Caminhamos para uma ditadura da ideologia dominante, diante da qual devem ceder todos os valores democráticos. E os deputados europeus votam um relatório destes sem pestanejar. Raquel Abecassis para o Observador:
No
extraordinário mundo novo que estamos a conhecer qualquer absurdo se
pode tornar realidade. É assim que os supostos fanáticos da democracia
se estão, na realidade, a transformar em fanáticos e extremistas.
Nada
de novo na história da Humanidade. Basta ver como no passado as
democracias europeias nos conduziram a duas guerras hediondas. Agora, é
em nome dos direitos reprodutivos da mulher que se acha normal acabar
com a liberdade de consciência dos profissionais de saúde. São ainda
estes direitos reprodutivos que consagram o aborto como um direito
humano, omitindo que o maior direito consagrado é o direito à vida.
A
história é simples de contar. Um dito deputado Matic, socialista
croata, fez um relatório onde pretendeu dar força de lei à sua
ideologia. No documento que foi a votos em Estrasburgo, «lamenta que,
por vezes, a prática comum nos Estados-membros permita que profissionais
médicos – e, em algumas ocasiões, instituições médicas inteiras – se
recusem a prestar serviços de saúde com base na chamada cláusula de
consciência, o que conduz à recusa de serviços de aborto por motivos de
religião ou consciência e põe em perigo a vida e os direitos das
mulheres». Noutro ponto «exorta os Estados-membros a aplicarem medidas
regulamentares e executivas eficazes, a fim de garantir que a cláusula
de consciência não põe em risco o acesso atempado das mulheres aos
cuidados de Saúde Sexual e Reprodutiva».
Por
outras palavras, substitui-se a palavra “liberdade” por “cláusula”,
despreza-se um direito fundamental, o direito à liberdade de
consciência, sacrificando-o aos mais altos valores de uma ideologia.
A
dita recomendação, que ainda não é lei, foi votada no Parlamento
Europeu e aprovada por 378 votos a favor, 255 contra e 42 abstenções. É
isto. Com pequeninos, grandes passos caminhamos para uma ditadura da
ideologia dominante, diante da qual devem ceder todos os valores
democráticos. E os deputados europeus votam um relatório destes sem
pestanejar. Sem se questionarem por um segundo sobre o que estão a
fazer. Indiferentes ao perigosíssimo precedente que estão a abrir e que
um dia pode bem virar-se contra eles, em nome de uma outra qualquer
ideologia.
A
pouco e pouco, a Europa vai deixando de ser aquele espaço de liberdade e
de convívio entre culturas, tradições e ideologias diferentes. A
liberdade de consciência já está posta em causa, falta agora formalizar
uma recomendação para colocar em causa a nossa “cláusula” de pensamento.
Se for apresentada no Parlamento Europeu, a grande casa da democracia
europeia, quem sou eu ou qualquer um de nós para a pôr em causa?
E
ainda há quem pergunte como foi possível a perseguição aos judeus e o
Holocausto nos anos 40 do século passado. É simples, tudo começou com
uma ideologia dominante que se fez lei e sacrificou direitos
fundamentais a um bem, supostamente, maior.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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