A beleza esculpida por exercícios de altíssima intensidade é um dos atrativos dos Jogos Olímpicos, mas quem não quer mostrar muito se complica. Vilma Gryzinski:
Nada havia preparado o mundo para a erupção de Nadia Comaneci na Olimpíada de Montreal, em 1976.
A
mistura de perfeição absoluta dos movimentos da ginástica, os
arriscados arabescos que feitos por ela pareciam fáceis e orgânicos, com
o jeito quase infantil de seus 14 anos e 1,49 de altura criou imagens
que continuam a impactar até hoje.
O
ar pubescente da ginasta romena certamente ajudou a conquistar corações
– e atenções indesejadas de mentes perturbadas. A mãe de Nadia diz que a
jovem viria a ser estuprada e barbaramente torturada pelo filho do
chefão comunista Nicolae Ceausescu – uma atrocidade que Nadia nunca
confirmou.
Mais
de quarenta anos depois, ginastas da equipe alemã foram treinar em
Tóquio com leotard longo, um macacão de malha até os pés, como protesto
contra a “sexualização da ginástica”.
Com
a evolução tecnológica dos tecidos para trajes esportivos, as roupas
que cobrem mais o corpo permitem tanta elasticidade quanto as mais
exíguas. Foi este um dos argumentos dado pelas integrantes do time de
handebol de praia da Noruega para não usar o biquíni obrigatório na
modalidade, num jogo do campeonato europeu.
Cada jogadora foi multada em 150 euros.
O
biquíni dos esportes de areia, principalmente o vôlei, é um dos
atrativos da modalidade – e não só para espectadores masculinos;
mulheres também gostam de ver os corpos esguios mas bem definidos, com
pouca musculatura aparente, moldados por um dos esportes mais populares
no Brasil. Nem que seja só para imaginar como seria bom ter aquelas
barrigas chapadas.
Esculpir
corpos bem torneados é motivo pelo qual tanta gente se esfalfa em
academias, sem a menor intenção de competir em qualquer esporte. E o
objetivo de ter corpos assim, evidentemente, é aumentar a atração
sexual.
Para
os atletas profissionais, a beleza física também turbina o valor das
campanhas publicitárias e a venda de produtos licenciados.
Apesar
de sua admirada habilidade nos passes, David Beckham dificilmente teria
uma fortuna de 450 milhões de dólares se não fosse pelo rostinho bonito
e o físico de derrubar arquibancadas.
Maria
Sharapova foi a atleta mulher mais bem paga do mundo durante onze anos
com uma boa ajuda do físico de modelo e da longa cabeleira. Na carreira
como a tenista mais linda do mundo, embora nem sempre a melhor, amealhou
uma fortuna calculada em 285 milhões de dólares.
As
reclamações sobre o excesso de exposição corporal são relacionadas a
uma identificação maior com ideias do feminismo atual, já bem distante
da era de libertação sexual e livre exposição dos corpos das gerações
anteriores.
Todo
mundo sabe que os atletas dos Jogos Olímpicos originais competiam nus e
assim eram celebrados nas esculturas e nas pinturas de ânforas que
atravessaram milênios para nos dar uma imagem perfeita do culto ao corpo
original.
Os
atletas gregos não eram exatamente os nobres puristas dos tempos
heroicos, tal como retratados pelo classicista E. Norman Gardiner, o
grande especialista do século XIX em esportes da antiguidade.
Não
tinham comportamento muito diferente de celebridades e influencers dos
tempos atuais e a coroa de louros, ou de ramos de oliveira, muitas vezes
era acompanhada por prêmios em dinheiro. As reformas jurídicas de
Solon, um dos grandes estadistas gregos, incluíam um prêmio de 500
dracmas aos atletas atenienses que fossem vitoriosos nos jogos de
Olímpia. Nos Jogos Ístmicos, disputados no istmo de Corinto, o prêmio
era menor, de 100 dracmas.
Outros
benefícios, dependendo da época: salário vitalício pago pelos cofres
públicos, lugar de honra em eventos públicos e isenção de impostos.
No
início das Olimpíadas modernas, as mulheres jogavam tênis com longos
vestidos brancos. A francesa Suzanne Lenglen introduziu um vestido com
saia plissada, na altura do joelho – e sem espartilho, uma excepcional
libertação.
Em esportes coletivos, os shorts largos, no meio da coxa, surgiram nos anos trinta.
“Só
queríamos mostrar que toda mulher deveria ter o direito de escolher o
que usar”, disse a ginasta alemã Elisabeth Seitz. No esporte, não é
exatamente assim. São as federações que definem os trajes, chegando a
minúcias como estabelecer a cava e a largura da lateral da calcinha do
biquíni dos esportes de areia.
A
saída seria implantar o burquíni, o traje que cobre todo o corpo e os
cabelos admitido em muitas modalidades para as esportistas que seguem as
regras muçulmanas?
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário