MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

terça-feira, 7 de março de 2023

Quem está no poder não defende a liberdade de expressão

 

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

No Brasil, essa defesa é quase sempre tática, momentânea. Via Crusoé, a crônica de Alexandre Soares Silva:


Ninguém que não está no poder jamais diz “mas” logo depois de ter dito “defendo a liberdade de expressão”. Simplesmente não acontece. Se você ouve um “mas” depois de “eu defendo a liberdade de expressão”, a pessoa está no poder, ou votou em quem está no poder.

É como se ninguém fosse por princípio a favor da liberdade de expressão. A defesa da liberdade de expressão é quase sempre uma defesa tática, momentânea, que só fazemos quando somos nós que podemos ter a nossa liberdade de expressão restringida. Assim que somos nós que temos a capacidade estatal de restringir a expressão dos outros, e não o contrário, é curioso, mas subitamente nos ocorre a necessidade de restringir a liberdade de expressão em vários casos sutis e extremamente necessitosos, que vamos listando com gosto durante todos os anos em que estamos no poder.

Daí saímos do poder e esse problema muda inteiramente de natureza, e estamos convencidos de novo da beleza da liberdade de expressão quase sem limites, pela qual sempre lutamos heroicamente.

O ministro Alexandre de Moraes comparou as notícias falsas (jamais vou falar “fake news”) com drogas: “Uma das mais perigosas drogas, porque traz alterações na coletividade… (…) uma substância que entorpece a mente das pessoas…” Disse que as notícias falsas são uma droga que cria um “mundo paralelo” — o bizarro mundo paralelo de quem não pensa como ele.

Bom, e se eu achar que ele tomou alguma coisa que o faz viver no bizarro mundo paralelo das pessoas que não pensam como eu? Porque é isso que eu acho, no fundo. Como saber quem está certo?

Felizmente o governo Lula vai resolver essa questão delicada. Pois quem melhor para dizer se uma afirmação sobre o governo é verdadeira ou falsa do que o próprio governo, ou pelo menos um comitê de amigos do governo, pagos pelo governo?

Para atingir esse objetivo, Lula não só criou a Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia para “representar o governo no combate à desinformação sobre políticas públicas” como o seu ministro dos Direitos Humanos e Cidadania ou Algo Assim (pra mim esse é o nome do ministério), Sílvio Almeida, criou um grupo para “combater o discurso de ódio e desestimular o extremismo no país”. Esse grupo, presidido por Manuela d’Ávila (codinome “Avião” na lista de propinas da Odebrecht), vai contar com a participação do que o site do governo chama de “representantes da sociedade civil”. Citando o site gov.br: “São profissionais e estudiosos de várias áreas que se dedicam a pensar na formação para uma cultura de paz e preservação da dignidade humana”.

Entre essas pessoas estào o influencer e trapaceiro de xadrez Felipe Neto e a feminista Lola Aronovich (uma das mulheres mais equilibradas que existem).

Admito que, em termos de seriedade e de capacidade intelectual, não há do que reclamar. São inegavelmente grandes inteligências, e quem negar isso não está sendo honesto. Na verdade, não se vê uma constelação de intelectos tão brilhantes no Brasil desde que Sérgio Mallandro, Pedro de Lara, Mara Maravilha, Alexandre Frota e o grupo Absyntho se juntaram para fazer o filme As Aventuras de Sérgio Mallandro, em 1985. E acho que podemos concordar que, perto de Felipe Neto, Sérgio Mallandro parece quase um imbecil.

Mas justo eles vão avaliar se um texto é “discurso de ódio”? Vai ser desagradável ver um texto meu sendo avaliado como sendo excessivamente zangado, não perfeitamente calmo, meio nervoso, meio descabelado, truculento, mal-educado e odiento, ou até mesmo odioso — e essa avaliação ser feita por um bando de pessoas que todos conhecemos como sendo, se não odiosas, zangadas, não perfeitamente calmas, meio nervosas, meio descabeladas e muitas vezes, pelo menos na minha opinião, um tantinho odientas.

É mais ou menos como ser chamado de truculento pelo Maníaco do Parque. Ou receber uma leve admoestação do Lula de que talvez eu esteja bebendo demais. Abala um pouco as estruturas internas de uma pessoa sensível.

Quanto a mim, sou um defensor tão fanático da liberdade de expressão que defendo não só o meu direito de dizer o que eu penso, como também o seu direito de dizer o que eu penso.

Fui muito longe? Pois vou além: defendo não só o seu direito de dizer o que eu penso como até a sua obrigação de dizer o que eu penso. Se dependesse de mim, cada cidadão teria que ir para um cartório com uma cópia de cada coluna minha e colocar uma assinatura autenticada, com duas testemunhas, afirmando que concorda com tudo que eu digo.

Que o direito a essa obrigação seja negado aos brasileiros é uma injustiça que espero que o governo Lula corrija em breve.
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