Vasculhar orçamentos do PRONAC (Lei Rouanet)
Insistimos com os gastos do
ministério da Cultura (MinC). Entendemos que o trabalho da CPI a ser
aberta para investigar os recursos liberados pela Lei Rouanet é enorme
e recuperará muito dinheiro desviado. Para esta nova etapa de análise de
gastos do ministério, precisamos explicar alguns termos. O primeiro
deles é o “Pronac”, apresentado no site do ministério como “Programa
Nacional de Apoio à Cultura (Pronac) foi implementado pela Lei Rouanet
(Lei 8.313/1991), com a finalidade de estimular a produção, a
distribuição e o acesso aos produtos culturais, proteger e conservar o
patrimônio histórico e artístico e promover a difusão da cultura
brasileira e a diversidade regional, entre outras funções.“
Quando um projeto é aprovado pela
comissão avaliadora do MinC para ser beneficiado pelo PRONAC, é feito um
orçamento detalhado de onde serão gastos os recursos. Estes dados vão
para um sistema, público, onde então aguardam o parecer de um técnico,
que consulta os preços dos itens em tabelas públicas como o Sistema
Nacional de Pesquisa de Custos da Construção Civil (SINAPI) , o informativo SBC (aqui)
ou a tabela PINI. O técnico também pode fazer pesquisas de mercado para
confirmar os valores. Encontrando discrepância, ele aponta os valores
corretos e faz, ao final, uma soma geral. Este novo orçamento do técnico
é então “respondido” por aqueles que enviaram a proposta inicial. Se o
m2 de determinado tipo de argamassa está com preço acima do mercado no
orçamento original, e o técnico aponta a diferença, os proponentes do
orçamento podem responder dizendo que o valor mais alto se justifica
pela localidade da loja que fará a entrega, dizendo que o frete foi
considerado ou que somente aquela loja tinha aquela argamassa. O
proponente do orçamento pode fazer este tipo de revisão e pedir nova
avaliação indefinidamente, até onde for sua habilidade e criatividade
para apresentar justificativas. Mais abaixo mostraremos um exemplo deste
tipo de justificativa
Quando o Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) aprova, não há mais volta e mesmo
o que está com preço acima do mercado é realizado. Há casos de Pronacs
de altíssimo valor que só chegam a ser analisados pelo TCU 4,6 e 10 anos
após a aprovação dos recursos em função da burocracia e dos pobres
recursos que são investidos em fiscalização destes projetos e das
obras. .
Embora tenha milhares de cargos
comissionados e uma estrutura gigantesca, justamente na fiscalização da
aplicação de recursos liberados pela Lei Rouanet faltam profissionais
especializados, que seriam os engenheiros orçamentistas – para
fiscalizar essas planilhas de orçamento aprovados pelo MinC. Vale
lembrar que esses projetos fazem uso diretamente de recursos públicos
mas não seguem os mesmos passos que uma obra pública. O proponente de um
projeto aprovado pelo MinC, mesmo gerindo milhões, não é obrigado a
abrir licitações. Ao contrário das licitações, apenas as planilhas
dos Pronacs passam por fiscalização, não há fiscalização das obras
realizadas para verificar se tudo o que foi para a planilha de orçamento
foi realmente utilizado.
Para que entendam as possibilidades,
trazemos abaixo um orçamento aprovado pelo MinC para aplicação de
recursos públicos oriundos de renúncia fiscal.
Um projeto como exemplo
O projeto da imagem acima foi orçado em
R$ 26 milhões que seriam utilizados para “Restauração e Adaptação do
Pavilhão das Culturas, Parque Ibiraquera”. Após revisão por técnicos, o
projeto foi aprovado com R$ 24 milhões. Qualquer um pode conferir o
projeto clicando aqui.
Vejamos primeiro um exemplo de item recusado por parecer técnico, um caso já bastante simbólico: o Instituto Pedra (guardem esse nome para o futuro) queria ter, durante a obra, o direito a um motorista particular para seus diretores. Cliquem na imagem para ampliá-la:
Agora, vamos a um caso em que o valor do item é altíssimo se comparado ao preço de item na tabela SINAPI:
O tipo mais caro de argamassa na tabela
SINAPI tem preço unitário de R$ 46,26 (1), bem menos que esses R$ 70,05
e que, apenas neste item, geraria uma economia de R$ 360 mil.
Outro caso escolhido aleatoriamente e analisado diz respeito ao item “Brise Hunter Douglas – Termobrise” abaixo:
Entramos em contato com uma revendedora
dos produtos HunterDouglas e fizemos uma cotação do mesmo tipo de Brise.
Se no orçamento enviado ao MinC o m2 custava R$ 635, na nossa simulação
de orçamento ele saiu por R$ 445,40 (2), uma diferença que no preço
final geraria economia de R$ 159 mil reais.
Só nesses rápidos exemplos estamos falando de economia potencial de quase R$ 600 mil.
Agora vejam um caso, neste mesmo
projeto, em que o técnico do IPHAN questionou uma despesa orçada e teve,
em resposta, justificativas de proponente que foram aceitas. O projeto
teve aprovado R$ 5 mil para criação do site “a preço de mercado” e mais
R$ 10 mil de manutenção do site por um web designer por dois meses:
O QUE A CPI DEVE FAZER
Nossa análise foi rápida. Não fazemos
nenhuma acusação pois não somos especialistas em orçamento. De qualquer
forma, o que mostramos aqui é como são frágeis os sistemas de controle
de recursos públicos usados por quem é beneficiado pela Lei Rouanet.
Uma CPI séria sobre os gastos do
ministério da Cultura deve reservar uma equipe para revisar projetos de
alto valor, questionar as empresas responsáveis pelas obras e ter gente
capacitada para passar um pente fino em cada um desses itens. Técnicos
do IPHAN também poderiam ser consultados para ajudar nas análises.
Após os trabalhos da CPI, os deputados
devem revisar a legislação que regula os Pronacs de obras (leis,
decretos, portarias envolvidos no programa) para eliminar a “zona
cinzenta” apresentada aqui.
O que não podemos é ter para uma lei que já é restritiva e elitista, tais privilégios
(1) Tabela SINAPI, trecho com valores de argamassa
(2) Orçamento para Brise Douglas Hunter:
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