No finalzinho de setembro/16,já no segundo dia da sessão do Senado que
julgaria o processo de impedimento contra a Presidente Dilma Rousseff, escrevi
o artigo “Lewadowski é a raposa cuidando do galinheiro”. Apesar de reconhecer a
firmeza e fidalguia na condução do processo que presidia,ressaltei algumas
evidências da tendenciosidade na condução
dos trabalhos pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, usando de
pesos e medidas diferentes conforme se tratasse da acusação ou da defesa de Dilma, com notórios privilégios à
defesa, notadamente nos tempos de fala disponibilizados para cada parte. Mas jamais se poderia imaginar que
essa situação chegasse ao ponto extremo em que chegou na última hora do
julgamento, onde foi dado um verdadeiro golpe na Constituição.
Mas tudo corria de forma tolerável até a
“reta final” do julgamento, após Dilma
responder as perguntas dos
Senadores que se inscreveram , as
manifestações apresentadas por cada um, favoráveis e contrários ao impeachment,
e as palavras conclusivas dos advogados de ambas as partes.
Passava-se entãoao
julgamento propriamente dito, que deveria começar às dez horas de 31.08.16 ,mas
foi sendo postergado por diversas manobras da defesa, só começando quase ao
final da tarde, com “questões de ordem” e outras interrupções (ou
manobras?)autorizadas, ou não, em lei.
Convencidos finalmenteque apesar dos esforços da defesa o
impeachment de Dilma seria aprovado pelo Senado pela maioria de 2/3 exigida em
lei,surgiu repentinamente uma proposição
,a título de “destaque”,pela qual haveria a possibilidade de decretar o
impedimento de Dilma,porém preservar os seus direitos políticos para exercer
funções públicas ou concorrer novamente a cargos eletivos. Essa alternativa
seria uma espécie de “compensação” pela perda do mandato . Vários apelos
foram direcionados ao “coração” dos
Senadores para que, se fosse o caso, dessem uma “aliviada” na pena .
Após os debates sobre essa nova proposição, Sua Excelência o
Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal, e da sessão de julgamento do
impeachment,houve por bem acatar esse “destaque”,ordenando que ele fosse inserido
às indagaçõesque seriam respondidas pelos Senadores na decisão definitiva. Submetido
a julgamento,venceu a tese que Dilma
,apesar de impichada ,não perderia os
seus direitos políticos, podendo concorrer sem obstáculos a novos
mandatos eletivos e exercer qualquer outra função pública,abrandando o rigor da
pena determinada pela Constituição,que manda aplicar,cumulativamente,as duas
penas.
O Senador Ronaldo Caiado houve-se com precisão ao alertar a
seus pares que a possibilidade de
fatiamento ,desdobramento,do comando constitucional inserido no parágrafo único
do art.52 da CF, daria no mesmo que
admitir a hipótese de cassar os direitos políticos da “ré”, e mantê-la no
exercício da Presidência. Um absurdo. Mas de fato seria isso.
Mas há que se reconhecer que muita esperteza e imaginação
criativa estiveram presentes nesse “conluio” de gabinete, dele participando boa
parte do PMDB,”ex”(?) sócio do PT no Governo. Mas não foi o Presidente do STF o
autor direto desse “atentado” contra a
Constituição. Quem o cometeu foi o
Senado,que julgou a proposição. Mas quem forneceu as armas para esse “crime”
pelo Senado ? Porventura não foi exatamente o Ministro Presidente do Supremo
Tribunal Federal? Surge então um jogo de
“empurra” de responsabilidades, entre o
Senado,de um lado,que votou, e o Presidente do STF,de outro, que presidia a
sessão,e que ordenou a submissão do destaque à votação.
Contudo,não resta qualquer dúvida que essa votação do Senado
foi inconstitucional, apesar da sessão
em que ocorreu ter sido comandada pelo Presidente do STF - que é justamente o
tribunal competente para fazer respeitar
a Constituição - que acatou esse absurdo destaque.
Um só dispositivo da Constituição não deixa margem a
qualquer dúvida nesse sentido. Trata-se do parágrafo único do seu artigo 52.
Ali está escrito que o Presidente da República deverá ser julgado pelo Senado Federal
nos crimes de responsabilidade “ limitando-se a condenação à.....perda do
cargo, com inabilitação, por oito anos ,para o exercício de função
pública....”.
Ora, é evidente que esse mandamento constitucional não
admite “bondades” de ser aplicado só uma parte da pena ali prevista,como fez o
Senado no caso em exame. A perda do cargo DEVE ser acrescida,necessariamente,
de inabilitação,por oito anos,para o exercício de qualquer função pública,não
importando qual seja, inclusive oriunda de mandato eletivo. Qualquer disposição
em contrário prevista na lei do impeachment (Lei 1.079/50)não poderia se
sobrepor à Constituição,não só porque essa lei é anterior à CF (de 1950),como também
hierarquicamente está num plano inferior,devido à sua condição
infraconstitucional.
A “bondade” do Senado está significando que Dilma poderá
ocupar qualquer função pública a partir do seu afastamento definitivo,a
qualquer momento, inclusive de ocupar novamente a Presidência da República,ou
“vice” de Lula (ou vice-versa),ou talvez até a governança do Rio Grande do
Sul,onde tem o seu título eleitoral, já agora em 2018. Deu para entender o
“golpe”? Quem são,afinal,os verdadeiros golpistas?
Mas o pior de tudo mesmo
é que essa gente tem o vício doentio de
acusar o “outro lado” de ser golpista. De fato, até pode ser. Mas se comparados a
eles próprios, que são os “profissionais” ,os
“doutores” na especialidade, essa oposição “golpista” não passaria de um
grupo de amadores muito longe de alcançar a competência dos seus adversários.
Sérgio
Alves de Oliveira
Sociólogo e Advogado
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