MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

sábado, 1 de setembro de 2018

Mourão compartilha com Bolsonaro o antipetismo e a admiração por torturador


General Antonio Hamilton Mourão, candidato a vice na chapa de Jair  Bolsonaro
General Mourão se diz intelectualizado, mas não leva jeito
Anna Virginia Balloussier
O mundo tá muito chato —e Antonio Gramsci tem sua parcela de culpa nisso, desconfia o general Antonio Hamilton Mourão, 65 anos. Os comunistas de hoje se inspiram um bocado no filósofo italiano marxista morto 81 anos atrás, para impor “uma forma de dominação” insidiosa: “A hegemonia do consenso”, hoje representada pelo politicamente correto. “Se você sai hoje um milímetro dele, é execrado”, diz.
E Mourão, para o gosto da esquerda, é um outdoor ambulante da incorreção política. Já defendeu, num evento maçom, a intervenção militar como antídoto para a corrupção. Declarou que o Brasil herdou a “indolência” dos indígenas e a “malandragem” dos africanos. Pior: aceitou ser vice do candidato à Presidência que mais confortavelmente veste as causas da extrema-direita em 2018, Jair Bolsonaro (PSL).
BABOSEIRAS – Mas tentativas de rotulá-lo como isso ou aquilo são “baboseiras”, diz à Folha o general de fala mansa, posições duras e uma pistola 45 guardada numa gaveta em seu apartamento, no posto seis da praia de Copacabana —além do imóvel, esse no nome dos filhos, ele declarou à Justiça Eleitoral outro, com valor venal de R$ 204 mil, um veículo de R$ 61 mil (um Sandero) mais aplicações de R$ 2.203 (poupança) e R$ 147.446,7 (renda fixa).
Mourão, que se descreve como “liberal na economia e conservador nos costumes”, tem das suas ideias fixas. O antipetismo, por exemplo. “Sempre considerei o PT a vanguarda do atraso. Não soube respeitar o que é a democracia.”
Inclusive uma intervenção militar seria bem-vinda “caso a candidatura de Lula fosse aceita e houvesse protestos significativos por parte da população”, e vice-versa: “O Judiciário decide que Lula não será candidato, o que pode levar aos caos, a uma situação em que a Força tenha que intervir”.
PÓS-64 – O regime militar brasileiro é um tema caro a ele e Bolsonaro, que foi seu “bixo” (jargão para calouro) na Aman (Academia Militar das Agulhas Negras) —os dois se formaram nos anos 1970 nesta instituição onde há um salão batizado com o nome de Emílio Garrastazu Médici e uma fachada com a inscrição “ides comandar, aprendei a obedecer”.
O período não era esse bicho-papão que a esquerda, por “desonestidade intelectual”, tenta vender, não na opinião do general. Veja a questão da tortura. “Não aprovo, ok, não é um método interrogatório válido, mas foi aquilo utilizado naquele momento”.
Fora que é “óbvio que muita gente em quem [os militares] não encostaram um dedo” veio depois alegar ter sido torturada, “quando apareceu a possibilidade de indenização”, diz Mourão, que usa na lapela do paletó um broche dourado em formato de granada.
ANTICOMUNISTA – O horror ao comunismo ele herdou do pai, militar graduado na época da Intentona Comunista, rebelião liderada por tenentistas, Luís Carlos Prestes entre eles, para derrubar Getúlio Vargas em 1935. “Aquilo calou fundo por atentar contra princípios básicos [nas Forças]: a lealdade e a camaradagem. Companheiros mataram outros que dormiam. Aquela geração se tornou anticomunista ferrenha.”
Especializada no episódio, a doutora em história pela USP Marly Vianna sustenta em seus escritos que essa versão foi plantada para que se fizesse crer em insurgentes “a tal ponto traidores que teriam sido capazes de baixezas como a dos fantásticos assassinatos de colegas dormindo”, algo inverossímil dada a tensão nada sonífera no quartel no dia.
COM FIDELIX – Mourão conversou com a Folha na semana passada e emendou uma sabatina no BTG Pactual.  Ao seu lado tinha Levy Fidelix, entretido com o painel no lobby de seu hotel, que trazia a pintura de um aerotrem —sua bandeira coqueluche nas duas vezes em que foi presidenciável, em 2010 e 2014.
Levy Fidelix agora tenta a Câmara, abrindo espaço para que o novo filiado do PRTB assumisse a vice de Bolsonaro. À plateia do banco de investimento, Mourão citou Roberto Campos, referência do liberalismo nacional, e chamou o cabeça de chapa de “Zero Um”.
“Bolsonaro seria mais o agitador. Sou mais o propagandista”, diz à reportagem sobre o papel que vem exercendo na chapa, o de dialogar com empresários e entidades. Também faz as vezes de conselheiro. Para debates, recomenda: “Cabeça fria num corpo quente”.
MISSA NO DOMINGO – Mourão se vê como um tipo sereno. Frequenta a missa todo domingo, a da igreja Nossa Senhora da Paz, a duas quadras da praia de Ipanema. É verdade que anda faltando a algumas, culpa da campanha. Se está em Brasília, é na Paróquia Militar do Oratório do Soldado que vai —os fardados têm uma Arquidiocese só deles, a Militar, e o líder dela, dom Fernando Guimarães, é um bom amigo, conta. “Ele também gosta de uísque.”
Tomar um “uisquinho” é ritual noturno para o general, melhor ainda se da marca Jura, “single malt”. Outra tradição deste filho de uma professora universitária de letras é ler, e ler mais de um livro ao mesmo tempo, se possível.
Entre as leituras atuais: “A Ascensão do Dinheiro”, de Niall Ferguson, e uma biografia de Thomas “Stonewall” Jackson, general que lutou do lado confederado, que defendia a continuidade da escravidão, na guerra civil americana. 
DILETO AMIGO – Esse último foi presente de outro “dileto amigo”, o “maior presenteador de livros”, com quem acumula “oito anos de afinidades”. Fala do desembargador Thompson Flores, presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que confirmou a condenação de Lula a 12 anos de prisão. Mourão o recepcionou dias atrás no Clube Militar, sob sua presidência desde maio.
Antes disso, chefiava a Secretaria de Finanças do Exército. Mourão se diz zeloso à hierarquia: “Canso de dizer, decisão de comandante não se discute”. Resignou-se, portanto, quando o comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas, o removeu do cargo após críticas públicas ao governo Michel Temer em dezembro, numa palestra no Clube do Exército, a convite do grupo Ternuma (Terrorismo Nunca Mais).
COISA NORMAL – “Foi considerado uma ofensa [a Temer], fui exonerado, uma coisa normal”, diz a respeito da avaliação que então fez sobre o país: “Não há dúvida que atualmente estamos vivendo a famosa ‘Sarneyzação’. Nosso atual presidente vai aos trancos e barrancos, buscando se equilibrar, e, mediante o balcão de negócios, chegar ao final de seu mandato”.
Outra palestra já o meteu em apuros com a alta cúpula militar. Em 2015, foi transferido do Comando Militar do Sul para a burocrática pasta de Finanças após criticar o governo Dilma Rousseff.
Não ajudou um general sob sua tutela ter promovido no dia homenagem póstuma ao coronel Brilhante Ustra, chefe da repressão na ditadura —já definido como “herói” tanto por Mourão quanto por Bolsonaro.
INTERVENÇÃO – A polêmica que mais deu o que falar ocorreu em 2017, numa loja maçônica de Brasília. Disse então que seus “companheiros do Alto Comando do Exército” entendem que uma “intervenção militar” seria válida se o Judiciário “não solucionar o problema político” (a corrupção no meio). Mourão é maçom, “como Duque de Caxias”. Agora está mais inativo, mas até pouco era filiado a um grupo de Porto Alegre.
Como Bolsonaro, tem a seu lado uma mulher décadas mais nova —Paula, 42, que conheceu no Exército. A primeira esposa, mãe de seus dois filhos, já morreu.
Antes de se declarar indígena ao TSE, Mourão alvoroçou a opinião pública ao dizer que “temos uma certa herança da indolência, que vem da cultura indígena”. “As pessoas ficaram meio chocadas”, mas como falar de racismo? Ele é o que por acaso? Não branco, preto, pardo ou asiático.
REFLEXÕES – “Minha avó era cabocla. Olha a minha foto, se me pôr um cocar, passo tranquilamente numa [aldeia]”.
“Não vejo esse papel de ‘eu sou o terror’”, afirma sobre o estoque de controvérsias que cultivou nos últimos anos. O que declarou sobre indígenas e africanos não é nada que medalhões como Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda não tenham tratado ao investigar a formação da identidade verde-amarela, diz Mourão.
“O brasileiro é um homem cordial pois gosta de estabelecer relações mesmo se não é bem-vindo naquele relacionamento. Tipo o carioca que fala ‘passa lá em casa’, mas não quer que o cara passe lá de verdade”, diz o general cordial.
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