A combinação de CPI, protestos e mudança de postura do centro pode ser fatal ao bolsonarismo, escreve Fernando Abrucio no Estadão:
A
mistura de um populismo voltado à manutenção de um público fiel de pelo
menos 15% do eleitorado com a distribuição de cargos, verbas e poder
clientelista ao Centrão foi a fórmula adotada por Bolsonaro
para manter seu posto. Até o momento, esse objetivo foi plenamente
alcançado. Porém, três fenômenos colocam em risco o projeto político
bolsonarista. Em primeiro lugar, a CPI da Covid tornou-se mais perigosa com a denúncia de prevaricação do presidente da República no caso da vacina Covaxin.
Qualquer
caso de suposta corrupção sempre é grave, mas duas coisas tornam esse
fato ainda mais inflamável: o bolsonarismo mantinha sua aura de
incorruptível até agora, mesmo com as rachadinhas de Flávio Bolsonaro ou as negociatas do então ministro Ricardo Salles com madeireiros,
e isso, provavelmente, não se sustentará mais, pois o que está em jogo
agora é que se planejou roubar dinheiro público na compra de algo que
faltou aos brasileiros: a vacina.
Um segundo fenômeno é o crescimento paulatino das manifestações pedindo a saída do presidente.
As últimas já foram maiores do que as anteriores, e as próximas tendem a
ter maior expressão ainda, sobretudo por conta do novo escândalo do
Covaxingate. Não são apenas eleitores de esquerda que estão indo às ruas
e, com o cheiro de corrupção que custou vidas ficando cada vez mais
forte, mais gente tenderá a ignorar o isolamento social para gritar
contra Bolsonaro.
Uma última coisa pode ampliar a adesão ao impeachment:
o apoio a Bolsonaro e a forma mais branda de oposição, praticada
particularmente pelo centro democrático, podem mudar de posição. No caso
do Centrão, o temor é que o presidente coloque toda a culpa nele para
se livrar do escândalo, de modo que talvez seja melhor sair antes que a
casa caia. Já para os que advogam a chamada terceira via, fica cada vez
mais claro que só há uma chance de evitar a polarização no segundo turno:
derrubar Bolsonaro em um processo que mostre que ele é culpado por
mortes e irregularidades administrativas. Se os partidários de um
candidato centrista não abraçarem o impeachment logo, perderão a
relevância política na eleição de 2022.
*Doutor em Ciência Política pela USP e professor de Gestão Pública da FGV-Eaesp
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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