Os assuntos políticos são da competência exclusiva daqueles que foram eleitos pelo voto. Artigo o desembargador Aloísio de Toledo César, publicado pelo Estadão:
Aquele
que tem a espada nas mãos pode sentir a compulsão de atirá-la sobre a
mesa na hora da negociação. Essa é a conclusão que se extrai da ameaça
que o general Walter Braga Netto, ministro da Defesa, fez ao País quando
avisou ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, que se não
houver voto impresso não haverá eleição no ano que vem.
O
general em questão está ocupando o cargo de ministro da Defesa para a
defesa do Brasil, e não de uma posição política absolutamente torpe, que
seria a continuidade do mandato do presidente Jair Bolsonaro. Ele não
tem que se meter nesse assunto político, que é da competência exclusiva
daqueles que foram eleitos pelo voto.
Para
agradar ao presidente da República, assim como se estivesse gostando
muito de permanecer no cargo de ministro, o general não precisaria
curvar-se tanto. A sua obrigação, assim como de qualquer outro
brasileiro, é esperar que Jair Bolsonaro cumpra o seu mandato até o
último dia, mas sem jamais encompridá-lo por mais tempo ao pretexto de
não termos voto impresso.
Esse
é um assunto exclusivamente político, de tal forma que os militares, se
nele se envolverem, estarão agindo unicamente como brasileiros, não
como possuidores de armas e canhões. Se não houver voto impresso, como
deseja o presidente da República, o que o general Braga Netto vai fazer?
Porventura enviará canhões à Praça dos Três Poderes e dizer: “Aqui
mandamos nós”?
O
fato de militares se erigirem em organização política, deixando de
obedecer a um governo, representaria um perigo para o Estado, porque
eles são os seus protetores e não devem jamais se aventurar em condutas
não autorizadas pela Constituição e pelas leis do País.
O
Exército Brasileiro tem a imagem do povo porque é dele constituído. Não
é admissível que seja instrumento político de uma determinada classe
política, um presidente da República que almeja reeleger-se, por
exemplo.
As
questões eleitorais costumam ser empolgantes e de interesse de cada um
de nós, incluídos os militares, porém pelo seu lado de cidadão, e não de
detentor das armas. Se um militar, seja soldado, seja general, deseja
envolver-se na política eleitoral, deve fazê-lo de conformidade com a
legislação em vigor, jamais por ameaças aos civis.
Afirma-se
que o número de militares ocupantes de cargos civis no atual governo é
muito grande, em proporção jamais vista anteriormente. Significa que
eles auferem melhores rendimentos em dinheiro, mas somente esses
privilegiados, não o grosso da tropa, que sofre as agruras de um infeliz
governo, como todos os demais brasileiros.
A
submissão de civis aos militares é muito comum na América Latina. Entre
nós, teve início com a proclamação da República, quando o marechal
Deodoro da Fonseca, em 15 de novembro de 1989, assumiu a chefia do
governo provisório na qualidade de comandante do movimento armado.
Os
civis Ruy Barbosa e Campos Salles eram seus subordinados. Mas a vocação
pela força e pelo poder resultou em que o marechal Floriano Peixoto
desse um golpe e ficasse no poder por quase quatro anos.
Depois
dessa época, os civis somente assumiram o poder quando Prudente de
Moraes foi eleito presidente da República, em eleição direta, seguido
depois por Campos Salles e Rodrigues Alves. A democracia brasileira
assim se consolidava, com a eleição de civis.
Mas
em 1910 o marechal Hermes da Fonseca assumiu o poder e nele permaneceu
até 1914. Posteriormente, após a ditadura de Getúlio Vargas, o marechal
Eurico Gaspar Dutra venceu as eleições e ficou no cargo de presidente da
República até 1951.
Sempre
foi grande a influência e a presença de militares nos governos
brasileiros, porém em cargos de cúpula. Somente em 1964 isso mudou,
quando o presidente João Goulart ameaçou converter o Brasil numa
República sindicalista e a população brasileira se levantou, desejando
que as Forças Armadas impedissem essa caminhada política, que parecia
ser muito perigosa.
Ocorreu
a intervenção armada e o general Castelo Branco assumiu o cargo de
presidente, nele ficando até 1967. Com sua morte, em acidente, foi
sucedido no cargo pelo general Costa e Silva, que nele ficou até 1969.
Com
a sua enfermidade, uma junta militar exerceu o poder até 1969, quando o
general Garrastazu Médici passou a ocupar a Presidência da República,
até 1974, sendo sucedido pelo general Ernesto Geisel. Muitos militares
ocuparam cargos civis de importância no período de ditadura iniciado em
1964.
O
último general a ocupar o cargo foi João Batista Figueiredo, até 1985,
seguindo-se a partir daí a eleição de civis. A presença dos militares
tantas vezes, durante tantos anos, decorreu de eles terem sido
instrumentos de interesses de minorias que desejam manter o poder.
Enfim, foram utilizados por bom tempo, principalmente entre 1964 e 1985.
Não se deseja que aquele período possa repetir-se na vida dos brasileiros.
DESEMBARGADOR APOSENTADO DO TJSP, FOI SECRETÁRIO DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. E-MAIL: ALOISIO.PARANA@GMAIL.COM.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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