Carlos Newton
A melhor maneira de saber se está correta ou errada alguma prática adotada pelo Brasil – seja administrativa, política, econômica ou jurídica – é simplesmente pesquisar como tudo funciona nos Estados Unidos. Para facilitar as coisas e fazê-las fluir mais adequadamente, a filial Brazil deveria ser criada à imagem e semelhança da matriz U.S.A., mas não é assim que tem funcionado.
Costuma-se dizer que, em relação aos Estados Unidos, o Brasil estaria uns 50 anos atrasado, porque trata-se de um fato real, causado pela relutância que as elites brasileiras demonstram ao se recusarem a seguir nesta filial as diretrizes que deram certo em nossa matriz.
IMPUNIDADE – Para combater a criminalidade em geral e as trapaças do pessoal do colarinho branco, nos Estados Unidos o réu denunciado pela Promotoria pode ser preso de imediato em primeira instância, mesmo não tendo sido apanhado em flagrante. Tudo depende das provas.
Aqui no Brasil é ao contrário. As provas não interessam. Para garantir a impunidade dos criminosos do colarinho encardido, os políticos e empresários brasileiros somente são presos após a quarta instância, que nem existe nos Estados e na maioria dos países ditos civilizados.
Isso significa que no Brasil os criminosos de elite não ficam presos, nem mesmo se estiverem condenados a mais de 300 anos de cadeia, como Sérgio Cabral, porque os crimes prescrevem antes de transitar em julgado. E qual é o sistema mais certo – o da matriz U.S.A ou o da filial Brazil?
ALTA PICARETAGEM – Na economia é a mesma coisa. Para encobrir picaretagens e privilégios de toda sorte, o Brasil não segue os ritos dos Estados Unidos e resolve inventar modelos próprios, que sempre demonstram favorecer as manobras das elites, em detrimento do interesse público. É o que ocorre, por exemplo, com as “operações compromissadas” que o Banco Central brasileiro autoriza para beneficiar os bancos comerciais.
Como já informamos, o inexpressivo senador petista Rogério Carvalho, que é médico e nada tem a ver com o sistema financeiro, apresentou em 2020 um projeto criando mais uma alta picaretagem para os bancos comerciais – os “depósitos remunerados voluntários”.
Existiam dois outros projetos semelhantes em tramitação há anos, mas a proposta petista passou na frente, numa velocidade espantosa e foi aprovada no Senado em apenas quatro meses e depois a Câmara ratificou em três meses e meio. Jamais um projeto andou tão rápido no Congresso, numa negociata cujo fedor pode ser sentido a quilômetros de distância.
MODERNIZAÇÃO DO BC? – Esta tremenda jogada dos banqueiros foi divulgada como “uma modernização do BC”, vejam a que ponto chega a desfaçatez.
“O instrumento é adotado em outros países e está em linha com as melhores práticas internacionais”, foi o argumento usado aqui na filial Brazil, como se isso existisse na matriz U.S.A.
Nos EUA realmente há possibilidade de se praticar operações compromissadas, mas o FED (BC americano) já as descartou por completo. Simplesmente, não são mais feitas, em nenhuma modalidade. É como se nem existissem, enquanto no Brasil essas operações são diárias.
BANCOS PRIVILEGIADOS – Na verdade, os “depósitos remunerados voluntários” são apenas uma forma criativa de possibilitar que os bancos lucrem também em cima de suas reservas , e assim o capitalismo brasileiro sem risco está atingindo a perfeição.
Outra desculpa é que essa nova modalidade não impacta a dívida pública, porque o Tesouro não vende títulos, e nesses depósitos quem paga os lucros dos bancos e segura a descarga é o próprio BC. Ora, deve ser por isso que agora, no primeiro ano de funcionamento desses “depósitos remunerados voluntários”, o Banco Central acaba de ter um prejuízo monumental de R$ 298,5 bilhões. depois de registrar lucro recorde de R$ 85,9 bilhões em 2021.
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