Reconhecer que não estamos sós e que podemos não ser os mais evoluídos nos dá nova perspectiva. Dagomir Marquezi para a revista Oeste:
O
que lhe vem à cabeça quando se fala em vida extraterrestre? O monstro
gosmento de mandíbula dupla dos filmes Alien? O cabeçudo simpático com
uma luz na ponta do dedo do filme E.T. — O Extraterrestre? Você pensa
nas orelhas pontudas do doutor Spock em Star Trek? Ou em Sonic, o veloz
ouriço-azul do video game? Lembra os bons selvagens de Avatar? Ou os
impiedosos caçadores de cabelo rastafári da série Predador?
Quando
imaginamos um alienígena para estrelar uma obra de ficção, tendemos
naturalmente a projetar nossos temores e esperanças. Pensamos em seres
assustadores, matadores cruéis e babões. Ou em seres irresistíveis sem
nossos defeitos.
Como
será então um ser extraterrestre de verdade? A questão mais importante
aqui é a simples aceitação de que existam seres em outros planetas. A
ideia de que a vida seja um privilégio da Terra e que nós, os humanos,
somos as únicas criaturas inteligentes num universo de
1.000.000.000.000.000.000.000 (ou 1 trilhão de bilhões) de estrelas nem
deveria ser levada a sério.
Em
1995, os astrônomos suíços Michel Mayor e Didier Queloz descobriram a
existência do 51 Pegasi b, mais tarde batizado de Dimidium. Ganharam o
Nobel de Física pelo feito. Foi a primeira prova científica da
existência de um exoplaneta (isto é, um planeta fora do sistema solar),
rodando em órbita da estrela 51 Pegasi, na constelação de Pégaso.
Exoplanetas não pararam mais de ser descobertos. Já foi comprovada a
existência de mais de 4.300 em apenas 15 anos.
Até
agora a possibilidade mais aceita para confirmar a existência de seres
alienígenas era esperar que um disco voador pousasse na pracinha da
esquina e de lá saísse um sujeitinho verde com antenas na testa. Era o
modo “passivo” de responder a uma das mais importantes questões de toda a
história da humanidade.
Agora
decidimos ir atrás. E estamos muito próximos de comprovar que não
estamos sós. É muito provável que a primeira prova de vida fora da Terra
seja a imagem microscópica de uma bactéria sem graça. Mesmo assim, esse
momento será um marco na história da humanidade. Como se costuma dizer,
não é mais uma questão de se, mas de quando.
Calcula-se
que exista vida desde a primeira infância do universo, há 13,8 bilhões
de anos. Hoje a astronomia usa o termo “zona habitável” para descrever
as regiões cósmicas onde podem existir planetas com condições para gerar
vida. Como se diz na Nasa, a agência espacial norte-americana: “Quer
saber se um planeta é habitável? Procure saber se tem água”.
Como vimos na Edição 33, no artigo “Um drinque na Lua”,
pesquisas recentes mostraram que pode existir muita água até num
satélite aparentemente estéril. Naves diversas já estão a caminho de
Marte com foco em buscar sinais de água e vida. Em 2013 a Nasa captou a
possível existência de um lago na cratera Gale.
Até
na infernalmente quente Vênus, onde na superfície o chumbo se
derreteria a 460 graus Celsius, cientistas captaram a presença de um gás
chamado fosfina (mistura de hidrogênio com fósforo). O gás está 55
quilômetros acima da superfície, onde a temperatura é similar à da
Terra. A fosfina também existe na Terra, e é produzida por
microrganismos. Pela lógica, na atmosfera de Vênus poderia haver alguma
forma de vida também. Novas missões espaciais estão para partir nos
próximos meses e poderão ajudar a chegarmos a uma conclusão mais
positiva.
Dentro
do sistema solar já existem corpos celestes nos quais é praticamente
certo que encontraremos algum tipo de vida. Algumas luas de Júpiter
(Europa, Ganimedes e Calisto) são possíveis locais por causa da presença
de água em estado líquido. A lua de Saturno chamada Enceladus é outro
ponto a ser pesquisado. Assim como Titã, um satélite gigante, maior que o
planeta Mercúrio, com superfície congelada a 180 graus negativos. Em
breve a nave Dragonfly, da Nasa, deverá explorar Titã em detalhes. Lá
talvez se encontre algo fora de nosso padrão: alguma forma de vida
baseada em etano (e não em água), e sem o princípio do DNA em suas
moléculas.
Já
existe um ramo da ciência dedicado exclusivamente à busca de vida fora
da Terra, a astrobiologia. Enquanto astrobiólogos não podem pesquisar
outros corpos celestes in loco, fazem experiências com os chamados seres
“extremófilos”. São organismos que sobrevivem em áreas da Terra
extremamente hostis, como regiões desérticas ou polares. O princípio
adotado é que, se organismos se desenvolvem em lugares como cavernas
profundas ou lagos vulcânicos ácidos da Terra, podem se desenvolver
também em planetas como Marte ou Dimidium.
A
Agência Espacial Europeia realizou experiências práticas nesse sentido,
levando criaturas invertebradas para a Estação Espacial Internacional
(ISS). Bactérias e outras formas básicas de vida terrestre foram
expostas a radiações, congeladas e descongeladas todos os dias,
submetidas a temperaturas entre 27 graus Celsius negativos e 46 graus.
Após seis meses de viagem, voltaram para a Terra vivas e em boas
condições.
A
experiência provou que a chamada panspermia é perfeitamente possível.
Panspermia é o nome que se dá à possibilidade de formas de vida
colonizarem planetas “pegando carona” em asteroides. Como
espermatozoides à procura de óvulos, asteroides podem estar viajando
neste momento carregando a vida para “fecundar” planetas distantes. A
própria vida na Terra pode ter começado assim.
Claro
que o fascínio maior é exercido pela possibilidade de encontro com uma
forma de vida extraterrestre inteligente e comunicativa. O astrônomo e
astrofísico Frank Drake chegou a criar uma fórmula apelidada de Equação
Drake para calcular a chance de um encontro com alienígenas avançados. A
equação foi produzida como parte do projeto SETI (ou “Busca de
Inteligência Extraterrestre”). O SETI usou uma rede planetária de
computadores conectados globalmente por voluntários para analisar sinais
de rádio captados do espaço tentando destacar algum tipo de transmissão
inteligente. Nada de conclusivo foi encontrado.
O
SETI está sendo complementado agora pelo METI (“Mandando mensagem para
Inteligência Extraterrestre”). Em vez de “escutar” sinais, o METI
transmite mensagens da Terra para as estrelas mais próximas. “Minha
maior preocupação”, declarou o astrobiólogo e presidente do METI,
Douglas Vakoch, “é que exista de fato um monte de outras civilizações
por aí, mas estejam fazendo exatamente o que nós fazemos. Eles podem ter
esses robustos programas SETI, e todos estão ouvindo, mas ninguém está
dizendo alô.”
Em
2017, uma mensagem simplificada foi enviada pelo METI na direção da
estrela Luyten. Se houve uma resposta, ela só deve chegar à Terra em
2041. Qual é o sentido dessa atividade, então? “Se repetirmos a
experiência cem, ou mil, ou um milhão de vezes”, declarou o doutor
Vakoch à revista BBC Focus — Science & Technology, “acho que teremos
a chance real de uma resposta.”
Uma
técnica mais recente é a busca de tecnoassinaturas. Supertelescópios
rastreiam planetas fora do sistema solar em busca de sinais de
civilizações — megaestruturas construídas, contaminação atmosférica
criada por uma civilização industrial, possíveis sistemas de iluminação
artificial etc.
O
problema dessa busca é que ela procura por seres parecidos com os
terrestres. Estamos na primeira infância dessa busca e nossos parâmetros
ainda são limitados. Em nossa concepção, a vida se estrutura a partir
de uma base de carbono, água e oxigênio e depende de uma molécula de DNA
com registros genéticos.
A
série A Vida em Outros Planetas (em cartaz na Netflix) procura
especular como poderiam ser formas de vida em planetas hipotéticos. Um
dos planetas possui força de gravidade muito grande e atmosfera densa
demais. Outro tem metade muito quente e a outra metade gelada. Um
terceiro gira ao redor de duas estrelas, o que o torna extremamente
fértil. Os seres que os habitam são primitivos e vivem segundo a
conhecida regra do nascer/crescer/alimentar-se/reproduzir-se/morrer.
É
uma possibilidade baseada em nossas características terrestres, nossa
regras e nossos princípios. O monstro de Alien (“cientificamente”
conhecido como Xenomorph XX121) foi imaginado usando-se como modelo uma
espécie de vespa especialmente cruel em seus métodos de reprodução. Foi
mais uma forma de ver o universo com nossos olhos de terráqueos.
Ninguém
pode imaginar que as mesmas características serão encontradas numa
galáxia como a GN-211m, a 13 bilhões de anos-luz de distância. Quanto
mais sabemos, mais descobrimos nossas limitações. Somos seres frágeis
limitados por enquanto a um pequeno planeta ao redor de uma pequena
estrela na vasta amplidão da Via Láctea. Apenas uma entre 2 trilhões de
galáxias.
A
questão traz aspectos não só biológicos, mas também religiosos. Seria a
Criação da vida, retratada em tantas religiões, uniforme em todo o
universo? Mesmo para o materialista, essa dúvida pode levar muito tempo
para ser respondida. Ou talvez nunca seja.
Encontraremos
alienígenas hostis? Ou tão evoluídos que dispensam uma aparência
física? Irão nos encarar como alimento, assim como encaramos uma
galinha? Ou nos trarão conhecimentos aos quais não teríamos acesso sem a
ajuda deles? Já não teriam estado aqui, segundo os registros de mitos e
religiões da Antiguidade e certos documentos de impérios já extintos?
O
fato é que não sabemos praticamente nada. E o reconhecimento dessa
limitação pode ter um efeito positivo no amadurecimento de seres tão
cheios de certeza como os humanos.
Mais
do que uma resposta imediata, o importante agora é a busca em si. Essa
busca faz a humanidade parar de olhar fixamente para o próprio umbigo e
crescer para uma nova etapa de sua evolução. Reconhecer que não estamos
sós e que podemos não ser os mais evoluídos nos dá nova perspectiva.
Descobrimos que não somos o centro do Universo. Estamos saindo da
infância.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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