O governo brasileiro ainda lembrou que a fome instalada em Gaza matou “ao menos 31 pessoas, entre as quais 27 crianças, por malnutrição e desidratação, conforme relatório recente do Escritório das Nações Unidas para Coordenação de Assuntos Humanitários”.

Entre as medidas determinadas pelo Tribunal, está a cooperação plena com a ONU para a prestação desimpedida, e em grande escala, de assistência humanitária e prestação de serviços básicos, aumentando os pontos de passagem terrestre à Gaza, que devem ficar abertos pelo tempo que for necessário.

O órgão ainda exige que os militares israelenses não cometam atos que violem os direitos dos palestinos e que o governo de Israel apresente ao Tribunal um relatório sobre as medidas que adotou para cumprir a ordem da CIJ. A resposta de Israel deve ser apresentada até o dia 28 de abril.

De acordo com a decisão, “as catastróficas condições de vida dos palestinos na Faixa de Gaza deterioraram-se ainda mais, em particular devido a prolongada privação generalizada de alimentos e outras necessidades básicas a que os palestinos em Gaza foram submetidos”. Além disso, a Corte afirmou que “os palestinos em Gaza não enfrentam mais apenas o risco de fome, conforme consta do Despacho de 26 de janeiro de 2024, mas a fome está instalada”.

Em 29 de dezembro de 2023, a África do Sul ingressou com uma ação na CIJ acusando Israel de genocídio. A ação recebeu o apoio de diversos países, incluindo o Brasil. Na última segunda-feira (25), a relatora da ONU para os territórios palestinos ocupados, Francesca Albanese, também denunciou Israel por genocídio em Gaza.

Grupo de especialistas apoiados pela ONU alertam que metade da população de Gaza, cerca de 1,1 milhão de pessoas, sofrem risco de “fome catastrófica” no enclave palestino. De acordo com a Classificação da Fase de Segurança Alimentar Integrada (IPC), a desnutrição aguda entre crianças de 6 meses a 23 meses de idade aumentou de 16,2% para 29,2% entre janeiro e fevereiro deste ano.

O governo de Tel Aviv nega as acusações. Diz que a África do Sul e a relatora especial da ONU distorceram a situação no enclave palestino, que o país respeita o direito humanitário internacional e que a guerra seria contra o Hamas, e não contra o povo palestino.

Dados mais atualizados apontam que 32,5 mil pessoas morreram e outras 75 mil estão feridas após 175 dias de guerra na Faixa de Gaza. Esse número não inclui os 8 mil corpos que as autoridades locais de Gaza estimam estarem sob os escombros de prédios bombardeados por Israel.

Agência Brasil

Operação Sanctus Terminus da PF combate crimes transnacionais

 

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Duas prisões de foragidos da Justiça e apreensão de produtos contrabandeados é o saldo da Operação Sactus Terminus realizada pela Polícia Federal, com o apoio do Batalhão de Polícia de Fronteira e Divisas (BPFron), da Marinha do Brasil, do Exército Brasileiro e da Receita Federal do Brasil, na fronteira com a Bolívia, no Rio Mamoré.

A ação para prevenção e repressão a crimes transnacionais foi realizada entre os dias 25 e 29 de março. Também houve apreensão de embarcações de transporte clandestino, mais de 150 abordagens a embarcações e veículos.

Foram realizados ainda patrulhamentos fluviais no Rio Mamoré e patrulhamentos terrestres nas áreas fronteiriças de Guajará-Mirim (RO), especialmente em locais utilizados como portos clandestinos, com ações de fiscalização no Porto Alfandegado de Guajará-Mirim.

Agência Brasil

Paes diz que foi um erro nomear Chiquinho Brazão, suspeito no caso Marielle

 

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O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), afirmou neste sábado (30) que foi um erro ter nomeado o deputado federal Chiquinho Brazão (sem partido) como secretário em sua gestão, mesmo com a suspeita de envolvimento da família com a morte da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes.

A fala do prefeito também sinaliza um rompimento com o Republicanos, sigla que indicou Chiquinho para o cargo. Nesta semana, ele exonerou aliados do deputado, o substituto indicado pelo partido e nomeou uma pessoa de seu próprio grupo político.

“Foi um erro da minha parte, na constituição da aliança, a gente colocar uma pessoa que tinha sido suspeita. Eu posso aqui ter todas as desculpas do mundo, os seis anos [de investigação sem conclusão], todo mundo já tinha sido acusado de tudo, mas errei”, afirmou o prefeito, após participar da primeira viagem no corredor Transbrasil entre os terminais Deodoro e Gentileza.

Chiquinho e o irmão, Domingos, conselheiro do TCE (Tribunal de Contas do Estado), foram presos sob suspeita de serem os mandantes da morte da vereadora.

O deputado foi nomeado em outubro, apesar das suspeitas sobre o irmão desde 2018 de envolvimento de crime. De acordo com o prefeito, o nome foi indicado pelo Republicanos como parte da aliança da sua pré-candidatura de reeleição.

Chiquinho foi exonerado em fevereiro, uma semana após a divulgação sobre o acordo de delação premiada do ex-PM Ronnie Lessa, acusado de ser o executor do crime.

“Mais importante quando você erra é consertar o erro. Já tinha sido pedido que ele fosse retirado da secretaria, e aqui não quero fazer pré-julgamento, mas, diante das suspeitas e da prisão dele, eu pedi que fosse retirado da secretaria antes, quando começaram a surgir os boatos”, disse o prefeito.

Em seu lugar, o Republicanos indicou a nomeação do deputado federal Ricardo Abrão, do mesmo grupo político dos Brazão. Ele manteve 15 nomeados por Brazão no cargo, segundo levantamento do vereador Pedro Duarte (Novo).

Após a prisão de Brazão, o prefeito exonerou aliados do deputado, bem como o secretário substituto. Em seu lugar, indicou Marli Peçanha, que estava no cargo desde o início de seu mandato até a nomeação de Chiquinho.

Após a mudança, o Republicanos passou a articular um desembarque da aliança de Paes para apoiar o deputado federal Alexandre Ramagem (PL), indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro na disputa. O prefeito sinalizou que não deve buscar a reconciliação.

“A gente nesse momento entende que o Republicanos, com os quadros que dispunha aqui, não era adequado.

Queremos alianças, mas as alianças têm que ter um limite.”

Italo Nogueira / Folhapress

Lula pode incentivar volta da democracia na Venezuela, diz opositora de Nicolás Maduro

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Esta entrevista deveria ter sido realizada na manhã da última quinta-feira. Mas, repentinamente, Corina Yoris, nome que a oposição na Venezuela almeja inscrever para as eleições presidenciais de julho, ficou sem luz durante todo aquele dia.

Apagões não são incomuns em Caracas, dada a crise energética que vive o país sob o regime de Nicolás Maduro.

Mas a coincidência de um blecaute prolongado em uma semana na qual seus dias foram regados a sequenciais entrevistas com a imprensa internacional a surpreendeu.

Com recém-completados 80 anos, Yoris foi apontada pela coalizão de partidos opositores venezuelanos como candidata à Presidência. Mas no último dia 25 viu seu debute na política institucional frustrado ao não conseguir inscrever seu nome na plataforma eleitoral.

O feito acrescentou mais uma camada de incerteza às eleições, já marcadas pela inabilitação política da popular ex-deputada María Corina Machado, a original vencedora das primárias opositoras.

Para não perder a vaga, a coalizão opositora inscreveu o ex-diplomata Edmundo González no lugar de Yoris. No entanto, reiteradamente avisa que o plano é substituir seu nome pelo dela até o próximo dia 20, algo possível segundo o regramento eleitoral local.

Graduada em filosofia e letras e doutora em história, Corina Yoris por décadas tem atuado como professora universitária. Aposentada, em breve voltará à sala de aula para lecionar em um doutorado em direito.

Por videochamada de sua casa na capital venezuelana, ela descreve à Folha suas convicções políticas e econômicas, comenta o papel do governo Lula (PT) e a situação atual de seu país.

Folha – O governo Lula criticou a impossibilidade da sua candidatura. Isso após várias declarações polêmicas do presidente em relação à Venezuela. Como a senhora leu essas declarações?

Corina Yoris – As declarações recentes de Lula dão apoio à restituição da democracia no país. Ajudam o regime a dar espaço para a possibilidade de eleições livres. E acho que as respostas dadas [por Caracas] são desrespeitosas em termos de linguagem diplomática internacional.

[A diplomacia venezuelana chamou as críticas feitas em nota do Itamaraty de “cinzentas e intervencionistas” e disse que elas pareciam ter sido “ditadas pelos EUA”].

Folha – O que mais acha que o Brasil deve fazer?

Corina Yoris – Acredito que manter essa atitude é suficiente. Algo muito importante é ter cuidado para não ser acusado de pedir interferências. E uma manifestação desse tipo não é interferência, é atuação para dizer a um governo para não se desviar de certos canais e respeitar certos acordos.

Folha – O governador de Zulia, Manuel Rosales, líder de um dos partidos, candidatou-se de última hora e foi criticado por María Corina. Houve uma fragmentação da coalizão opositora?

Corina Yoris – No último minuto da segunda-feira passada, prazo para as inscrições dos candidatos, ainda não havíamos conseguido inscrever meu nome porque o sistema impedia. Mas então, milagrosamente, o sistema se abriu e puderam inscrever Manuel Rosales, sem que isso tivesse sido aprovado por toda a unidade. Tenho apreço pelo governador Rosales, mas ele age unilateralmente, não em nome da unidade.

O mesmo acontece com Edmundo González, que inscrevemos para não perder a vaga, mas que também não é o resultado do consenso. Não me arrisco a dizer que há uma fragmentação ou uma ruptura por ora, porque ainda temos até o dia 20 de abril em que podem ser feitas substituições.

A candidata da unidade sou eu. Fui eleita por unanimidade pela Plataforma Unitária, isso é incontestável.

Folha – Alguma parte do Acordo de Barbados, firmado no país homônimo entre Maduro e uma parcela da oposição, segue viva?

Corina Yoris – Nós o cumprimos da primeira à última letra. São eles [o regime] que têm de voltar e cumprir o que foi dito e realizar eleições livres, transparentes, críveis.

Deixar que os candidatos que foram eleitos nas primárias do ano passado se inscrevam.

María Corina obteve 92,3% dos votos, um fenômeno nunca visto, e então ela delegou a mim essa candidatura, já que está ilegal e inconstitucionalmente impedida.

Folha – Como começou o envolvimento da sra. na política? Imaginava-se nesse papel?

Corina Yoris – Nunca imaginei. Tenho uma formação muito sólida em política e até dei aulas na área de filosofia política, então minha incursão na política pode ser chamada de teórica. No entanto, tenho participado de algumas coisas talvez muito pontuais e de menor publicidade, como quando, nas eleições de 1998, formamos na universidade um grupo de observadores para monitorar as eleições.

O que posso dizer é que nunca tive atuação partidária. Mas minha atuação no mundo da cultura e da academia levou meu nome para a Comissão Nacional de Primárias, que organizou as eleições primárias de 22 de outubro passado.

Quando fui nomeada, estive em contato direto com todos os candidatos, mas principalmente com María Corina. Ela queria que eu me envolvesse mais ativamente em todo o movimento de apoio à sua candidatura.

Depois, um dia ela me ligou para conversar e, com sua típica personalidade, fez o pedido de uma vez só, e eu respondi com um sim imediato, quase sem pensar nas consequências que tudo isso traz.

Folha – Em quais termos a sra. se define politicamente?

Corina Yoris – Sou uma democrata militante, absolutamente a favor da democracia. Não me identifico com as divisões de esquerda e direita, acredito que isso está completamente obsoleto, pois se você as analisa, percebe que algumas características da direita também estão presentes na esquerda e que não conseguem se distinguir. Acredito na política com “p” maiúsculo, não na politicagem.

Folha – Há muitos governos que se dizem de esquerda na região e são vistos como mais próximos uns dos outros.

Como vê esse tipo de aliança?

Corina Yoris – Esse é um dos grandes problemas que a América Latina enfrenta, essa contraposição de ideias. Com essa história do “socialismo do século 21”, estamos alguns passos atrás dos avanços de todos os tipos.

Como explicar que a Venezuela, que chegou a fornecer eletricidade para outros países, como Colômbia e do Brasil, esteja enfrentando a crise elétrica que temos no país? Ou como é possível que, tendo uma região como a Amazônia, tenhamos os problemas de água que temos?

Um dos grandes dramas que enfrentamos, para não dizer o maior drama, é a falha nos serviços públicos.

Folha – E na agenda econômica, como a sra. se descreve? Quais os planos nessa área, cujo fracasso só tem ampliado a diáspora local?

Corina Yoris – Acredito no livre mercado. Temos que nos adaptar aos tempos em que estamos vivendo e ter em mente que a Venezuela é um país com grandes riquezas para comercializar, não nos trancar em uma propriedade do Estado que vimos as consequências que nos trouxe.

Como as pessoas não iriam embora se têm uma pensão equivalente a US$ 3,50? Acaba se criando uma população que está sujeita à maior quantidade de privações possível e que só está preocupada em como conseguir comida, como sobreviver, tendo anulada completamente sua capacidade de se preocupar com a política.

Folha – Como a ditadura afetou a senhora a nível pessoal?

Corina Yoris – Como professora, tenho um salário absolutamente irrisório. Além do aspecto econômico, há o da segurança. Para mim, mudou muito. Eu podia sair da universidade às 21h, 22h.

Agora, não me atrevo a sair depois das 18h. Isso faz com que você não vá a eventos culturais, não vá ao cinema, ao teatro. Aqueles que se atrevem a ir são os mais jovens, que têm mais ânimo para se arriscar, mas nesse sentido você acaba sendo um eremita ou levando uma vida muito restrita às amizades mais próximas nos lugares mais próximos, porque não tem como desenvolver outras partes de sua vida.

Nossa vida foi se reduzindo, as possibilidades foram se reduzinro, e essa é uma das razões pelas quais estou envolvida nisso. Porque se desfrutei de um país onde pude não apenas fazer o que um jovem quer fazer e se divertir, mas também tive acesso aos estudos que tive e fiz tudo o que quis, estou retribuindo à Venezuela o que a Venezuela me deu. Isso está me exigindo essa participação, e eu a dou ao país com todo o prazer, embora tenha um pouco de medo.

Folha – A senhora teme por sua segurança?

Corina Yoris – Sim, mas eu lido com isso. Eu não sou medrosa, mas evidentemente se sabe que se está em perigo.

Na Venezuela todos estamos em perigo, não é uma pessoa, todos estamos em perigo, porque a criminalidade está descontrolada.

Folha – Acha que vão conseguir inscrever seu nome?

Corina Yoris – Eu não me resigno. Não joguei a toalha e acredito que somos muitos os que não jogaram a toalha.

Folha – A idade da sra. tem sido muito comentada.

Corina Yoris – Eles sabem minha idade porque disseram, não porque eu disse. Me parecem comentários desqualificadores.

Há uma anedota de Clint Eastwood da qual vou me apropriar. Ele tem 93 anos e está dirigindo um filme que requer um esforço enorme. Um jornalista perguntou de onde ele tirava tanta energia e ele respondeu: eu não deixo o velho entrar na minha casa.
A desqualificação por ser mulher também remete a estágios que eu pensava superados no país e não estão. Veja a lista dos candidatos aceitos. Todos são homens. Ou seja: voltamos à mesma configuração das coisas. Como se a política fosse apenas espaço para eles.

Folha – A senhora ainda vê chances de eleições reais?

Corina Yoris – Acredito que sim, é possível. Mas estão violando meus direitos políticos. Estão violando os direitos políticos dos partidos que me indicaram. E estão violando os direitos de milhões de venezuelanos que votaram em María Corina e a apoiaram em sua delegação de candidatura. O regime precisa repensar se quer que suas eleições sejam consideradas críveis no resto do continente.

Nascida em Caracas, é graduada em filosofia e letras e doutora em história. Professora de lógica e teoria argumentativa em várias universidades de seu país e do exterior, ganhou recentemente uma vaga na Academia Venezuela da Língua. Ajudou a organizar as primárias opositoras em 2022 e agora é o nome que a Plataforma Unitária tenta inscrever para as eleições.

Mayara Paixão / Folhapress