Prometo comportar-me como a maioria dos cidadãos nas partes civilizadas do mundo onde a vacinação vai adiantada e serve para levarmos uma vida normal e não o simulacro de vida que o governo quer impor. A crônica semanal de Alberto Gonçalves para o Observador (lembro que Portugal está sob governo socialista: mas a vacinação lá está tão lenta quanto aqui no Grotão bolsonarista, sucessor do Grotão lulista)
Passaram
nesta sexta-feira 14 dias após a segunda dose da vacina da Pfizer, que
tomei porque quis e não porque, com bons ou maus modos, me mandaram
tomar. Segundo os estudos disponíveis, nos quais por enquanto acredito,
estou entre 64% e 96% protegido contra a infecção, mais protegido ainda
contra a possibilidade de infectar alguém, e praticamente imune a
qualquer versão grave da doença. Se adicionar o critério da idade, isto
significa que para mim a Covid acabou, e que o risco existente, já antes
baixo, é hoje tão ínfimo que seria patético preocupar-me com o assunto.
Na
verdade, tirando os 15 dias iniciais, em que até encomendei um
oxímetro, nunca me preocupei muito, se é que me preocupei de todo.
Jamais usei máscara na rua ou em restaurantes. Deixei de despejar aquela
gosma nas mãos quando, para aí há um ano, se descobriu que a propagação
do vírus através das superfícies é assaz nula. E em momento nenhum
moderei o convívio com familiares e amigos, todos felizmente saudáveis
quanto à Covid e principalmente quanto à doideira que o medo da Covid
suscita. Se, à imagem do que sucedeu a muitos, alguém próximo tivesse
enlouquecido com o pânico espalhado pelos noticiários, é óbvio que não
lhe imporia a minha presença – e de certeza que essa alminha não
voltaria a impor-me a dela (lido mal com chalupas).
Daqui
em diante, prometo comportar-me como se comporta a maioria dos cidadãos
nas partes civilizadas do mundo, onde a vacinação vai adiantada e serve
para levarmos uma vida normal e não o simulacro de vida que um governo
anti-democrático deseja que levemos. Não espero voltar a tapar a cara da
grotesca maneira que, de 2019 para trás, era exclusiva de assaltantes,
fanáticos religiosos ou turistas asiáticos. Se, no interior de um
estabelecimento, tentarem converter-me ao farrapo nas fuças, agradeço a
cortesia e venho embora. Também não tenciono começar agora a cumprir, ou
sequer conhecer, as “regras” de horários e circulação, que não
respeitei na medida em que as “autoridades” em questão não são
susceptíveis da mínima respeitabilidade. Seria tão absurdo acatar o
folclore legislativo e ilegal destes governantes quanto pagar multas por
excesso de velocidade num país em que um carro a 200 km/h mata um
desgraçado e o ministro não sai do carro, não sai do governo e não entra
na cadeia.
Por
fim, não pedi e, salvo talvez para utilização em aeroportos, não
pedirei o famoso “certificado digital”. Era o que faltava ter de fazer
prova do meu estado de saúde a funcionários da restauração, da hotelaria
e do que calhar. De facto, os tempos mudaram. Há quase 40 anos, face a
idêntico nevoeiro sobre as fontes de contágio, os receios “sociais”
perante a SIDA não eram menores do que os receios sanitários: metade dos
esforços consistiam em garantir que ninguém seria discriminado. Em
2021, o empenho na discriminação é assumido e anunciado. Em ditaduras ou
lugares a caminho de o serem, é celebrado. Embora eu não veja
televisão, juraram-me que há criaturas em “debates” a propor a
interdição de espaços públicos a quem não apresentar o repulsivo
“certificado” – e não são imediatamente detidas por incitação ao ódio ou
loucura perigosa. Não por acaso, são os mesmos tarados que, à revelia
da ciência e em nome do que chamam “ciência”, acham as vacinas
insuficientes para o “alívio” das restrições. Inchados de fé, os
inquisidores não se atormentam com a realidade e o bom senso.
É
por causa de gente assim – e por causa de gente assim abundar por aí –
que o fim da Covid, doravante uma doença endémica no meio de inúmeras
outras, não significa o fim do horror que a histeria da Covid revelou.
Não falo das benesses proporcionadas ao poder, leia-se o aproveitamento
do PS para implantar uma proto-ditadura enquanto os anjinhos se
distraíam com uma pandemia sem precedentes desde a anterior. Falo dos
meus compatriotas. Não sou um fervoroso crente na bondade humana, e por
definição na bondade dos portugueses. Porém, nem eu suspeitava de
tamanha quantidade de gente indigna, e de tamanha concentração de
indignidade. A Covid não se limitou a trazer à superfície a prodigiosa
ignorância que por aí vai, uma primitiva incapacidade de interpretar
dados simples, de estabelecer relações de causa e consequência, de
permitir que a dúvida perturbe a cegueira das convicções. A Covid também
mostrou que uma assustadora percentagem dos sujeitos com que nos
cruzamos na rua acumulam as piores características disponíveis à
espécie.
Bem
para lá da Covid, custará partilhar a existência com multidões de
delatores, ressabiados, prepotentes, retardados, invejosos, servis,
lorpas, fascistas, socialistas e o camandro. No entanto, é disto que o
país está cheio. É isto que elege os adversários da liberdade que temos
por políticos. É com isto que somos forçados a lidar nas minúcias
diárias. Pensando melhor, sou capaz de adoptar indefinidamente uma das
“recomendações” da DGS. O “distanciamento social” é uma expressão
horrenda, mas uma prática saudável em sítios infectos.
Nota: O autor, que sou eu, vai duas semanas de férias. A crónica regressa no dia 14 de Agosto.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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