Há em andamento profundas e positivas mudanças comportamentais. Carlos Alberto Di Franco para o Estadão:
A
sociedade desenhada no noticiário parece refém do vírus da morbidez.
Crimes, aberrações e desvios de conduta desfilam na passarela da mídia. A
notícia positiva, tão verdadeira quanto a informação negativa, é uma
surpresa, quase um fato inusitado.
O
recurso ao negativismo sistemático esconde uma tentativa de ocultar
algo que nos incomoda: nossa incapacidade de valorizar boas histórias e
flagrar a grandeza do cotidiano. “Quando nada acontece”, dizia Guimarães
Rosa, “há um milagre que não estamos vendo.”
O
jornalista de talento sabe descobrir a grande matéria que se esconde no
aparente lusco-fusco do dia a dia. A mídia, argumentam os aguerridos
defensores do jornalismo realidade, retrata a vida como ela é. Teria,
contudo, o cotidiano do brasileiro médio nada além de tamanhas e tão
frequentes manifestações de violência e de tristeza? Penso que não.
A
informação sobre a juventude, por exemplo, dá prioridade a um recorte
da realidade, mas frequentemente sonega o outro lado, o luminoso e
construtivo. O aumento da violência e a escalada das drogas castigam a
juventude. A crise econômica, dramática e visível a olho nu, exacerba o
clima de desesperança.
Para
muitos jovens os anos da adolescência serão os mais perigosos da vida.
Desemprego, gravidez precoce, aborto, doenças sexualmente transmissíveis
e drogas compõem a trágica equação que ameaça destruir o sonho juvenil e
escancarar as portas a uma explosão de violência.
Mas
olhemos, caro leitor, o outro lado da realidade. Verdadeiro e factual,
embora menos noticiado por uma mídia obcecada pela síndrome da
informação sombria.
A
delinquência, na verdade, está longe de representar a maioria
esmagadora da população estudantil. Denunciar o avanço da violência e a
falência do Estado é um dever ético. Mas não é menos ético iluminar a
cena de ações construtivas, de gestos de solidariedade, de magníficas
ações de voluntariado, marca registrada de uma juventude generosa e
trabalhadora, que, sem alarde ou pirotecnia do marketing, colabora, e
muito, na construção da cidadania.
A
juventude, ao contrário do que fica pairando em algumas reportagens,
não está tão à deriva assim. Há em andamento profundas e positivas
mudanças comportamentais.
O
relacionamento descartável vai sendo substituído pelo sentido do
compromisso. A juventude atual, não a desenhada por certa indústria
cultural que vive isolada numa bolha ideológica e de costas para a
realidade, manifesta procura de firmeza moral, de valores familiares,
éticos e até mesmo religiosos. Não é uma opinião. É um fato.
A
família, não obstante sua crise evidente, é uma forte aspiração dos
jovens. Ao contrário do que se pensa em certos ambientes politicamente
corretos, os adolescentes atribuem importância decisiva ao ambiente
familiar. Mesmo os jovens que convivem com a violência doméstica
consideram importante a base familiar. A relação no lar é fundamental,
ainda que haja conflito. Parece paradoxal, mas é assim. Eles acham
melhor ter uma família danificada do que não ter ninguém. Os jovens, em
numerosas pesquisas, apontam a família tradicional como a instituição de
maior ascendência em suas decisões.
Alguns,
no entanto, defendem um modelo de família que não bate com esse anseio
dos jovens. Respeito a divergência e convivo com o contraditório. Sem
problema. Mas não duvido que é na família, na família tradicional, mais
do que em qualquer outro quadro de convivência, que podem ser cultivados
os valores, as virtudes e as competências que constituem o melhor
fundamento da educação para a cidadania. E os jovens sabem disso.
No
campo da afetividade, antes marcado pelo relacionamento descartável e
pela falta de vínculos, vai-se impondo a cultura da fidelidade. O tema
da sexualidade, puritanamente evitado pela geração que se formou na
caricata moral dos tabus e das proibições, acabou explodindo, sem
limites, na síndrome do relacionamento promíscuo e transitório. Agora o
rio está voltando ao seu leito. O frequente uso de alianças na mão
direita, manifestação visível de compromisso afetivo, não é só modismo.
Revela algo mais profundo. Os jovens estão apostando em relações
duradouras.
Assiste-se,
na universidade e no ambiente de trabalho, ao ocaso das ideologias e ao
surgimento de um forte profissionalismo. Ao contrário das utopias do
passado, os jovens acreditam na excelência e no mérito como forma de
fazer a verdadeira revolução. Eles defendem o pluralismo e o debate das
ideias. O pensamento divergente é saudável. As pessoas querem um
discurso diverso, não um local onde se pregue apenas uma corrente de
pensamento.
Impressiona
o número de jovens que abraçam o estudo da Filosofia, da Literatura e
da História com grande liberdade de espírito. Não são reféns da matriz
marxista que dominou, e ainda domina, a velha academia. A revolução em
andamento é profunda e duradoura.
O
mundo está mudando. Quem não perceber – na mídia e fora dela – essa
virada cultural e comportamental perderá a conexão com um importante
segmento do mercado de consumo editorial.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário