Em entrevista ao ‘El País’, ex-presidente debocha dos fatos, da memória da população e do regime democrático. Até comparou Daniel Ortega a Angela Merkel. Editorial do Estadão:
Uma
recente entrevista de Luiz Inácio Lula da Silva ao jornal El País
confirma que o líder petista não mudou nada: continua achando que pode
impor sua realidade paralela, com a pretensão de que tudo, rigorosamente
tudo, deve se sujeitar a seus interesses. Sem qualquer constrangimento,
debochou dos fatos, da inteligência alheia e do regime democrático.
Quem julga merecer o voto de seus concidadãos não pode se esconder em um
mundo imaginário, regido pela irresponsabilidade e pela mendacidade.
A
título de defender a permanência ilimitada no poder de autocratas
esquerdistas latino-americanos, seus amigos do peito, teve a audácia de
compará-los a líderes de inquestionáveis credenciais democráticas que
governaram por mais de uma década. Questionado sobre as escandalosamente
fraudulentas eleições na Nicarágua, que serviram para manter o governo
ditatorial de Daniel Ortega, Lula comparou o tirano, pasme o leitor, à
premiê alemã, Angela Merkel: “Por que Angela Merkel pode ficar 16 anos
no poder e Daniel Ortega não?”, perguntou o petista – que, convicto de
que o leitor é mesmo um cretino, foi além: “Por que Margaret Thatcher
pôde ficar 12 anos no poder, e (Hugo) Chávez não?”.
Lula
acrescentou que não pode “interferir nas decisões de um povo”,
desconsiderando que o povo a que ele se refere não pôde tomar decisão
nenhuma, já que as “eleições” na Nicarágua e na Venezuela são apenas
cenográficas, como sabem os governos de países civilizados que contestam
seus resultados.
A
respeito da proibição de manifestações em Cuba, Lula não teve pudor em
relativizar mais essa incontestável violação de direitos humanos,
tratando como coisa corriqueira, comum em todos os lugares. “Essas
coisas não acontecem só em Cuba, mas no mundo inteiro. A polícia bate em
muita gente, é violenta. (...) Precisamos parar de condenar Cuba e
condenar um pouco mais o bloqueio dos Estados Unidos”, disse o líder
petista.
É
realmente impressionante a devoção de Lula a um regime violento e
opressor. Estamos em pleno século 21, não há nenhuma dúvida sobre o
caráter autoritário do Estado cubano e mesmo assim o líder petista segue
em absurda subserviência. Sempre foi vergonhosa a atitude do PT em
relação a Cuba; no momento atual, é estupidez negacionista em sua face
mais desumana.
Como
gosta de se dizer perseguido pela Justiça, Lula deveria ao menos ter
alguma empatia por presos políticos de outros países; afinal, são
pessoas que, em tese, estariam em situação similar à sua. Mas não. Lula
não tem qualquer apreço pelos cidadãos perseguidos, por exemplo, por
Daniel Ortega. “Não posso julgar o que aconteceu na Nicarágua. Eu fui
preso no Brasil. Não sei o que essas pessoas fizeram. Só sei que eu não
fiz nada”, disse o petista, sugerindo que os presos políticos na
Nicarágua talvez tenham feito por merecer o calabouço.
Além
de indiferença com os direitos humanos e de explícita simpatia por
ditadores, Lula mostrou, na entrevista, ideias bem peculiares sobre o
funcionamento de uma democracia. “O problema da democracia em Cuba não
será resolvido instigando os opositores a criar problemas para o
governo”, disse o líder petista.
A
mensagem é clara. Lula não quer ver ninguém criando problema para
governos que são seus amigos. Nesses casos, cabe à oposição apenas
colaborar com o governo. E se não houver essa gentil parceria, os
opositores perseguidos não devem esperar solidariedade de Lula ou do PT.
Afinal, não fizeram a sua parte.
Tal
proposta, por si só, avilta a ideia de democracia e pluralidade. Feita
por Lula – que sabotou todos os governos a quem fez oposição – é pura
desfaçatez.
Na
entrevista, Lula defende Hugo Chávez, Daniel Ortega e a ditadura
cubana, mas, ora vejam, não se encontra uma mínima defesa de Dilma
Rousseff. Está claro que o líder petista não deseja falar daquela que
lhe sucedeu no Palácio do Planalto. Compreende-se: é um tema difícil,
que remete à brutal crise social e econômica que o PT legou ao País.
Melhor falar do bloqueio americano a Cuba.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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