MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 23 de dezembro de 2012

Produtores usam porco ibérico no preparo do presunto pata negra





Porco da raça ibérica é engordado na base da castanha.
Animal vive nos bosques da região da Estremadura, sudoeste da Espanha.

Do Globo Rural
O porco da raça ibérica, engordado na base da castanha, vive nos bosques da região da Estremadura, no sudoeste da Espanha. A carne do animal é usada na fabricação do presunto de bolota, o famoso pata negra. Conheça todos os passos da criação do suíno e da produção do presunto, uma iguaria exportada para o mundo inteiro.
A cidade de Fregenal de la Sierra cresceu no entorno do castelo construído no século XIII. Originalmente, a fortaleza servia de refúgio para os templários, guerreiros cristãos que ostentavam uma cruz vermelha no peito e viviam em conflito com os muçulmanos. Suas aventuras viraram lenda na literatura e no cinema. As lembranças deixadas pelos cavaleiros templários são bem visíveis em toda a comunidade autônoma de Estremadura, no sudoeste da Espanha, fronteira com Portugal. Mas quem figura no centro do brasão de armas de Estremadura é uma árvore nativa da região mediterrânea.
O solo pobre e pedregoso da região sustenta um bosque primitivo, moldado pelo homem, pela natureza e pelos animais há milhares de anos. No lugar predominam as castanheiras, também chamadas de incinas, árvores que produzem as belotas, alimento preferido do porco ibérico. Nos meses de novembro e dezembro, as bolotas amadurecem e caem no chão. Com extrema habilidade, os porcos retiram a casca amarga e comem só a polpa, principal responsável pelo sabor inconfundível do presunto de bolota, o pata negra, iguaria que no Brasil pode custar mais de R$ 200 o quilo.
O nome científico da incina, também chamada de azinheira, é quercus ilex. Ela é parente do carvalho, de onde se tira a madeira para a fabricação de tonéis de vinho e do sobreiro, espécie mais comum em Portugal, onde a casca cortiçosa é usada na fabricação de rolhas. Os fiscais da Associação dos Criadores exigem que 40% do peso de engorda do porco seja proveniente só da ingestão de castanha. Nessa fase, é proibido dar outra comida aos animais.
Santiago Fernandes tem 360 porcos no ponto de engorda. Por causa da seca, ele só vai engordar 300 no meio dos castanhais. Os outros serão tratados com ração em confinamento. O criador tem medo de ser flagrado pela fiscalização. Os fiscais que examinam a qualidade do rebanho podem chegar a qualquer momento na propriedade para verificar a quantidade de bolota no campo. Se considerarem que há poucas bolotas para o número de animais, todo rebanho é desqualificado.
Outra exigência dos fiscais para a fabricação do presunto de bolota e de que os porcos sejam animais puros da raça ibérica. O porco ibérico faz parte de um agrupamento racial que se formou na pré-história. Época também chamada de pedra polida, quando o homem inventou a agricultura e domesticou os primeiros animais.
O porco que pertence a um tronco chamado de mediterrâneo, que se estabeleceu na Espanha e em uma pequena parte de Portugal. Ele também é chamado de pata negra por causa da manchinha escura que envolve os cascos.
O médico veterinário José Maria Gomes Nieves é um dos principais estudiosos dessa raça. “A gordura produzida por esse porco é rica em ácido oléico, principal componente do azeite de oliva. Esse ácido está contido nas castanhas ingeridas por eles. Isso, além de conferir um sabor único à carne, ajuda a diminuir o colesterol ruim e a aumentar o colesterol bom do nosso organismo”, diz.
Enquanto a chuva não vem, o Angel Correa derruba as bolotas com a vara que tem uma cinta de couro na ponta, um costume levado de Portugal, onde também se engorda porco ibérico com castanha. Apesar da preferência pela castanha, os porcos comem um pouco de tudo. Eles fuçam a terra, comem o pasto nativo e até os cogumelos. Na medida em que vão ficando fartos, os porcos desabam no chão e caem no sono.
A fazenda de Santiago Fernandes tem vários piquetes separados com muros de pedra para dividir as varas de porcos. São muros muito antigos, herança dos avôs que também eram criadores de porcos na mesma fazenda. Camping é o nome dado ao lugar reservado para as fêmeas, os machos e os animais jovens. É um chiqueirão com várias casinhas que servem de abrigo aos animais. O manejo é feito através da monta natural.
A fêmea dá duas crias por ano, produzindo de 12 a 15 leitões, que passam um ano no camping comendo apenas ração. Depois, começam a freqüentar os castanhais. A ração é cortada aos poucos. Nos últimos três meses a dieta é só castanha e pasto nativo. Eles são abatidos com 150 quilos aos 16 meses de idade. Na Espanha, porcos de raças modernas, criados em confinamento, levam a metade do tempo para atingir o mesmo peso. Mas, em compensação, a carne do porco ibérico, usada para produzir o presunto, vale até 100% mais.
No frigorífico especializado no abate do porco ibérico os veterinários do Ministério da Agricultura fazem o controle sanitário e conferem os dados de rastreabilidade dos animais contidos em um código de barras. Todos são registrados como Produto de Denominação de Origem. Depois do abate, as peças são separadas. Chama a atenção a quantidade de gordura produzida pelo porco ibérico. O toucinho tem 30% de carne e 60% de gordura. O restante é osso. A gordura, rica em ácido oléico, entra no processo de fabricação de todos os embutidos feitos com a carne crua.
Os pernis e as paletas, que são as partes dianteiras, são separados para o preparo do presunto. Depois de retirar o excesso de gordura, as peças são mergulhadas em um tanque de sal marinho. Acomodadas em camadas, são levadas para um depósito climatizado, onde passam dez dias. Então, são lavadas para a retirada do excesso de sal. Mas é na maturação lenta que a carne vai perdendo água e gordura.
Os presuntos descansam com temperatura, ventilação e umidade controladas. O processo todo leva, no mínimo, três anos. De seis em seis meses, os presuntos tomam outro banho de azeite de oliva, o que evita o aparecimento de ácaro que podem estragar a carne.
A Espanha produz hoje um milhão de peças de presunto pata negra por ano. Só um dos frigoríficos produz 420 mil peças. Mas a iguaria que o país exporta para vários países esteve ameaçada. Na década de 60, o porco ibérico foi responsabilizado pela transmissão da peste suína africana. Milhares de animais foram sacrificados. Hoje, os espanhóis têm 200 mil matrizes ibéricas. Graças à preservação da raça, a Espanha fatura milhões de euros com a produção do presunto de bolota, gerando emprego e renda no campo e na cidade.
O presidente da cooperativa dos criadores de Frehenal dela Sierra, Paco Rodrigues, diz que os maiores consumidores do presunto de bolota são os próprios espanhóis em cuja mesa não pode faltar. Na Espanha, os melhores momentos da vida são celebrados com os amigos, ao som do flamengo, um bom vinho e fatias finas do presunto.

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