Fator Bolsonaro? Candidato que faz arminha não tem vez na eleição municipal de 2020. Artigo de Alexandre Borges para a Gazeta do Povo:
Parece
que foi ontem. Bastava colocar “major” ou “pastor” antes do nome, fazer
arminha com as mãos ou dizer o slogan integralista “Deus, Pátria e
Família” para receber uma torrente de votos. Menos de dois anos depois, o
brasileiro dá sinais que pode ter mudado de ideia sobre a política e,
se for o caso, será o fato mais notável da eleição municipal de 2020.
No
Rio de Janeiro, o deputado federal mais votado, Hélio Lopes (PSL),
companheiro de todas as horas do “mito”, obteve inacreditáveis 345.234
votos. Apenas dois anos antes, “Hélio Negão” ou “Hélio Bolsonaro”, como
ficou conhecido, havia tentado uma vaga de vereador em Nova Iguaçu,
cidade da região metropolitana do Rio, conquistando 480 votos. O amigo
inseparável de Bolsonaro simboliza com perfeição a “onda” eleitoral de
2018, quando nomes totalmente desconhecidos, alguns já recusados pelo
eleitor como Hélio Lopes em Nova Iguaçu, quebraram recordes e mexeram
profundamente com o tabuleiro político do país. E agora?
Ao
analisar o desempenho dos candidatos “arminha” ou governistas deste
ano, a duas semanas do primeiro turno, a onda parece ter passado, mesmo
com o presidente registrando seus mais altos índices de popularidade
desde o início do mandato.
O
candidato que canta hino nacional com uma bandeira do Brasil ou foto de
Bolsonaro ao fundo, o que se coloca radicalmente contra “vacina
chinesa”, que trata qualquer crítica ao governo como crime de
lesa-pátria ou que diz que, se não for eleito, o país será dominado para
sempre pelo comunismo internacional, não tem despontado nas pesquisas
como líder nas principais cidades do país.
Em
São Paulo, o neobolsonarista Celso Russomanno largou na frente, como
fez em 2012 e 2016, mas dá indicativos do mesmo tipo de queda ocorrida
nas eleições passadas e, segundo noticiado, já se posicionou a favor da
vacina que arrepia os pelos mais recônditos do eleitor bolsonarista e
tirou o presidente do seu jingle de campanha. O atual prefeito Bruno
Covas, afilhado político do arqui-inimigo João Doria, segue caminhando
com chances reais de reeleição. Russomanno tem eleitorado próprio, nunca
fez arminha com a mão, conta com a estrutura do partido ligado à Igreja
Universal e, mesmo com todo este aparato, não é aposta segura de
vitória para nenhum analista.
No
Rio de Janeiro, Eduardo Paes (DEM) segue para o terceiro mandato,
ameaçado de longe pela ex-delegada pedetista Martha Rocha. O atual
prefeito, Marcelo Crivella, candidato de Bolsonaro na cidade que é o
berço do bolsonarismo, que conta com a mesma máquina evangélica do
Republicanos, partido de dois dos filhos do presidente (Flávio e
Carlos), patina nas pesquisas e até sua presença no segundo turno é
incerta. Suas chances são ainda menores que as de Russomanno.
Em
Porto Alegre, centro e esquerda dominam com folga as primeiras posições
e não há qualquer indício de vitória de um candidato remotamente ligado
ao presidente. Em Curitiba, Rafael Greca (DEM) segue com tranquilidade
para a reeleição, assim como Alexandre Kalil (PSD) em Belo Horizonte.
Nenhum dos dois, mesmo em partidos da base do governo, não devem em nada
suas prováveis vitórias ao governo federal. Em Salvador, Bruno Reis
(DEM), também virtualmente eleito, deve o resultado inteiramente ao
padrinho ACM Neto.
No
Recife, João Campos (PSB) lidera com tranquilidade, com Marília Arraes
(PT), Delegada Patrícia (Podemos) e Mendonça Filho (DEM) lutando por
vaga no segundo turno. Mendonça, ex-ministro de Temer, recebeu a maior
doação eleitoral do país até o momento, do empresário e ex-czar das
privatizações do governo Salim Mattar, mas sua tentativa de colar a
imagem com a do presidente não deu resultado até agora e seu desempenho
não é animador. Em Fortaleza, o líder Coronel Wagner (PROS) é, de todos
os citados, o mais próximo do presidente, mas sua eleição é fruto da
lógica da política cearense e o aporte de votos de Bolsonaro é ínfimo.
Quando
o Datafolha perguntou aos eleitores de quatro capitais (São Paulo, Rio
de Janeiro, Belo Horizonte e Recife) se votariam no candidato indicado
por Bolsonaro, apenas 16% deles disseram seguir as ordens do capitão.
Antigos aliados que romperam com o presidente, como Joice Hasselmann
(PSL-SP), recordista de votos em 2018, parecem completamente
desidratados eleitoralmente até agora.
Se
a eleição presidencial fosse hoje, Bolsonaro estaria no segundo turno e
só teria como adversário com chances reais de vitória seu ex-ministro e
desafeto Sérgio Moro. É um político inegavelmente popular, mesmo
trocando aos poucos parte do eleitorado mais escolarizado e ideológico
por eleitores de baixa renda beneficiados por programas
assistencialistas, seguindo os passos e alguns métodos de Lula em 2006.
A
despeito da força política do presidente, sua popularidade não tem se
mostrado proporcional à capacidade de eleger aliados ou candidatos
identificados, queira ele ou não, com a sua imagem. Se a tendência se
confirmar, a “onda” de candidatos que “pegam carona” em Bolsonaro pode
ser o primeiro mito a cair em 2020.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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