Debate entre candidatos ao governo de São Paulo. |
J. R. Guzzo
escreve sobre a importância das eleições para o governo de São Paulo,
que ficaram nas sombras. De fato, "São Paulo é o estado dos brasileiros
que acreditam no mérito individual, na recompensa pelo esforço, trabalho
e talento, e na autodeterminação das pessoas. É o contrário do Bolsa
Família. É o contrário de Brasília. É uma pena que nada disso esteja em
discussão nestas eleições":
Você sabia que há uma eleição para governador do Estado de São Paulo
sendo disputada neste momento? Pode acreditar que sim, e fique sabendo,
mais ainda, que esta eleição já está aí, a menos de uma semana. Quem
diria, não? Provavelmente você nunca ouviu falar tanto de política e
eleição como hoje — mas quase nada tem a ver com o estado em que você
mora, trabalha, e que, no fim das contas, mais importa para a sua vida
prática. Os paulistas estão esmagados, literalmente, pelo noticiário
político nacional, e parece não ter sobrado tempo para mais nada. Quem
vai ser o próximo presidente do Brasil? Ninguém tem a menor ideia, e,
quanto menos se sabe a respeito, mais se discute o assunto. Teria o
deputado Jair Bolsonaro, sim ou não, chegado ao seu “teto” de votos?
João Amoêdo vai passar dos 5%? E o ex-presidente Lula, então: alguém,
mesmo sendo advogado, saberia dizer ao certo quantos recursos, apelos,
embargos, agravos etc., etc., ele apresentou ao Supremo Tribunal Federal
nos últimos meses, na sua tentativa de sair do xadrez onde está preso
por corrupção e lavagem de dinheiro, em Curitiba, e conseguir um
indulto? Tivemos também processos de tudo quanto é tipo que ocuparam
semanas valiosas de debate no Tribunal Superior Eleitoral, no Superior
Tribunal de Justiça, na ONU, no Vaticano, na associação de caça e pesca —
diga um lugar qualquer, e é certo que estiveram discutindo ali se Lula
seria ou não “candidato”. Quando o ex-governador paulista Geraldo
Alckmin vai reagir? Ele vai reagir? E “as pesquisas de intenção de
voto”, que se embaralham uma com as outras a cada quinze minutos? É
melhor nem falar das pesquisas de intenção de voto.
O fato é que a eleição para governador de São Paulo, um evento-chave
na política brasileira, foi empurrada para as sombras. É um equívoco
político sério. Nada se faz no Brasil, há muito tempo, sem a
participação decisiva de São Paulo — a grande força de equilíbrio, ou de
contenção, para um poder central que suga cada vez mais os recursos do
Brasil, quer mandar cada vez mais no país todo e dividiu a sociedade
brasileira em duas classes opostas. Uma, como a nobreza e o clero antes
da Revolução Francesa, é formada pelos que vivem direta e indiretamente
às custas do Estado. A outra é formada pelos que trabalham para
sustentar a primeira — e é no Estado de São Paulo, mais que em qualquer
outro lugar do Brasil, que ela existe. É aqui, com sua energia política,
sua força econômica e sua densidade social, que o Brasil do trabalho
enfrenta o Brasil dos nobres. É aqui que se concentram as chances do
progresso contra o atraso. Mas nada disso parece ter a mais remota
conexão com a alucinada discussão política do momento nem com seus
personagens. A candidata Marina Silva não sabe onde fica o Viaduto do
Chá. Jair Bolsonaro não conseguiria distinguir Jundiaí de Presidente
Prudente. Ciro Gomes acha que São Paulo fica na Inglaterra. Está na cara
que há algo profundamente errado com isso tudo.
A uma semana da eleição, a mídia ainda não percebeu que São Paulo
está no jogo, e a opinião pública parece anestesiada com as polêmicas da
campanha presidencial, entre Bolsonaro e o PT, que lhe são servidas
todos os dias nos meios de comunicação. Pouco se discutem os candidatos e
menos ainda seus projetos. Quem seria capaz de diferenciar um governo
João Doria de um governo Paulo Skaf, os dois candidatos que estão à
frente? Doria foi prefeito de São Paulo, levado numa onda de entusiasmo,
mas não se interessou em cumprir o mandato para o qual tinha sido
eleito. Skaf simplesmente não se sabe quem é — vive há anos nesse mundo
escuro do empresariado biônico, essa gente das Fiesps, e Ciesps e Sesis e
Senais, nebulosas onde entram e de onde saem bilhões de reais em
dinheiro público que mantêm vivo o exótico sindicalismo empresarial
brasileiro, contraponto ao sindicalismo das CUTs e similares. Os demais
candidatos são nulidades sem a menor possibilidade de conseguir alguma
coisa — é a turma que só existe por causa das verbas do “fundo
partidário”. Um deles, o do PT que pretende governar o Brasil, não
conseguiu eleger nem o prefeito da própria cidade, São Bernardo, na
última eleição municipal.
Trata-se de um perfeito despropósito para um estado que tem um PIB
anual de 2 trilhões de reais — isso mesmo, 2 trilhões de reais —, que
coloca São Paulo ali pelos vinte maiores países, acima da Suécia. São
Paulo, na América do Sul, não é apenas maior que a Argentina. É maior
que a Argentina, o Uruguai, o Paraguai e a Bolívia somados. Com 45
milhões de habitantes, é o lar de um em cada cinco brasileiros — e o
terceiro maior país da América do Sul, logo após o Brasil e a Colômbia.
São Paulo está entre as dez maiores áreas metropolitanas do mundo; é, de
longe, a mais cosmopolita de todas as cidades brasileiras. É daqui que
saem 35% de tudo o que o Brasil produz. São Paulo tem o primeiro IDH do
país — na tabela oficial fica atrás de Brasília, mas Brasília não existe
no mundo das realidades econômicas. O índice de homicídios de São
Paulo, de 3,8 por 100 000 habitantes, é equivalente hoje ao do Estado do
Kansas, nos Estados Unidos — um progresso absolutamente extraordinário.
Trata-se de um quarto da taxa média do Brasil, o que faz de São Paulo,
de longe, o lugar mais seguro do país. É aqui que estão a melhor
polícia, as melhores autoestradas, as melhores ferrovias, os melhores
hospitais e as melhores escolas do Brasil — além da sede da maioria das
500 mais possantes multinacionais do mundo.
Mais importante que tudo, talvez, São Paulo é o mais brasileiro de
todos os estados do Brasil — um resumo, melhor do que qualquer outro, de
tudo aquilo que este país tem para apresentar. É sintomático. São Paulo
é o estado mais odiado pelos políticos das outras unidades da
federação, sobretudo as que são mais atrasadas e desiguais do ponto de
vista social. É visto como uma “ameaça” — e talvez seja mesmo, porque
aqui está a amostra do que poderia ser um Brasil mais moderno, mais
progressista e mais justo. Ao mesmo tempo, é o estado mais amado pelos
cidadãos comuns, principalmente pelos milhões que ao longo das décadas
têm vindo para cá em busca de trabalho, de realização e de projetos de
melhoria em sua vida. É o lugar procurado pelos que não se conformam com
o Brasil dos coronéis, do atraso e da adoração ao governo — pelos que
não querem passar uma vida de dependência da “autoridade” e de sujeição
aos que mandam. São Paulo é o estado dos brasileiros que acreditam no
mérito individual, na recompensa pelo esforço, trabalho e talento, e na
autodeterminação das pessoas. É o contrário do Bolsa Família. É o
contrário de Brasília.
É uma pena que nada disso esteja em discussão nestas eleições.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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