MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

'Literatura contemporânea não reflete Brasil', diz escritor em mesa da Flica


Carlos Henrique Schroeder e Kátia Borges debateram bibliodiversidade.
Terceira mesa da 4ª edição da Flica foi realizada na tarde desta quinta-feira.

Ruan Melo * Do G1 BA em Cachoeira
Flica Carlos Henrique Schroeder e Katia Borges Bahia (Foto: Ruan Melo/G1 BA)Terceira mesa da Flica 2014 debateu a bibliodiversidade (Foto: Ruan Melo/G1 BA)
A literatura contemporânea brasileira não reflete o Brasil. Foi com esta afirmação que o  catarinense Carlos Henrique Schroeder começou o debate desta quinta-feira (30), na terceira mesa da Festa Literária Internacional de Cachoeira (Flica), realizada na cidade do recôncavo baiano. Ao lado da baiana Kátia Borges, ele discutiu a bibliodiversidade, a imensa variedade de ideias e histórias.
“Quais são os personagens da literatura contemporânea brasileira? 90% classe média, branco. Como a gente vai retratar a diversidade do Brasil se os escritores não refletem o Brasil? Onde está o índio? Onde está o afrodescendente? A literatura contemporânea brasileira vem passando por uma pasteurização progressiva. A Argentina, por exemplo, respeita a tradição literária. O Brasil parece que quer matar a geração anterior. Parece que para se afirmar, o escritor brasileiro tem que destruir a geração anterior. Por outro lado, o que salva a literatura são os autores que surgem nos pequenos feudos, no Rio Grande do Sul, na Bahia”, opinou Schroeder.
Já Kátia Borges defendeu a qualidade do trabalho dos pequenos autores, mas ressaltou o “isolamento literário” deles. “Eu concordo, no sentido que cada vez mais o autor tem que procurar meios próprios para que sua produção venha ao conhecimento. Aqui a gente tem autores interessantíssimos, por exemplo, no interior da Bahia, mas que ficam isolados. A grande questão é como fazer para quebrar essa barreira e, efetivamente, fazer com que eles participem no mercado. Porque essas pessoas nunca deixaram de produzir”, garante.
Flica mesa crianças Bahia (Foto: Ruan Melo/G1 BA)Muitos jovens marcaram presença na terceira mesa
da Flica, nesta quinta (Foto: Ruan Melo/G1 BA)
Como fenômeno importante para divulgação das obras, os autores citaram a internet. No entanto, Carlos Henrique Schroeder ressaltou que, ao mesmo tempo que pode ser benéfica, ela também pode prejudicar os canais de distribuição. "Hoje, com a internet, qualquer pessoa pode comprar um livro em 30 segundos. A internet veio para forçar a bibliodiversidade. Mas, por outro lado, a bibliodiversidade é ameaçada pelo canal da distribuição. As pessoas compram os livros na internet e deixam de frequentar a livraria, que é um espaço cultural. Você vai na livraria e conversa com as pessoas lá e acaba encontrando outros livros. Acho que tem que ter políticas de fomento. Eu moro em uma cidade que só tem duas livrarias e tudo acontece por lá”.
“Considero a internet uma alternativa boa para o escritor, para alcançar o público leitor. Nesse sentido ela não é um entrave à bibliodiversidade. O problema é quando você vê o mercado literário como algo comercial, você vê mais o marketing. Acho que têm que ser pensadas alternativas para aproximar o leitor do conteúdo do livro. Acho que as pequenas editoras têm conseguido isso, numa perspectiva de autenticidade", comentou também Kátia.
Os autores também defenderam a importância das pequenas editoras no mercado e a contribuição delas para a bibliodiversidade. “Nós temos as pequenas editoras que proliferam em todo país.  Elas dão espaço aos pequenos autores, que se sobressaem e acabam caindo nas grandes editoras. A pequena editora é quem dá o start para o editor”, opina Schroeder. “Elas que estão oxigenando o mercado. Elas lançam os autores para que eles cheguem ao mercado”, completou Kátia.
Kátia acredita que a maior dificuldade do autor não está em publicar os livros, mas em fazer com que eles circulem. “Em relação aos editais, eu acredito que há um defeito básico. Você lança 100 livros e eles vão para depósitos. Não há apoio de divulgação e circulação. Talvez devesse haver uma maior articulação entre os editais. Porque lançar o livro é relativamente fácil, mas fazer com que ele chegue ao público é complicado. Eu acredito que o entrave básico é a distribuição. Esses editais são importantes, mas muitas vezes se limitam a estatísticas”.
Os autores também debataram a literatura nas escolas. Kátia aponta a lacuna que existe entre escritor e leitor. "É importante você ter o contato do autor com a escola, levar ele para lá. Também é importante que exista subsídio para isso. Eu acho que as pessoas têm interesse por literatura. As pessoas querem, mas muitas vezes há o entrave de não conhecer, não ter acesso ao livro. Em Salvador você não tem acesso ao escritor do sul", disse.
Já Schroeder criticou o sistema educacional brasileiro como um todo. "O professor não lê, pelo menos os do meu estado. Ele lê o básico, a cartilha, não enxerga como um todo. É quase tudo como uma tabela: aluno e professor. A gente tem um problema muito sério no Brasil, que é a educação. E eu não posso culpar os professores, porque é algo que vem de cima para baixo. Eu sou filho de professora. Uma discussão recorrente era como qualificar o material que chega. Acho que a escola tem que repensar a educação", opina.
Programação 2º Dia
A 4ª edição da Flica foi aberta na quarta-feira (29) com a mesa “O tempo de Caymmi”, formada por Stella Caymmi, neta e biógrafa do cantor e compositor baiano, e o escritor Marielson Carvalho. Na manhã desta quinta-feira, a jornalista Consuelo Dieguez e o professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Wilson Gomes, discutiram “O país do compadrio”, os limites da camaradagem comum às famílias brasileiras.
O segundo dia também tem a abertura da Fliquinha, cuja programação é voltada para o público infantill. Haverá o lançamento do livro "A dona das águas", além de contação de história com autores quilombolas. Também serão realizados diversos bate-papos com os escritores Cyro de Mattos, Luis Augusto e com o escritor mirim Lucas Yuri. Às 17h30 começa uma oficina musical, com Gabriel Macedo, e às 19h está marcada uma palestra para professores, com Heloisa Prieto.
Já a programação musical começa às 22h, como grupo Transcendental, uma big band de jazz contemporâneo que mistura influências de filarmônicas e candomblé. Às 23h20 o ator Jackson Costa exibe sua arte na performance chamada "A coisa", na qual interpreta poemas de várias épocas, acompanhado por uma banda de música popular contemporânea, formada por sintetizador, teclado, guitarra, violão, baixo e percussão.
Todas as mesas literárias da Flica são realizadas no claustro do Conjunto do Carmo, no centro da cidade.
Claustro do Convento do Carmo recebe mesas literárias a partir desta quarta-feira (29) (Foto: Ruan Melo/G1)Claustro do Convento do Carmo recebe mesas literárias a partir desta quarta-feira (29) (Foto: Ruan Melo/G1)

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