BLOG ORLANDO TAMBOSI
Imagem postada na conta de Instagram da Embaixada da China no Brasil mostra um panda de Papai Noel e um sorridente curupira à espera dos presentes. Leonardo Coutinho para a Gazeta do Povo:
A
imagem que ilustra esta coluna foi postada na conta de Instagram da
Embaixada da China no Brasil. Ela mostra um panda disfarçado de Papai
Noel e um sorridente curupira a espera dos presentes. Não há
representação melhor sobre a relação da China com o Brasil, a América
Latina e de certa forma o mundo.
O
fofíssimo panda está cheio de mimos. Regalos de todos os tamanhos e
gostos para fazer feliz quem está na lista daqueles que se comportaram
bem ao longo do interminável 2020.
O
curupira, diz a lenda, é a criatura de cabelo de fogo, que tem corpo de
criança e pés voltados para trás. Protetor da natureza e com fama de
malandro. Engana caçadores, mas cai facilmente em armadilhas como um
simples emaranhado de barbantes, que atrai a sua curiosidade e o desvia
de sua missão de defensor da mata.
Como pode-se constatar, para China, o Brasil é o curupira.
Metáfora
perfeita para uma elite política e empresarial imediatista. Que,
geralmente, por focar nos próprios pés acha que está caminhando para
frente, mas tem dados passos largos para trás.
Se
somos uma pátria de curupiras, não deveríamos nos esquecer que os nosso
passos não nos levam para onde parecem levar. Por isso, não podemos
deixar de olhar para frente. Bem para frente. Caso contrário, quando
notarmos estaremos à beira do abismo.
Seja
no Brasil, na Argentina, Peru ou México, a trampa é exatamente a mesma.
Dinheiro, negócios, facilidades, importação. Por meio da dependência,
Pequim cria as condições para a chantagem quando questionada em suas
práticas predatórias.
Recentemente,
o panda virou um dragão quando a Austrália vetou as redes 5G da Huawei
em seu território. Na Argentina, o ex-presidente Mauricio Macri aprendeu
da melhor forma como uma série de acordos mal costurados com os
chineses dinamitou a soberania do país. Yang Wanming, que atualmente é
embaixador da China no Brasil, mostrou os dentes para os argentinos
quando eles ousaram revisar os contratos de uma base de satélites
controlada pelo exército chinês em território argentino.
Os
curupiras brasileiros têm se revelado muito entretidos com os presentes
chineses. Tão distraídos que parecem não prestar atenção para a direção
que estão seguindo.
O
ano novo tem previsto o leilão das frequências de 5G. A chinesa Huawei
que foi barrada nos países mais sérios do planeta, tirou do saco a tese
de que, sem ela, os consumidores vão pagar mais caro pela tecnologia. A
tese ganhou eco entre os curupiras – que tentam de todas as maneiras
ignorar o que se conhece sobre os riscos relacionados ao sistema chinês –
e insistem a nos guiar para um cipoal do qual talvez jamais consigamos
sair.
Os
curupiras importaram milhões de doses de vacina antes mesmo de os
chineses conseguirem provar a sua eficácia. A torcida é para que o
imunizante funcione, mas a confiança cega nos chineses é um sintoma de
como funciona a sedução dos pandas. O caso é tão agudo que os órgãos
reguladores ficaram superados. Se a China aprova, por que deveríamos ter
um processo independente de aprovação?
Os pandas são gulosos. Comem. Comem. Comem.
O
território deles não é capaz de garantir segurança ou soberania
alimentar. A população chinesa é a maior e a mais dependente de comida
do planeta. Embora esta seja a sua maior fragilidade, a China tem
conseguido disfarçá-la como sendo a sua maior força.
A
China comprar estoques colossais de alimentos por mais pura
dependência. Mas manipula preços de mercados para virar a mesa e
transformar a abundância dos fornecedores em sua própria armadilha.
Quase todo mundo pensa que depende da China porque ela absorve as
maiores quantidades de alimentos oferecidos pelo agronegócios, seja no
Brasil ou na Argentina. E a China faz isso porque soa melhor. Sabe que
do lado de cá do planeta, todo mundo mira o presente. Ou como sugere o
cartão de Natal, os curupiras do Ocidente são incapazes de olhar além
dos próprios pezinhos invertidos.
A
fome dos pandas os tem obrigado a invadir águas territoriais de
diversos países. Pilham os oceanos com sua pesca predatória. Avançam
justamente sobre aqueles países que pouco fazem além de reclamar
baixinho nos jornais. O endividado Equador tem assistido passivamente a
destruição dos estoques pesqueiros nos arredores de Galápagos.
Chile
e Peru idem. Os navios pesqueiros chineses circundam seus limites
territoriais, tirando do mar os recursos naturais que são uma das
principais fontes de renda desses países e uma das mais importantes
fontes de proteína.
Nesta
semana, o site Defesanet chamou a atenção para o que pode ser o ponto
de partida para o mais brutal avanço sobre os estoques pesqueiros da
costa brasileira. Eles querem convencer os gaúchos a montar um
entreposto para um frota de pesca de arrasto de pelo menos 400
embarcações. Algo sem paralelo na região.
A
quantidade de peixes pescados na costa brasileira é uma incógnita. A
falta de dados oficiais, entretanto, não impede de perceber que algumas
espécies já sofrem com a sobrepesca. Os pescadores de sardinha viram os
estoque minguar na última década.
Os
chineses querem capturar com suas redes 500 toneladas diárias de
pescado para exportação. Embora os números sejam colossais em si, eles
nem de longe representem o problema real que seria a abertura das águas
brasileiras para a mais devastadora e destrutiva das práticas de pesca,
que a China não tem o menor pudor de esconder.
Os
pandas oferecem um monte de facilidades. Mas quando chegar a hora de os
curupiras reclamarem terão que conversar com o dragão.
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