Não obstante muitos acreditarem que, após o fim da União Soviética, a Rússia se iria aproximar da Europa, os seus vizinhos europeus sempre olharam com ceticismo e desconfiança face a esse otimismo. José Milhazes para o Observador:
Enquanto
a parte ocidental do velho continente não compreender ou não desejar
levar em linha de conta as particularidades históricas, políticas e
históricas da parte leste, a unidade da União Europeia poderá correr
sérios riscos. A crise dos refugiados na fronteira entre a Bielorrússia e
a Polónia é mais um exemplo disso.
Depois
da queda do Muro de Berlim, em 1989, a maioria dos países que fizeram
parte da zona de influência soviética desde 1945 aderiu rapidamente à
União Europeia e à NATO, devendo-se isso a factores com profundas raízes
históricas que os restantes membros da UE parecem ter dificuldade em
compreender, embora a resposta seja simples.
Não
obstante muitos acreditarem que, após o fim da União Soviética, a
Rússia se iria aproximar da Europa, os seus vizinhos europeus sempre
olharam com cepticismo e desconfiança face a esse optimismo. Nos
primeiros tempos, nas relações entre a Rússia e os vizinhos foram
curadas algumas profundas feridas do passado. Por exemplo, Moscovo
reconheceu que foram os serviços secretos soviéticos os autores do
massacre de Katyn, onde milhares de militares e civis polacos foram
assassinados; aceitou finalmente que o Pacto Molotov-Ribbentrop,
principalmente os seus anexos secretos, constitui um verdadeiro crime
contra a Polónia, Estónia, Lituânia e Letónia; comprometeu-se a
respeitar a soberania e a inviolabilidade das fronteiras das antigas
repúblicas soviéticas e a não se imiscuir nos assuntos internos dos
países que fizeram parte do Tratado de Varsóvia.
Porém,
a desconfiança começou a voltar quando a Rússia tentou traçar linhas
vermelhas à integridade territorial e à soberania dos países vizinhos. O
Kremlin chamou a si o direito de decidir que países do antigo “campo
socialista” podiam fazer parte da Aliança Atlântica e que repúblicas da
ex-URSS podiam pretender à adesão à NATO e à União Europeia.
Quando
a Geórgia e a Ucrânia manifestaram o desejo de aderir à NATO e à União
Europeia, viram tropas russas a invadirem os seus territórios em 2008 e
2014.
Isto
foi um sinal de que o Kremlin, em política externa, pouco difere do
Império Russo e da União Soviética, o que levou a um aumento
significativo da desconfiança dos países vizinhos face à Rússia. Mais,
estes passaram a temer que a União Europeia e a NATO possam chegar a
acordos com Moscovo sem terem em conta os seus interesses ou até os
possam abandonar nos momentos críticos. Como o digam os polacos, que já
viram o seu país retalhado numerosas vezes com a participação da Rússia.
Se a isto juntarmos o revisionismo histórico realizado por Vladimir Putin, concluiremos que há motivo de receios e medos.
Este
receio tornou-se ainda mais evidente durante a crise dos refugiados na
fronteira entre a Bielorrússia e a Polónia. Enquanto países como a
Polónia, Letónia, Lituânia e Estónia defendem a construção de muros na
fronteira com a Bielorrússia e a Rússia, a parte ocidental da UE,
nomeadamente a França e Alemanha, não se mostrou disposta a ajudar os
seus membros orientais nessa tarefa. Escusado será dizer que isso foi
visto como uma falta de solidariedade e os países visados decidiram
construir barreiras fronteiriças sozinhos ou com a ajuda uns dos outros.
Outro
facto que irritou os dirigentes dos países da Europa do Leste foi a
decisão de Angela Merkel, chanceler interina da Alemanha, ter
estabelecido contactos directos com Alexandre Lukachenko, sem os
consultar. Um dos objectivos da provocação da crise dos refugiados
organizada pelo ditador bielorrusso, visa obrigar a UE a reconhecê-lo
como presidente legítimo.
Toomas
Hendrik Ilves, antigo Presidente da Estónia, considerou que essa
política no seio da União Europeia já não é de hoje: “Infelizmente,
vemos que [a EU] simplesmente não tem em conta Estados como os nossos,
ou seja, a Europa Oriental, a Europa do Leste. Isto é particularmente
evidente nos últimos anos, embora já ocorreu antes”.
E
deixa um aviso: “Mais tarde ou mais cedo, isso acaba mal, visto que a
Estónia e a Polónia não são Estados de segunda categoria”.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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