Bolsonaro tem 100% da culpa pelo ministro que já indicou, e outros 100% pelo que vai indicar. J. R. Guzzo para a Gazeta do Povo:
O
Brasil e os 220 milhões de brasileiros só têm uma oportunidade na vida —
uma só — de se livrar de um ministro do Supremo Tribunal Federal:
quando o calendário, na sua marcha para frente que nem o STF pode parar,
mostra que um dos onze bateu nos 75 anos de idade. Aí o cidadão tem de
ir para casa, por mais que não queira; do ponto de vista do interesse
público, é quase sempre o único momento realmente positivo de sua
carreira.
Está
para acontecer de novo, pela segunda vez no governo do presidente Jair
Bolsonaro, e pela segunda vez o que se prevê é um desastre com perda
total. Em vez de aproveitar essa oportunidade preciosa de se livrar de
uma das onze calamidades que dão expediente na nossa “corte suprema”, e
colocar em seu lugar um magistrado de verdade, o presidente, pelo que se
anuncia, tomou o rumo de colisão frontal contra a coisa certa.
É
trágico, porque não é todo dia que um ministro faz 75 anos de idade e
tem de pedir as contas. Ou se tira proveito desses momentos raríssimos
para melhorar alguma coisa, ou o Brasil continua tendo um dos piores
tribunais superiores que existem no mundo — o que está aí, pela
espantosa coleção de decisões perversas que tem tomado, é o pior que
este país jamais conheceu. Na primeira oportunidade que teve de nomear
um ministro, Bolsonaro a jogou no lixo. Nomeou, e o Senado aprovou com
entusiasmo, uma nulidade absoluta tirada do Piauí – e cuja única
credencial, além de tomar tubaína com o presidente, é servir ao
“centrão” político que manda no Brasil velho.
O
presidente, pelo que indica no momento o cheiro da brilhantina, vai
repetir a dose na segunda indicação que o destino lhe reservou; parece
decidido a colocar lá dentro, no lugar a ser aberto com o desembarque do
ministro Marco Aurélio, mais um nome absurdo. É o que se chama “100% de
aproveitamento”. Teve duas chances de dar ao Brasil um STF um pouquinho
melhor. Vai conseguir, nas duas vezes, tornar a coisa ainda pior do que
já é.
Pode
ser difícil de acreditar, mas o critério de Bolsonaro para nomear o
novo ministro não tem absolutamente nada a ver com a qualificação do
sujeito como juiz, ou sua competência profissional. Pior: o presidente
diz na cara de todo mundo, sem nenhuma tentativa de qualquer disfarce,
que vai indicar o próximo ministro pela única e exclusiva razão de que
ele é “evangélico”.
Que
raio tem a ver a religião de um indivíduo com a sua capacidade de
ocupar uma vaga — que vai durar até os 75 anos de idade, ou pelo resto
da vida em termos práticos — no tribunal que hoje manda e desmanda no
Brasil? Não é que está sendo indicado um subprocurador do Instituto de
Pesos e Medidas. É um ministro do STF, e um ministro do STF pode fazer
tudo — desde proibir helicópteros da polícia de sobrevoarem as favelas
do Rio de Janeiro, até anular de uma vez só todos os processos penais
contra o ex-presidente Lula, inclusive sua condenação em terceira e
última instância pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de
dinheiro, com o único propósito de colocar o homem de novo na
presidência da República.
Na
bolsa de apostas e de palpites sobre o novo ministro, cita-se como
“pontos a favor”, por exemplo, o fato de um cidadão rezar todo dia às 6
horas da manhã junto com Bolsonaro, ou de ter a simpatia de sua mulher
Michelle, ou de ser o preferido do “bispo Rodovalho” e de sua igreja
“Salva Nossa Terra”. Outro nome estaria forte por ter nascido em Alagoas
— e, como tal, ser próximo não apenas do deputado Arthur Lira como
também do senador Renan Calheiros. Que tal?
O
presidente Bolsonaro não é responsável pelas aberrações que o STF
comete a cada vez que um ministro assina um pedaço de papel. Mas tem
100% da culpa pelo ministro que já indicou, e outros 100% pelo que vai
indicar.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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