O
Ministério das Relações Exteriores é responsável pelo diálogo com
países e órgãos internacionais em nome do Estado brasileiro. Sua vocação
é construir, manter ou romper as relações com outras nações. Ou seja, a
instituição funciona como uma sala de visitas para o Brasil no cenário
internacional, informando, negociando e representando o nosso país. Por
isso, sua sede, o Palácio do Itamaraty, ícone modernista criado por
Oscar Niemeyer e localizado na Praça dos Três Poderes, em Brasília, não
só foi construído apenas com materiais nacionais, mas também seu acervo
de obras de arte e mobiliário é constituído de peças feitas por artistas
e designers que nasceram ou se naturalizaram no Brasil.
Um
desses designers é o carioca Bernardo Figueiredo. Quando a sede do
palácio migrou do Rio de Janeiro para Brasília no início da década de
1960, Bernardo foi convidado para mobiliar ambientes do Palácio ao lado
de outros grandes nomes do design modernista brasileiro. “Meu pai sempre
se sentiu honrado por ter sido convidado pelo Embaixador Wladimir
Murtinho para desenhar móveis exclusivos para o Palácio do Itamaraty em
1967. Na época, ele ficou surpreso porque estava pensando em criar
móveis populares. Mas participar do projeto de um dos mais bonitos
prédios de Brasília, onde sua função é receber as comitivas
internacionais, com a missão de mostrar a cara do nosso país às outras
nações, o deixou para sempre em posição de destaque entre os maiores
designers do móvel moderno brasileiro”, afirma Angela Figueiredo, filha
do arquiteto.
Esta
oportunidade proporcionou para Bernardo uma convivência profunda com
outros nomes das artes e da arquitetura no Brasil, como Athos Bulcão,
Burle Marx e Jorge Hue, servindo como a consolidação do nome do jovem
arquiteto Bernardo Figueiredo e coincidindo com o surgimento de várias
de suas peças mais icônicas. A Cadeira Arcos, por exemplo, nasceu quando
Bernardo fora responsável pelo desenho das cadeiras do Salão de
Banquetes, destinado para 120 pessoas. Seu desenho e nome fazem
referência aos arcos que compõem a fachada do palácio e ela ganhou
projeção no ano de 1967, no primeiro pronunciamento de política externa
do governo Costa e Silva.
Quando
o decorador Jorge Hue foi convidado a criar os ambientes mais
sofisticados dos salões de festa e das áreas nobres do Itamaraty, ele
convidou Bernardo para desenhar os sofás, cadeiras e mesas de jantares
para os ambientes. Além disso, no Salão de Baile, destinado a diálogos
informais, Bernardo criou quatro conjuntos de sofás, que ficam de costas
um para o outro, facilitando a conversa entre as pessoas sentadas. Por
isso a peça se chama Sofá Conversadeira. O Sofá Rei, por sua vez, é uma
majestosa peça que permite a conversa sem que alguém, vindo de trás, a
escute. No ano de 1968, a Rainha Elizabeth II fez uma visita oficial ao
Brasil na qual fora homenageada no Palácio Itamaraty. Na ocasião, foi
feita uma fotografia da Rainha conversando com o arcebispo do Brasil
enquanto se sentava na peça desenhada por Bernardo.
Ciente
da importância de Bernardo Figueiredo na história do mobiliário
modernista brasileiro, a Schuster, empresa gaúcha, reeditou algumas
peças consagradas do designer em 2011. Itens como a Cadeira Rio e o Sofá
Conversadeira foram contemplados na reedição, entre outros móveis. No
aniversário de 50 anos da inauguração do palácio, em 2017, foi realizada
uma exposição com peças que estiveram nos espaços internos, incluindo
alguns itens desenhados por Bernardo Figueiredo. A Schuster então
relançou outras peças de uso palaciano e convivial de Bernardo,
celebrando a data. Mas a empresa foi incumbida de outro desafio a pedido
do Palácio: restaurar algumas peças originais de Bernardo que estavam
no Itamaraty.
“No
processo de reedição de um produto, mergulhamos, ou tentamos mergulhar
no contexto geral que gerou estes, como a época, a cultura,
necessidades, sonhos e buscas”, afirma Wilson. “Este mergulho traz uma
energia bacana e ao mesmo tempo uma responsabilidade na busca correta de
materiais alternativos e técnicas que preservem o espírito original.
Também nos move a curiosidade pelas soluções criativas de mestres de uma
época muito efervescente que, curiosamente, coincide com a entrada de
nosso pai para o mundo da marcenaria.”
A
história da Schuster, que em 2017 completara 50 anos, se funde ao
imaginário do modernismo nacional, caminhando em paralelo na evolução da
criatividade do brasileiro e também nas inovações industriais pelas
quais o país atravessou em meio século. Em 2021, a empresa patrocinou
uma exposição sobre o trabalho do designer e arquiteto no Museu da Casa
Brasileira, com reedições e peças originais, incluindo algumas das
presentes no próprio Palácio Itamaraty. Karen Matsuda, historiadora e
doutoranda pela FAU-USP e que estudou a carreira de Bernardo Figueiredo
afirma que Bernardo se mantém relevante até hoje por conta de sua
habilidade de inovar. “A capacidade inventiva de Bernardo Figueiredo é
seu maior legado. Em todos os campos que atuou – mobiliário, arquitetura
e urbanismo - Bernardo sempre apresentou soluções inovadoras que
dialogavam com o momento em que vivia. Sua versatilidade em diversas
escalas e uso de materiais resultou em projetos que encantam e
permanecem atuais, como é o caso do mobiliário.”, afirma.
Mila
Rodrigues, diretora criativa da Schuster Móveis, reflete sobre o
impacto e valor cultural que o trabalho de designers como Bernardo
Figueiredo tem para o nosso país. “Pensar nesses nomes que fomentaram
uma interpretação autêntica de nossa brasilidade nas artes em geral é
preservar nossa história e auxiliar as gerações a se entenderem como
pertencentes àquela cultura. Exposições, livros, debates, toda forma de
divulgar e reforçar esse conteúdo é vital para que nada sobre quem somos
se perca. É nosso tesouro.” afirma Mila.
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