A facção criminosa PCC se revolta diante das acusações de aliança com o PT: “Nóis mata, mais num manipula foto”. Via Gazeta do Povo, a crônica de Paulo Polzonoff:
A
facção criminosa conhecida como PCC (não confundir com outra facção
criminosa de sigla igual, o Partido Comunista Chinês) reagiu às
acusações do mensaleiro Marcos Valério publicadas na revista Veja. De
acordo com a publicação, o Partido dos Trabalhadores, aquele mesmo de
Lula, Dilma, Gleisi e Dirceu, mantém uma relação de longa data com os
narcotraficantes.
Entre
a alta burguesia petista, a notícia não fez nem cócegas. “Muito
estranho ressuscitarem Marcos Valério e até Celso Daniel a poucos meses
da eleição”, disse um sindicalista. “Tinha que ser careca mesmo!”,
desprezou um professor universitário. “Vocês vão ter que engolir o
Lula”, afirmou ou argumentou ou ameaçou alguém que passou atrás de mim
agora mesmo e me viu escrevendo esta coluna.
Nas
cadeias, contudo, a reação foi bem diferente. Quem viu a notícia pela
primeira vez foi Zé Macaxera, 30 mortes e 50 toneladas de cocaína nas
costas. Ele recebeu uma notificação em seu celular enquanto jogava Hay
Day numa confortável cela do presídio de segurança máxima de Presidente
Venceslau. Ao ver aquilo, Macaxera correu para avisar um superior na
hierarquia da organização criminosa, um ruivo que atendia pela curiosa
alcunha de Águas Ferruginosas. Meia hora mais tarde, Macaxera foi
encontrado morto com algumas centenas de estocadas e uma mensagem
escrita à faca no peito: “De notícia ruim nóis num gosta”.
Mas
não havia nada que Águas pudesse fazer para conter a disseminação
daquilo que o PCC considera a maior ofensa à história da instituição em
seus trinta anos de existência. “Assim nós vai tê que acioná o jurídico e
até os mano que cuida de nóis lá em Brasília”, disse Alexandre Sem
Sobrenome, figura do alto escalão do PCC que alterna períodos dando
golpes em velhinhos pelo celular e trabalhando como assessor de imprensa
da facção.
Foi
graças ao Alexandre Sem Sobrenome que consegui falar com Marcelinho
Tchê Quevara, vice-presidente de relações institucionais, head of compliance
e chief organizer murderer do PCC. Antes do meu encontro com a renomada
fonte, porém, Sem Sobrenome me disse para ser precavido com as
palavras, porque “o Quevara é extraordinário (na verdade usou uma rima
com “moda”) e muito prestativo (na verdade usou uma rima com “pelica),
mas tome cuidado com as perguntas”. E também me aconselhou enfaticamente
a fazer a entrevista antes do almoço. Não entendi por quê.
Mocó
Cheguei
ao local combinado, um restaurante chamado Mocó, e fui recebido com um
abraço efusivo e provocações carinhosas. É que fui trajado com uma
camiseta do ***********. Me colocaram para sentar numa dessas mesas de
plástico e me serviram uma cerveja pale ale. “Disculpa. A gente tamo sem
IPA”, me explicou alguém cujo nome não consegui descobrir, porque logo
Marcelinho Tchê Quevara apareceu, se sentou à minha frente e, sem
titubear, apontou uma arma em minha direção.
“Ô,
Cabeçote, manda matá o Sem Sobrenome. O cara era parça, mais é trairage
mandá aqui um cara com essa camisa imunda. Tá careca de saber que eu
torço pro *** *****, pô!”. O tal de Cabeçote saiu da sala e temi pela
vida do Sem Sobrenome, com quem jamais consegui contato novamente.
Engoli em seco como se estivesse num desenho animado. Quase pude ver um
balãozinho com “gulp” sobre minha cabeça.
Diante
do meu silêncio, Quevara se pôs a falar. “Mais agora que tá aqui,
desembucha, por favor [na verdade ele usou uma rima com “orvalho”]. O
que é que o senhor qué sabê di nóis?”, perguntou ele. Até mesmo os
repórteres mais corajosos hesitam com uma arma na cabeça, mas rezei um
Pai Nosso e, de uma vez só, fui questionando todos os quês, quens,
quandos, quantos e ondes que considerei necessários. E enquanto esperava
pelas respostas que jamais viriam a público, imaginei as notas de
repúdio da ABI, FENAJ e Sindijor.
Quevara
ficou furioso. “Só num ti mato agora porque ainda num almocei”, disse.
“É um absurdo essa coisa di parceria com o PT, tá ligado? Nóis é
bandido, mais tem vergonha na cara. Tá pensano o quê?! Nóis num vai na
Missa pra pedi voto em ano de eleição. Nóis num é loco. Nóis mata, mais num manipula foto.
Nóis esquarteja, mais num chega nem perto duma urna eletrônica. Nóis
explode caixa eletrônico, mais num assalta estatal. Tu e seus colega tá
falano bobagem. Aquilo o papo é reto, mano. O bagulho é loco, mais tudo
tem limite. Tudo!”, continuou.
Por
um instante, me esqueci da arma na cabeça e me lembrei do simpático e
hoje esquecido Juó Bananère (corre pesquisar no Google). Veja só as
coisas que a gente lembra quando está para morrer. Quevara engatilhou a
arma, fez mira bem no meio da minha testa e disse: “Só num vô ti matá
porque você parece o Lênin. E tamém pra você voltá lá e iscrevê assim
bem grande no seu jornal: ‘Em diálogo cabuloso, PCC nega envolvimento
com PT’". Comentei que era um ótimo título, mas que, se o distinto
cavalheiro me permitisse, eu acrescentaria uma fala dele: “Tu tá
brincando com a sorte, truta!”, disse ele, abrindo um riso de ouro,
rubi, esmeraldas e cristais Swarovsky. Sempre, pensei. Sempre.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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