BLOG ORLANDO TAMBOSI
Algum
eleitorado já exigiu mais de seus líderes do que os americanos
modernos? Este pensamento me ocorreu ao escutar um grupo de pessoas dos
Estados de Geórgia, Ohio e Pensilvânia, todas com nível universitário e
menos de 30 anos, opinando a respeito do presidente Joe Biden esta semana. Não foi nada bonito.
“A
covid nunca esteve pior, e o governo não está fazendo basicamente nada a
respeito”, afirmou Lydia, da Filadélfia. “Não estamos nem usando as
coisas boas de Donald Trump, se é que há alguma”, afirmou Desiree, de
Atlanta. “Não sei que tipo de poderes Biden tem”, observou Sara, também
da Geórgia, “mas sinto que ele deveria estar fazendo muito mais”.
Questionado
a respeito da nota que daria ao presidente, o grupo, que se reuniu
remotamente e foi organizado por Sarah Longwell, uma ativista
conservadora, deu a ele notas C, D e um F. E não se tratava de um
público hostil. Todos os integrantes do grupo votaram em Biden e nenhum
se arrependeu. De fato, se questionados a respeito do possível apoio a
Biden em 2024, todos provavelmente responderiam que sim, entre sinais de
desalento.
Com
amigos assim, poderia perguntar Biden, que precisa de uma multidão de
eleitores convencidos de que ele não passa de um socialista senil e
fraudador de eleições? De qualquer maneira, ele tem esses amigos. Depois
de um ano ouvindo de conservadores fanfarrões que o presidente sofre de
demência, a maioria dos republicanos acredita que isso é verdade.
Juntos, esses democratas desencantados e os eleitores iludidos de Trump
tornaram Biden quase o presidente mais impopular desde que os registros
do índice começaram. Meros 42% dos americanos aprovam seus esforços.
Somente Trump, com 39% de aprovação no mesmo ponto do mandato, teve
avaliação pior.
Para
explicar esse desastre, a maioria dos comentaristas tem colocado o foco
sobre as fraquezas de Biden. Prolixo e dado a cometer erros, ao mesmo
tempo cauteloso e instável demais, o presidente de 79 anos raramente
empolgou os corações democratas, mesmo antes de envelhecer, como fez
notavelmente nos anos recentes. A modéstia de seus talentos era tão
óbvia na campanha que parecia quase um perverso apelo publicitário —
apoiando a evidência de sua promessa de restabelecer normalidade e
moderação no governo. Mas, com seu antecessor fora do jogo, agora essa
promessa parece menos atraente. E os americanos encontram-se conduzidos
em meio a períodos turbulentos pelo presidente menos carismático e menos
capaz politicamente desde George H. W. Bush.
Contudo,
apesar da tentação de sempre de criticar o político, os percalços de
Biden são uma razão apenas marginal para explicar sua impopularidade. O
principal motivo é a desalentadora realidade de que metade do eleitorado
já estava contra ele de antemão. Este fenômeno é relativamente novo.
Trump foi o primeiro presidente moderno a não ser apoiado por uma
significativa minoria dos apoiadores de seu oponente no início do
primeiro mandato.
Em
contraste, o fato de que Biden iniciou o mandato com um índice de
aprovação dois pontos porcentuais mais alto do que sua fatia de votos
populares teve um sabor de conquista. Mas críticas implacáveis e
desinformações da direita logo reverteram essa situação. De acordo com
um modelo usado pela Economist, que correlaciona índices históricos de
aprovação presidencial com medidas de partidarismo, um presidente
genérico poderia esperar um índice de aprovação de 46% nesta altura do
primeiro mandato.
O
ressurgimento da covid-19 e os consequentes obstáculos econômicos
tornaram esse escorregão ainda mais inevitável. A despeito do vigor
econômico geral, um modelo alternativo de pesquisa, que correlaciona
aprovação presidencial com inflação e desemprego, também coloca a
aprovação do presidente genérico em 46%. O fato de os índices de Biden
estarem abaixo do que os modelos preveem deve-se provavelmente em grande
parte ao próprio vírus.
Apesar
da maioria dos participantes do grupo de foco entender que Biden tem
poder limitado para reprimir a multidão antimáscaras e antivacinas que
exacerba a luta dos EUA contra a covid, a maioria o culpou por não fazer
isso de alguma maneira. “Se não há alguém no comando, então não há
nenhum controle”, afirmou um participante.
Esta análise não ignora os erros de Biden. O fiasco no Afeganistão,
que ajudou a impulsionar sua derrocada, foi gritante. O governo chamou
pouca atenção para sua conquista em forçar a aprovação de seu pacote
trilionário de infraestrutura e superestimou sua capacidade de aprovar
adicionalmente gastos sociais e ambientais.
O
governo Biden também permitiu que aquele pacote fosse definido por seu
custo, não pelo seu conteúdo, e por fim se atrapalhou para conseguir a
aprovação do imprevisível senador Joe Manchin. Ainda assim, a
probabilidade de um presidente mais inspirador, que não cometesse nenhum
desses erros, ser quase tão impopular quanto Biden sugere que a
importância dos presidentes tem sido exagerada.
Disso
decorre que a capacidade de Biden se recuperar é limitada, não obstante
uma modesta melhora em seus mais recentes esforços. Ele proferiu alguns
bons discursos, incluindo um cuidadoso e habilidoso ataque contra seu
antecessor no aniversário da insurreição no Capitólio e algumas
declarações a respeito de recuperação econômica que se referiram de
maneira sensata aos aumentos nos preços. Contudo, as esperanças do
governo de reconquistar o apoio de seus eleitores desencantados — os
únicos que Biden ainda seria capaz de convencer — parecem ingênuas.
Esses
democratas descontentes tendem a ser relativamente jovens, pouco
engajados e a não consumir notícias dos principais meios de comunicação.
Somente um dos membros do grupo de foco assiste noticiários de canais
de TV a cabo; o restante consome notícias por redes sociais, onde os
discursos do presidente têm tido pouca repercussão. Adicionalmente,
alguns membros do grupo exibiram uma visão tão exagerada a respeito do
poder presidencial que a modesta expressão de empatia de Biden e sua
admissão implícita de fracasso em conter a inflação pareceram projetadas
para decepcioná-los.
A única alternativa é o fracasso
Esta
é outra nova maneira de criar condições para o fracasso dos
presidentes. Em reposta a coberturas de imprensa enganosas e ao impasse
no Congresso, muitos eleitores, especialmente de esquerda, passaram a
imaginar que o presidente possui “poderes de Super-Homem” — ao mesmo
tempo fantásticos e inexistentes — afirma Jeremi Suri, que estuda a
presidência. Assombrado por tamanhas expectativas, fica cada vez mais
difícil imaginar qualquer mortal triunfando no cargo, muito menos Biden,
que tem seus defeitos. Mesmo se a inflação e o vírus retrocederem muito
mais rapidamente do que o esperado, a probabilidade de seu partido
levar uma surra nas eleições de meio de mandato parece alta. (Estadão).
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