Médica relata que escola disse que seu filho 'precisava de igreja'.
Estado possui três instituições com atendimento para todas as síndromes.
Crianças com autismo devem conviver normalmente com outras crianças para facilitar o desenvolvimento (Foto: Reprodução EPTV)
O funcionário público Edgar Macedo descobriu, há 4 anos, que o seu neto
Paulo Eduardo tinha características do espectro do autismo. Antes do
diagnóstico do neuropediatra, a família notou um distanciamento. “Ele
precisa de atenção 24 horas. Quando ele se fecha no mundinho dele, não
deixa ninguém entrar. Então eu uso a música e a poesia, é uma forma
lúdica da gente se comunicar”, revela Macedo. A busca pela metodologia
adequada, porém, parece ser primariamente das famílias: segundo pais de
autistas do Pará, são poucas as escolas que conseguem lidar com este
tipo de aluno.Apenas três instituições públicas do estado oferecem espaço especializado para pessoas com necessidades especiais, nenhuma com didática especialmente voltada para o autista. Segundo especialistas, a educação inclusiva ainda é um entrave no desenvolvimento de pessoas com o transtorno - no caso do garoto Paulo, apesar dele ter sido diagnosticado com autismo aos três anos, só conseguiu ser matriculado em uma escola em 2014, já com 7 anos, e mesmo assim o menino não conta com acompanhamento de profissionais especializados.
A médica Mônica Moura pesquisou bastante antes de decidir matricular o filho Tayio em uma escola pequena, esperando que, com menos coleguinhas na classe, o garoto pudesse mais f acilmente ser acompanhada por fonoaudiólogo e terapeuta ocupacional. “As escolas pequenas têm 5 a 7 alunos por turma. Combinamos um horário e eu fui lá para conhecer. Como qualquer criança que volta de férias, meu filho foi contrariado, mas estava tudo normal”, relata.
Segundo Mônia, Tayio é uma criança que interage e conversa, mesmo sem seguir uma linha de raciocínio, e fala palavras soltas - comportamento típico do autismo. Ao explicar para a coordenadora do colégio sobre o diagnóstico do filho, uma professora foi chamada e tocou no menino.
Habilidades do autista devem ser identificadas e
aprimoradas (Foto: Elivaldo Pamplona/O Liberal)
“Quem sabe o que é o autismo sabe que não pode chegar e tocar na
pessoa. Eu achei estranho, mas pensei que seria alguma técnica dela.
Passou um tempo e chegou outra pessoa que convidou meu filho para
brincar no parquinho. Eu tentei acalmá-lo, mas insistiram”, reclama a
médica, que ficou assustada com a falta de conhecimento dos funcionários
sobre a síndrome. Ela afirma que, após as consecutivas ações, Tayio
teve uma crise e foi preciso que ela mesma contivesse a criança para que
ninguém fosse agredido.aprimoradas (Foto: Elivaldo Pamplona/O Liberal)
“Então, eu vi uma mão na cabeça dele e uma pessoa começou a rezar. Depois chegou outra moça dizendo: ‘afasta o inimigo, Senhor!’. Aí eu comecei a chorar, eu não estava acreditando. Começaram a exorcizar o meu filho. E com todos falando alto, mais ele ficava agitado. Ele só se acalmou quando eu pedi que todo mundo saísse”, revela a mãe.
Depois da crise de Tayio, a coordenadora da escola informou que não haveria mais vaga para a criança. “A coordenadora disse para eu procurar uma igreja, porque meu filho precisava de igreja. Eu agradeci, peguei meu filho e fui embora. Mesmo que tivesse vaga, de jeito nenhum eu ficava lá”, desabafou.
Segudo a coordenadora do colégio, Elieth Chagas, o relato da mãe é impreciso. Para o colégio, não houve exorcismo. "De maneira alguma. Nem trabalhamos religião na escola, apenas éticas e valores. Tenho crianças autistas na escola, que saem lendo e escrevendo. A nossa escola é uma segunda casa", justifica
Para Mônica, apesar de alegarem trabalhar com alunos especiais, falta conhecimento por parte das escolas. “Como é que uma escola, que diz que sabe lidar, quer exorcizar uma criança com crise clássica de autismo? O que eu vejo é fantasiado demais. Na vida real, é difícil para caramba. É por isso que eu estou pleiteando respeito”.
Segundo a pediatra Amira Figueiras, cerca de 600 crianças que manifestam características no espectro do autismo são atendidas no ambulatório de autismo do hospital Bettina Ferro da Universidade Federal do Pará (UFPA). São meninos e meninas com dificuldade ou desinteresse em socializar - um comportamento que precisa ser trabalhado para que o paciente não se isole em seu próprio mundo.
Segundo a médica e coordenadora do espaço, o número de crianças autistas no Pará deve ser muito maior do que a capacidade do ambulatório, mas muitos pacientes ainda não têm diagnóstico fechado. Um dos obstáculos é a falta de conhecimento sobre o autismo, já que, para Amira, o diagnóstico costuma ser de fácil identificação. (Veja o vídeo acima)
Educação
Mariane Sarmento da Silva é terapeuta ocupacional, especialista em Desenvolvimento Infantil e mestre em Teoria e Pesquisa do Comportamento. Para ela, quando o assunto é autismo e inclusão escolar, o tamanho da escola não é o mais importante.
“O que vale é essa instituição contribuir para o desenvolvimento da criança autista, oportunizar o convívio com outras crianças da mesma faixa etária, o que possibilita o estímulo às suas capacidades interativas e diminui o isolamento social. Essa inclusão pode oportunizar os contatos sociais e favorecer o desenvolvimento tanto da criança autista, como das outras crianças. A interação é a base do desenvolvimento”, explica.
Docente e diretora da Faculdade de Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFPA, Mariane diz que a inserção da criança autista precisa ser acompanhada por profissionais especializados, o que ajuda o educador no atendimento individualizado. A partir das demandas de cada criança, eles enfatizam não suas limitações, mas suas capacidades de desempenho e habilidades.
“O papel do terapeuta ocupacional é fundamental no estímulo de habilidades comunicativas da criança autista, por meio da construção de recursos da Comunicação Alternativa e Ampliada, que pode auxiliar a criança autista no processo de comunicação. Os pais das outras crianças têm o papel de orientar seus filhos em relação à igualdade das pessoas, dentro de suas limitações. Todos temos limitações. Os autistas têm as deles. O fato principal está em lidar com as diferenças e aceitá-las”, esclarece.
Rede municipal
Segundo a Secretaria Municipal de Educação (Semec), cerca de 577 alunos especiais, sendo 183 autistas, são atendidos pela rede municipal de Belém em 33 salas de recursos multifuncionais. Essas salas estão distribuídas nas escolas municipais e, segundo a Semec, oferecem material didático pedagógico especializado, além de psicólogos, fonoaudiólogos, assistentes sociais, fisioterapeutas, entre outros profissionais que atendem desde o ensino infantil até a educação de jovens e adultos.
Para buscar atendimento na rede municipal, basta ir até o Centro de Referência e Inclusão Educacional Gabriel Lima Mendes (CRIE), localizado na avenida Gentil Bittencourt, entre travessa Quintino Bocaiuva e Rui Barbosa, ao lado do Centur. A equipe que recebe a família faz uma avaliação da criança, identificando suas dificuldades e habilidades e a encaminha para uma escola.
Ainda de acordo com a Secretaria, o professor que irá receber a criança na escola recebe um relatório que irá ajudar ele a atender o autista de forma adequada. O aluno vai estudar na sala regular, porém, duas a três vezes por semana será encaminhado para a sala de recurso multifuncional para aprimorar suas habilidades. As famílias também recebem atendimento do Crie, com acompanhamento de assistente social.
Unidade de Educação Especial, do Governo do Estado, atende crianças e jovens com autismo (Foto: Elivaldo Pamplona/O Liberal)
Governo do EstadoA gestão estadual afirma que três unidades são especializadas no atendimento de alunos com o espectro do autismo, com salas de recursos multifuncionais, a instituição Yolanda Martins, Unidade Técnica de Icoaraci e Unidade Técnica de Santarém. O Governo do Estado também afirma que 641 escolas da rede estadual possuem salas de recursos multifuncionais
Segundo a Seduc, para ter acesso à educação no estado, o aluno com autismo deve ser matriculado na rede regular de ensino, tendo direito a uma segunda matrícula na sala de recurso multifuncional e/ou núcleos ou centros, para que este receba o atendimento especializado de acordo com o projeto pedagógico da escola.
A Coordenadoria de Educação Especial (COEES) fica na avenida Almirante Barroso, 1765, no bairro do Marco. Informações no telefone (91) 3222-8637. Também é possível buscar atendimento no Núcleo de Atendimento Educacional Especializado aos Transtornos globais do Desenvolvimento (NATEE), localizado na travessa Perebebuí, s/n, também no Marco, entre avenida Romulo Maiorana e Duque de Caxias. Para tirar dúvidas basta ligar no telefone (91) 3226-5180.
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