A Casa da Moeda é uma fábrica de dinheiro e não decide política monetária. Essa é a conclusão de economistas consultados pela Agência Brasil,
que identificam como um erro o temor de que a privatização da empresa
fabricante de notas do Real e de passaportes traga risco de fraudes.
Uma das opiniões é da professora de Economia do Instituto de
Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (Coppead) da Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Margarida Gutierrez, para quem existe uma
interpretação equivocada entre produzir dinheiro e determinar a
quantidade a ser emitida.
“As pessoas confundem o que é Banco Central e o que é Casa da Moeda.
Casa da Moeda é uma fábrica que emite o que o Banco Central manda. Isso
vale para qualquer Banco Central do mundo”, disse. “O controle disso não
passa pelo capital da empresa, se é um capital estatal ou privado. O
fato de ser pública significa que os governos podem mandar emitir moeda?
Não”.
Para o professor do programa de MBAs da Fundação Getulio Vargas
(FGV), Mauro Rochlin, o risco de ocorrer fraude seria o mesmo se a
empresa fosse estatal, mas ele ponderou que caberá ao governo manter a
vigilância.
“Sendo o setor privado o produtor, obviamente que o cliente, no caso o
estado brasileiro, terá que exigir uma série de garantias de que a
operação vai ser absolutamente segura”, disse, completando que é o Banco
Central quem decide a quantidade de dinheiro a ser fabricada. “Quem faz
política monetária é o Banco Central”.
Contas públicas
Na visão da professora Margarida Gutierrez, a privatização da Casa da
Moeda não deve ser vista como forma de equilibrar as contas públicas e
para suprir uma necessidade de caixa do governo, mas sim pelo lado da
eficiência.
“A separação entre o Estado e as suas empresas públicas no Brasil não
existe. Os estados e os governos usam as suas empresas para fazer o que
querem. Então, acabam sendo empresas, mal gerenciadas, que não
perseguem metas, que não buscam eficiência e isso se traduz para a
sociedade em serviços de pior qualidade e preços mais altos”, disse.
Segundo ela, na hora de definir o contrato o governo terá que incluir
o tipo de controle que fará na sua relação com o fornecedor, que
poderia ser uma gráfica estrangeira, como americanas e britânicas, que
já atendem a outros países nas demandas por moedas. “A gente está
falando de uma mercadoria apenas e o fornecedor tem que garantir ao
governo as condições que ele exigir”, afirmou.
Mauro Rochlin contou que os países que não têm Casa da Moeda
contratam o fornecedor após uma licitação internacional. Várias gráficas
que produzem papel moeda, selos, passaportes e documentos se candidatam
para oferecer o serviço. “O edital estabelece certas exigências de
controle, de monitoramento, de qualidade, de reserva e os países definem
os seus fornecedores”, afirmou, avaliando, que, mesmo na emissão dos
passaportes brasileiros, que, atualmente, são produzidos pela Casa da
Moeda, não haveria riscos de fraudes.
Apontando uma situação extrema, o professor lembrou que, mesmo não
sendo sede de uma empresa privada que fornecia moeda para o governo
britânico, a Alemanha nazista procurou falsificar a moeda inglesa
durante a Segunda Guerra Mundial. “Ainda assim, por uma questão bélica, a
Alemanha buscou imprimir e despejar moeda inglesa no mercado e, dessa
maneira, sabotar a economia inglesa”, informou.
O professor de Economia e Finanças do Instituto Brasileiro de Mercado
de Capitais (Ibmec), no Rio de Janeiro, Ricardo Macedo, afirmou que, em
alguns países da América Latina, o dinheiro também é produzido por uma
empresa privada. Nos Estados Unidos, a fabricação de dinheiro em papel e
das moedas é em empresas diferentes, embora a de moedas metálicas seja
pública. ” Hoje, com tecnologias que se tem podemos criar mecanismos que
evitam a falsificação com códigos garantidos pelo Banco Central”,
opinou.
Macedo disse que, nas grandes economias em que o sistema é privado,
não se tem notícia de problemas. “Nos Estados Unidos, o sistema é misto.
A emissão do papel moeda é terceirizada, agora, da moeda metálica, não.
Quem faz é o Banco Central”, contou. “Isso é para ter um certo controle
de custos. O Banco Central americano tem muita reserva em ouro e prata e
pode utilizar aquilo ali para cunhar moeda metálica. O papel moeda gera
um custo adicional que não é interessante manter”.
O professor de Economia e Finanças disse que, no caso da Casa da
Moeda, ainda tem outro fator a se considerar: a mudança de hábitos do
brasileiro, que, atualmente, usa muito os cartões de crédito e de
débito, o chamado dinheiro de plástico, para fazer pagamentos.
“Praticamente hoje ninguém demanda papel moeda. As transações são
quase todas feias por meio eletrônico no cartão de débito que faz as
transferências automáticas. O movimento de utilização de notas vem
caindo ao longo do tempo. Dado este cenário, o governo acredita que
seria interessante terceirizar a emissão de moedas”, destacou. “Manter
uma estrutura cada vez mais caindo em desuso é jogar dinheiro fora”,
assegurou.
Pacote
Na visão do professor Mauro Rochlin, os 57 projetos de concessões e
privatizações anunciados pelo governo, na quarta-feira (23), ainda
significam um conjunto de intenções diante da falta de detalhamento mais
profundo de como vai ocorrer o processo. Como tudo isso leva tempo para
ser feito, os retornos econômicos não serão imediatos.
“Esse pacote não vai ter o menor impacto no resultado primário do
governo, nem para este ano nem para o ano que vem”, afirmou, ressalvando
que os leilões de petróleo previstos para este ano podem dar retorno ao
governo ainda em 2017.
Já o professor Ricardo Macedo acrescentou que também terá que ser
considerado o peso de cada uma das desestatizações, o que será
determinante, segundo ele, além do peso político para impor uma rapidez
ao pacote do governo. “Dependendo do peso que cada um tem e do peso
político, a privatização pode correr mais ou menos demorada”.
Modelagens
Os especialistas chamaram atenção também para as modelagens das
privatizações do pacote anunciado pelo governo. Mauro Rochlin destacou
que o governo Dilma Rousseff foi mal-sucedido nas ofertas de trechos de
rodovias, por meio de licitações que não tiveram interessados. “As
condições do edital, na visão do mercado, foram tão draconianas que não
despertaram interesse do setor privado. A modelagem é fundamental”.
Antes de tudo, o governo precisa avaliar se é interessante,
economicamente para o país manter uma empresa produtora de papel moeda
ou adquirir de terceiros por um custo menor. Também é necessário definir
a modelagem da privatização e decidir se a Casa da Moeda ainda
permaneceria com alguma função ligada ao governo federal. Isso deve ser
explicitado nas exigências do edital da licitação.
“Vai ser totalmente terceirizado, vai ser um modelo misto ou não vai
conseguir privatizar porque o interessado acha que não vai valer a pena e
continuará na mão do governo. É uma coisa para esperar para ver como
vai ser este modelo”, destacou Macedo.
A professora Margarida Gutierrez considera que a privatização da Casa
da Moeda vai atrair investidores, mas a quantidade de interessados vai
depender da modelagem para a venda. “Sempre o capital privado tem
interesse em negócios desde que sinta que para ele é favorável. Ninguém
vai querer entrar em uma furada, então, depende de como vai fazer o
contrato, quais são as regras que tem que ser cumpridas e o aporte de
capital”, finalizou.
Agência Brasil
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