O Brasil entra nesse contexto como ator periférico, diminuído até mesmo no contexto do BRICS. Guilherme Macalossi para a Gazeta do Povo:
A
China mostrou, com inequívoca autoridade, quem é que manda no BRICS. A
reunião do grupo, ocorrida em Joanesburgo, na África do Sul, serviu para
anunciar sua ampliação, com a adesão de Argentina, Irã, Arábia Saudita,
Emirados Árabes Unidos, Egito e Etiópia. Se fez a vontade de Xi
Jingping, que comemorou o resultado num comunicado para a imprensa.
Antes disso ele já havia declarado que o bloco compartilhava de “amplo
consenso e objetivos comuns”. Pela sua nova formatação, que passa a
valer a partir de 1° de janeiro, fica evidente que se busca construir
uma frente contra os Estados Unidos e a Europa, tendo Pequim como centro
político.
Em
entrevista para a BBC News Brasil, o economista britânico Jim O’Neill
se mostrou cético em relação aos critérios usados para a entrada de
novos membros. Foi O’Neill, em 2001 que cunhou a sigla BRIC, num
relatório que produziu para o Goldman Sachs. Na época, a análise que fez
projetava vocações e potenciais econômicos semelhantes aos países que
designou. A formalização do bloco veio depois. Agora ela se mostra
crítico: “Não me parece que haja nenhum critério objetivo usado para
determinar quais países seriam convidados a aderir”. Ele também aponta
para o simbolismo da ampliação: “Continuo sem saber o que os BRICS
pretendem alcançar, além de um simbolismo poderoso. Isso fica óbvio com a
escolha do Irã, por exemplo. Diria que pode até tornar as coisas mais
difíceis”.
O
simbolismo a que se refere O’Neill é menos em relação a qualquer
objetivo econômico (ainda que exista) e mais no campo geopolítico. O
novo BRICS é talvez a melhor expressão do que vem sendo designado como
“Sul Global”, o conjunto de países que outrora foi chamado de “Terceiro
Mundo”. O que parece unir esse bloco reformado é a contestação à ordem
internacional surgida após a II Guerra Mundial. Alegam que as
instituições construídas desde então já não representam a realidade
global, descrita hoje como “multipolar”. O discurso entretanto, é
explicitamente instrumentalizado para pregar o antiamericanismo e atacar
os valores da sociedade aberta bem como a herança do predomínio
cultural do Ocidente.
À
exceção da Argentina, que tem sérios problemas políticos e econômicos,
os novos integrantes do BRICS são regimes tirânicos onde não há qualquer
respeito pelos direitos humanos básicos. O Irã, citado por O’Neill, é
acusado inclusive de financiar o terrorismo, municiando grupos que atuam
por todo o Oriente Médio, com foco na região de Israel.
O
Brasil entra nesse contexto como ator periférico, diminuído até mesmo
no contexto do BRICS. Além do ingresso da Argentina (e não se sabe nem
mesmo se isso se concretizará, já que depende do rumo do país nas
próximas eleições), a diplomacia lulopetista só conseguiu uma genérica
promessa de apoio ao Brasil numa eventual reforma do Conselho de
Segurança da ONU. Não é a primeira vez, alias, que isso acontece. Em
2004, durante o primeiro mandato de Lula, o Brasil já havia reconhecido a
China como economia de mercado, exatamente pra alcançar o mesmo
objetivo de agora.
A
China pretendia ampliar o BRICS para ampliar também sua própria esfera
de influência. E conseguiu. Com a pulverização do grupo, cresce a sombra
de Pequim sobre os demais membros, cujos interesses acabam diluídos. O
bloco parece ilustrar bem a divisão do mundo que vai ganhando contornos
cada vez mais expressivos, como já assinalou Joe Biden, atual presidente
dos Estados Unidos: de um lado as democracias liberais, e de outro as
autocracias. O Brasil escolheu seu lado, em troca de migalhas.
Postado há 1 week ago por Orlando Tambosi

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