O feminismo transformou a causa justa da igualdade de oportunidades na
visão radical da “igualdade de gênero”. A igualdade de gênero é um
disparate, é falsa e visa alcançar outros objetivos políticos. Artigo de
José Marques de Almeida, via Observador:
Ontem, li três notícias que mostram as mudanças das posições das
mulheres. A primeira vem de uma sociedade medieval, e com algumas regras
detestáveis, a Arábia Saudita. No reino saudita, desde ontem, as
mulheres já podem viajar sem autorização de um homem, já podem registar
os seus filhos e até já podem pedir o divórcio. A figura do guardião
masculino, responsável pelas mulheres, incluindo Mães, irmãs, tias e
primas, está a chegar ao fim. Uma notícia óptima para as mulheres
sauditas.
A segunda notícia diz que pela primeira vez uma mulher irá arbitrar
uma final da supertaça europeia de futebol, entre o Liverpool e o
Chelsea. Num país, como o nosso, com tantas polémicas com arbitragens no
futebol, seria óptimo se houvesse cada vez mais mulheres a arbitrar os
jogos mais importantes e decisivos. Estou convencido de que o nível da
arbitragem aumentaria, assim como a disciplina dos jogadores, e de que
os casos duvidosos diminuiriam. Parece ser mais difícil corromper as
mulheres do que os homens. Pelo menos, não seria fácil oferecer “fruta”
às árbitras, e poderia ser o caminho para o fim dos “padres”
benfiquistas no futebol. Precisamos de mais mulheres nos relvados
portugueses a arbitrar os jogos do Campeonato e das taças.
A terceira notícia diz respeito à escolha, pela União Europeia, de
apresentar Kristalina Georgieva como a candidata dos europeus à chefia
do FMI. Desconfio que Centeno percebeu que existia uma grande vontade na
Europa de escolher uma mulher, e por isso retirou a sua candidatura. A
escolha de Georgieva segue-se à de Ursula Von Der Leyen para a
presidência da Comissão Europeia e à de Cristine Lagarde para a chefia
do Banco Central Europeu. Sobretudo no caso da Comissão Europeia já não
era possível adiar a escolha de uma mulher para a sua presidência, visto
que nunca tinha acontecido em mais de 60 anos de integração europeia.
Foi um sinal importante para uma maior igualdade entre homens e mulheres
na Europa.
Devo dizer, no entanto, que sou contra a política de quotas por três
razões. Em primeiro lugar, porque viola o princípio da igualdade. E
viola-o num duplo sentido. É um acto discriminatório contra os homens e
desvaloriza as mulheres que concorrem a esses lugares. Não concebo que
se combata uma injustiça criando outras injustiças. Em segundo lugar, a
minha oposição resulta de uma atitude conservadora em relação às
mudanças sociais. Acho que as alterações por decreto criam
desequilíbrios e exageros sociais desnecessários. Por fim, e aqui está a
minha costela liberal, considero que as nossas sociedades devem ser
reguladas pelo mérito e pelo princípio das oportunidades iguais. Desejo
viver numa sociedade onde as mulheres gozam das mesmas oportunidades dos
homens e chegam aos lugares de topo devido ao seu valor e aos seus
méritos e não pela imposição de quotas.
Esta consideração sobre as quotas leva-me ao tema da emergência da
ideologia feminista. Vivemos tempos de ideologias monotemáticas, o que
claramente derrota as previsões daqueles que durante décadas têm falado
do “fim das ideologias”. O feminismo transformou a causa justa da
igualdade de oportunidades na visão radical da “igualdade de género”. A
igualdade de género é um disparate, é absolutamente falsa (qualquer
pessoa que tenha filhas e filhos percebe imediatamente o meu argumento) e
procura alcançar outros objectivos políticos. Na verdade, usa a luta
justa pela igualdade de oportunidades para legitimar a conquista do
poder por grupos políticos radicais, que pretendem, de resto, acabar com
a liberdade individual.
Há ainda uma consideração mais pessoal. Quando observo muitas das
feministas, sobretudo as militantes em partidos radicais, parece-me
sempre que perderam, algures no passado, o seu lado mais feminino,
aquele que distingue as mulheres dos homens por todas as boas razões.
Aprenderam muito sobre argumentos ideológicos e formas de luta política,
mas esqueceram-se do que de mais elementar existe nas mulheres. Numa
das suas melhores canções, “Foi Assim”, Maria Bethânia canta que procura
um homem que “pudesse compreender todo o meu Eu.” Bethânia sempre lutou
pela igualdade, mas também é sábia. Ao contrário da Bethânia, muitas
feministas esqueceram que o Eu feminino é muito mais do que a militância
política. Deveriam ouvir mais música e estudar menos ideologia.
BAHIA.BA
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