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Por óbvio, a parábola do homem gordo e do homem magro também se aplica ao Brasil. Mas tudo indica que ela será solenemente ignorada, a julgar pelos movimentos dos primeiros 60 dias do novo governo. Luciano Trigo para a Gazeta do Povo:
Em
2003, quando Israel atravessava uma grave crise econômica, com
acentuada queda do PIB, déficit nas contas públicas e altos índices de
inflação e desemprego, Benjamin Netanyahu foi chamado para ocupar o
cargo de ministro das Finanças. Seu desafio era apresentar, em um prazo
de três semanas, um plano econômico que tirasse o país do buraco.
Ele
sabia qual era o caminho para superar a crise: um Estado mais leve e um
mercado mais forte. Mas sabia também que esta era uma mensagem de
difícil assimilação para a sociedade israelense, habituada a um modelo
econômico altamente centralizado e estatista, semi-socialista em alguns
aspectos.
Netanyahu
acreditava firmemente na supremacia do livre mercado, mas também sabia
que, como esta supremacia não era algo “auto-evidente” para a maioria
das pessoas, cabia aos líderes da nação não somente fazer as escolhas
certas e tomar as melhores decisões, mas também comunicá-las de forma
eficaz à população.
Elaborado
o plano, ao cabo das três semanas previstas Netanyahu deu uma
entrevista coletiva que ficou famosa, na qual contou um episódio de sua
juventude.
Durante
o serviço militar obrigatório (que em Israel é realmente obrigatório,
vale lembrar: dois anos e meio para homens e dois anos para mulheres), o
sargento colocou os recrutas em uma fila aleatória, para participar de
uma corrida peculiar. As regras eram: cada soldado teria que carregar
nos ombros o colega ao seu lado.
Duas
duplas se destacaram na corrida: a de um recruta magrinho que teve que
levar nas costas o recruta mais gordo do pelotão; e a de um recruta
robusto, que deu a sorte de carregar nos ombros um colega franzino.
Como
era previsível, o recruta magrinho colapsou no meio do caminho e sequer
completou a prova – vencida, com folga, pelo recruta com a carga mais
leve.
Em
todas as economias modernas, explicou Netanyahu na entrevista, acontece
uma corrida na qual o setor público está montado nas costas do setor
privado: “No nosso caso, o setor público se tornou grande demais, gordo
demais, e o país está a ponto de colapsar. Precisamos colocar o homem
gordo em uma dieta severa, precisamos fortalecer o homem magro e
precisamos remover os obstáculos do trajeto, as barreiras que prejudicam
a competição”.
A
história ficou famosa em todo o país como a parábola do homem gordo e
do homem magro. Assunto de conversa de bar e de taxistas, a história se
tornou a necessária narrativa popular que ajudou a entender as medidas
adotadas pelo ministro: limitar o papel do setor público e dos
sindicatos, aumentar a liberdade econômica, reduzir os gastos públicos e
o tamanho do Estado, reformar a Previdência, encorajar a inovação e o
empreendedorismo, investir em infraestrutura e reduzir a carga
tributária (em mais de 20 pontos percentuais, tanto para pessoas físicas
quanto para empresas).
Fizeram
tudo isso, e funcionou. Como consequência das reformas implementadas
por Netanyahu, os investimentos privados, inclusive estrangeiros,
aumentaram barbaramente, ensejando um crescimento médio de 5% ao ano na
década seguinte (mesmo com o fraco desempenho de 2008, em função da
crise global daquele ano).
Netanyahu conhecia bem a curva de Laffer, citada no meu artigo “Números contra narrativas”,
e entendia que, quando a carga tributária de um país cresce a ponto de
punir o trabalho e o investimento privado, ela acaba provocando uma
diminuição da arrecadação.
O
raciocínio é simples: por que trabalhar e investir mais, gerando
empregos, se o Estado vai abocanhar uma parte cada vez maior do que eu
produzo?
Mas
não se tratava apenas disso. Netanyahu sabia que o mundo é competitivo,
que as nações competem entre si e que, se o líder de uma nação não
proteger os interesses do seu povo, o país rapidamente ficará para trás.
(Hipótese
a ser desenvolvida: o que pode estar em curso no planeta neste exato
momento, com a propaganda maciça em torno da agenda ESG, é um ambicioso e
deliberado projeto de congelamento do poder global, cujo resultado
prático será restringir o potencial de crescimento do nosso país e
condenar o Brasil – ainda que com argumentos muito bonitos, como o da
proteção ao meio-ambiente – a um papel periférico no concerto das
nações.)
Por
óbvio, a parábola do homem gordo e do homem magro também se aplica ao
Brasil. Mas tudo indica que ela será solenemente ignorada, a julgar
pelos movimentos dos primeiros 60 dias do novo governo.
Os
sinais são claros: os reiterados ataques ao teto de gastos; a criação e
aumento (ou “recomposição”) de impostos; a perpetuação do discurso de
palanque eleitoral; as críticas à independência do Banco Central; as
possíveis restrições à liberdade econômica (com a proposta, por exemplo,
de regulamentar o Uber); a política externa ideologicamente orientada;
e, não menos importante, a retomada com força do discurso do “nós contra
eles”, que tanto mal já fez a este país.
É
uma receita que já deu errado em diversas ocasiões, em países vizinhos e
aqui mesmo no Brasil, resultando em inflação, desemprego, desaceleração
da economia e aumento da pobreza.
Como
diz a frase erroneamente atribuída a Albert Einstein, “insanidade é
fazer a mesma coisa e esperar resultados diferentes”. Se a atribuição de
autoria é equivocada, nem por isso a tese é menos verdadeira.
Mas desta vez vai dar certinho, confia.
[Disclaimer:
nos tempos estranhos que vivemos, por via das dúvidas, talvez seja
necessário enfatizar que as palavras “gordo” e “magro” foram empregadas,
ao longo deste artigo, sem qualquer conotação gordofóbica ou
magrofóbica.]
Postado há 5 days ago por Orlando Tambosi
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