Contemporâneas, frutos da Europa de língua alemã e transformadas pelo
Iluminismo, as teorias marxista e psicanalítica têm muito em comum,
segundo Sérgio Bivar, em artigo publicado pelo Estado da Arte. De fato, o arquitetônica da obra de Marx e Freud é o velho idealismo hegeliano:
Por alguns anos deitei no divã freudiano. Nele, o tratamento é lento
e, muitas vezes, inócuo. A “cura pela fala” não é coisa simples, se é
que possível. Mais correto é dizer que a cura se dá pela escuta, pois é
quando o paciente finalmente se escuta e o analista desce do posto de
“sujeito suposto do saber”, passando a compartilhar a posição de
“sujeitados ao não saber”, que o sofrimento psíquico ganha outros
contornos.
Na terapia, mais que me submeter ao método da psicanálise, quis me
apropriar dele. “Édipo são os outros”, era isso que meu inconsciente
queria afirmar: não serei governado por trágicos complexos estruturais. E
assim, deter a teoria fez-se mais importante que revisitar as
cicatrizes e feridas. Em resumo, ao invés de eliminar esse “Grande
Outro”, quis tomar seu espaço.
Foi nessa interessante investigação pelo pensamento freudiano, que
entendi que o marxismo e a psicanálise têm muito em comum: são
contemporâneos, nascem na mesma Europa de idioma alemão, transformada
pelo Iluminismo, industrialismo, nacionalismo e, por conta disso, às
voltas com a questão judaica. Essas duas correntes são os frutos
teóricos mais marcantes do mal estar que define a modernidade.
As semelhanças, porém, não se reduzem ao contexto histórico. Há
também algo na forma de pensar que é crucial: o framework hegeliano que
ambas compartilham. Tanto o freudismo quanto o marxismo são
influenciados por essa corrente, que dominava as discussões nos círculos
intelectuais da época. Sendo duas suas características mais marcantes:
perceber o processo histórico como formador do espírito (sujeito) e
enxergar esse processo aflorar de forma dialética, no confronto entre
opostos.
Contudo, diferente de Hegel e Marx, na psicanálise, os conflitos
históricos, individuais ou sociais, não cavalgam em belas sínteses, mas
produzem resultados inconsistentes, que se obscurecem por trás dos
recalques.
Apesar de ser um tratamento caro e lento, minhas investidas na
psicanálise me revelaram algo sobre a política, que não tem nada a ver
com conscientizar o sujeito sobre uma guerra de classes para os
proletários tomarem governo da História. E que, na realidade, se
efetivou na introjeção do ódio e na instrumentalização das massas, sob a
pena da desagregação social.
O ensinamento, que me foi revelado pela teoria de Freud, diz da
alteridade, de escutar esse outro, não como ser inferior ou superior,
sem querer engoli-lo ou temer ser engolido por ele, mas da
irredutibilidade de cada ponto de vista.
Para finalizar, não seria um exercício útil, a quem é de direita,
sentir mais complacência pelo sofrimento alheio? Não seria útil, às
pessoas de esquerda, serem mais racionais? Será que tal exercício ameaça
a identidade de cada um? Enfim, não está na hora de unir intenções e
consequências? Fazer o Brasil levantar e andar novamente, mesmo que,
atordoado e cambaleante, e perceber que esse ser cindido é ainda um ser
único.
Sérgio Bivar é empresário e escritor, co-fundador do Livres
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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