MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Pequenas e resistentes, locadoras se viram para manter lojas funcionando


Não precisa ser muito velho para se lembrar do tempo em que as filas nas videolocadoras formavam caracóis em finais de semana. Hoje, poucas sobreviveram, bem menores e a duras penas
Priscila Chammas (priscila.chammas@redebahia.com.br)
CORREIO 24 HORAS

O aviso: “Vendemos filmes eróticos”  na entrada da Vídeo e Cia, no Largo 2 de Julho, é um indicativo da ginástica que o dono, José Jonas Soares, tem feito para manter o interesse dos clientes pela locadora. A placa desesperada é uma tentativa de atrair mais consumidores, em plena época da Sky, Netflix (veja abaixo), pirataria e outros dificultadores deste tipo de negócio. “A gente também investe nos clássicos, temos todos os filmes do vestibular. Para agregar, ainda vendemos produtos de informática”, conta o empresário, que tem a loja há 20 anos.
Ele recorda que há não muito tempo, a situação era bem diferente. “Entre 2006 e 2009, no início da era do DVD, foi o auge do meu negócio. Eu conseguia 5  mil locações por mês. Hoje são 1,5 mil”, queixa-se.
Octávio Augusto tem 43 anos e frequenta a Vídeo e Cia, ao lado de sua casa, desde que a loja abriu, há 20 anos. Só que agora, de vez em quando ele trai o amigo e vê filmes na NET
(Foto: Amana Dultra)
A estimativa da Associação Brasileira dos Produtores de Discos (ABPD) também não é animadora. Ela mostra que houve redução de  10,04% nas vendas de DVDs e Blu-Rays do atacado ao varejo musical entre 2012 e 2013. Este é o dado mais recente disponível sobre o assunto.
Para não perder cliente, José Jonas conta que faz qualquer negócio. “Não tem mais isso de pegar o filme para devolver no outro dia. É tudo 48 horas. E se o cliente quiser ficar mais, a gente sempre deixa. ‘Quer ficar a semana toda? O mês inteiro? Pode levar’”, exagera.
Entre os clientes que sobraram, ele identifica um público mais velho, de mais de 40 anos, pouco afeito às novas tecnologias, morador da vizinhança e frequentador há muitos anos. “São aqueles clientes fiéis, que nunca deixaram de vir aqui”.
Um deles é o administrador Octávio Augusto Drummond, de 43 anos. Ele conta que viu a locadora nascer e, de tanto ir lá, acabou criando uma relação de amizade com o dono. Mesmo assim, diminuiu bastante a quantidade de filmes locados. “Hoje pego de oito a dez por mês, mas já teve época de pegar mais de 100”, lembra. Os seus preferidos são os de suspense e ficção, mas confessa que de vez em quando "trai" o amigo e acaba assistindo pela Net.
“Hoje não existe mais a ‘janela de respeito’, que era o tempo que as TVs esperavam depois que os filmes chegavam na locadora. Hoje já sai no cinema, locadora, televisão, tudo ao mesmo tempo”, reclama José Jonas, o dono da locadora.
Vídeo Hobby  
A obsolência das locadoras atingiu até a mais tradicional delas. Outrora dono das 13 lojas da Vídeo Hobby em Salvador, o agora administrador Guy Ferreira Júnior acabou desistindo do negócio. “A concorrência era muito pesada, a estrutura cara. A pirataria é o grande câncer do mercado”, lamenta ele, que após ver seu negócio minguar, deu as três últimas a ex-funcionários, a título de rescisões trabalhistas.
Hoje, a rede que já esteve presente na cidade inteira, com grandes e suntuosas lojas, empregando 150 funcionários, possui apenas três, bem menores e sem funcionários. Na época áurea, eram 2 mil filmes locados por dia. “Hoje, juntando as três, não dá 200” estima Guy. Ele entregou os pontos após 30 anos de fundação da rede de locadoras.
José Jonas é dono de uma locadora no 2 de Julho e diversifica o negócio para sobreviver no mercado(Foto: Amana Dultra)
Uma das três que restaram é a da Sabino Silva, herdada pela ex-gerente Ana Paula Dias. “Quando eu digo que tenho uma locadora, o pessoal fala: ‘e ainda existe isso?’”, ri. Mas ela garante que o negócio não vai tão mal assim. “É claro que não é mais a mesma coisa, mas continua tendo clientes sim”, defende.  Há 18 anos no ramo, ela se recorda das filas que se formavam na loja nos finais de semana. “Em dia de lançamento a fila formava caracóis”.
Hoje o movimento é bem menor, mas ela calcula atender cerca de 650 clientes por mês, e fazer 2,4 mil locações. “Não sei se é porque praticamente só sobrou a gente, mas dá para se manter”, diz a empresária, que se orgulha de atender clientes VIPs de vez em quando, como o ator Wagner Moura. “Ele só pega filme ‘cult’", diverte-se.
Ela também tem uma loja de roupas de ginástica e diz que lá a situação é bem pior. Para incrementar a locadora, a empresária planeja montar um café e uma revistaria dentro da loja, como já chegou a existir na Manoel Dias. “Era difícil disputar com a Saraiva, Cultura... a gente revendia os livros dessas lojas e não tinha como cobrar mais barato”, lembra Guy. A Vídeo Hobby da avenida tinha revistaria, livraria e até uma Subway, mas acabou fechando. Além da loja da Sabino Silva, ainda restaram as da Graça e da Pituba.
A concorrência:  downloads, Netflix e TV a cabo
Um dos grandes concorrentes das resistentes videolocadoras é a Netflix. Ela funciona assim:  você paga um valor fixo por mês (atualmente R$ 16,90) e pode assistir quantos filmes e séries quiser. Assim como nos DVDs, o assinante pode pausar, voltar e adiantar o vídeo quando quiser e em qualquer lugar, bastando ter um computado, tablet ou até smartphone conectado à internet.
Te pareceu interessante? Outras 44 milhões de pessoas em todo o mundo também acham. Este é o número atual de clientes da Netflix. Se você quiser conferir, pode acessar o site www.netflix.com e se cadastrar. As TVs por assinatura também foram responsáveis pela derrocada dos DVDs.
NET, SKY, Oi TV e tantas outras oferecem canais de filmes em seus pacotes e, nos casos dos lançamentos, costumam cobrar um valor extra por sua exibição. Os valores variam de empresa para empresa, mas na SKY, por exemplo, o aluguel do filme custa R$ 9,90.
“É mais vantagem alugar aqui comigo. Lançamento custa R$ 6 e os de catálogo, R$ 4, diz José Jonas, da Vídeo e Cia, defendendo seu peixe. Mas para quem não quer pagar nada, é possível baixar filmes pela internet gratuitamente.
A prática é ilegal, pois fere a lei de direitos autorais, por isso, não espere que o CORREIO te indique onde fazer isso. Tanto que a lista de sites de download fechados ou investigados ao redor do mundo não para de crescer. Teve o Megaupload, o Uploaded, o VideoZer, o 4shared, o MediaFire, o Torrente org e dezenas de outros com nomes tão estranhos quanto.
Outra prática completamente ilegal é a de vender ou comprar DVDs piratas. “Esse é o maior câncer do mercado”, queixa-se Guy Ferreira Júnior, o ex-dono da Vídeo Hobby. Isso porque quem pratica o comércio ilegal, além de nao pagar os direitos autorais, sonega uma série de impostos que são pagos pelo empresário legalizado.
Loja de CDs nos Barris aposta em artistas que estão fora da mídia
Se está difícil para as locadoras de filmes, calcule para uma loja de CDs. Dono da Pérola Negra há 13 anos, o ex-bancário Roberto Sampaio mantém a loja aberta aos trancos e barrancos. Recentemente se mudou do Canela para os Barris por não poder pagar o alto valor do aluguel. “Não é fácil manter um ponto cultural”, reclama.  Mas ele vai se mantendo.
Como estratégia, investe num segmento específico. “O que eu vendo aqui, você não encontra em outros locais”, gaba-se. Roberto aposta em artistas que estão fora da grande mídia, e cujos CDs não estão facilmente à venda. O público dele é específico. “É um público que quer pegar o CD físico, ler o encarte, acompanhar a letra. O consumo é diferente. São pessoas com mais de 40 anos”, compara.
Roberto Sampaio vende discos e CDS para um público bem específico(Foto: Robson Mendes)
O CD mais vendido na Pérola Negra é o de Mariene de Castro, mas ele também aposta nos clássicos como Maria Bethânia e Caetano Veloso, além de camisetas e discos de vinil. Segundo o gestor do Projeto Comércio Sebrae Bahia, Fabrício Barreto, investir em um nicho específico é uma boa estratégia para sobreviver neste mercado de negócios considerados obsoletos.  
“Se a pessoa tem uma locadora, ela pode investir em catálogos, em filmes antigos, que não são baixados facilmente na internet. O cliente vai procurar por ‘E o Vento Levou’, e vai ter lá. Isso cria uma afinidade com o estabelecimento”, aconselha o especialista. E alguém imaginaria hoje em dia que uma lan house seria um bom negócio? “Pode ser. Basta que seja instalada num bairro onde as pessoas não tenham um acesso tão fácil à internet. Você pode analisar o público alvo e descobrir que em Cajazeiras existe esse mercado. E aí você monta a lan house lá e dá certo”.
Fabrício também cita a estratégia utilizada por José Jonas, o dono da Vídeo e Cia, de diversificar o negócio e vender outros produtos em sua loja. “Neste caso, a identidade do negócio foi estabelecida através da videolocadora, mas ele cria oportunidades para aproveitar o tempo que o cliente está lá dentro. E existem também os serviços agregados”, acrescenta, se referindo a serviços que complementem o  negócio em si, como, por exemplo, ter um café numa livraria ou revistaria.
Mas como até a criatividade tem limites, existem negócios que realmente já morreram, independente do que você faça. “Não sei de nenhum curso de datilografia que ainda dê certo”, brinca Fabrício

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