BLOG ORLANDO TAMBOSI
Até onde vai a fúria censora e a surpreendente luta contra a liberdade de expressão empreendida pela imprensa? Artigo de John Tierney, editor do City Journal e colunista de ciência no NYT, via Gazeta do Povo:
Depois
do tumultuado verão de 1968, jornalistas, políticos e sociólogos
gastaram palavras e dólares tentando encontrar e solucionar o problema
fundamental que deu origem às manifestações raciais. Eles não
conseguiram, mas com o tempo uma solução apareceu. O problema
fundamental dos tumultos eram os baderneiros. A paz voltou às ruas
depois que a polícia passou a adotar novas táticas de controle e depois
que os procuradores investiram contra os marginais. A violência passou a
ser considerada não uma característica da sociedade norte-americana, e
sim um fracasso da polícia.
Ano
passado, quando a política foi alvo de ataques por tentar controlar a
violência dos antifas e do grupo Black Livres Matter, essa lição foi
esquecida. Os jornalistas condenaram o gás lacrimogêneo e as prisões,
defendendo que se resolvesse o “racismo sistêmico” supostamente
responsável pela desordem. Depois da invasão do capítulo, em 6 de
janeiro, algumas citaram a incapacidade da população de evitar a
balbúrdia, mas novamente os jornalistas progressistas tinham outro foco.
Eles haviam identificado a nova fonte da violência: a liberdade de
expressão.
Eles
celebraram o expurgo de conservadores e pediram mais censura à
“retórica violenta” e à “desinformação”. É uma estratégia incrivelmente
destrutiva para uma profissão que depende da liberdade de expressão, mas
os jornalistas que hoje dominam as redações não pensam no longo prazo —
e não se imaginam censores. A tradicional devoção progressista à
Primeira Emenda parece irremediavelmente antiquada aos jovens
progressistas convictos de que estão do lado certo da história.
Em
2019, quando escrevi sobre a nova antipatia que os jornalistas nutriam
pela liberdade de expressão, já tinha achado ruim o fato de eles terem
como alvo rivais dentro da profissão ao anunciarem boicotes e campanhas
difamatórias que levaram jornalistas conservadores a serem demitidos e
banidos das redes sociais. Desde a invasão do Capitólio, contudo, eles
foram além da “desplataformização” dos hereges. Agora eles querem
eliminar as plataformas em si.
Não
bastava banir Donald Trump do Facebook e do Twitter se ele e seus
seguidores podiam migrar para o Parler — então o Parler tinha que ser
derrubado também. As Big Tech cederam à pressão da imprensa e de seus
aliados democratas no Congresso. (O Google e a Apple retiraram o Parler
das lojas de aplicativos e a Amazon tirou a rede social do ar). Essa
supressão inédita da liberdade de expressão foi denunciada por
publicações conservadoras e libertárias como o Wall Street Journal e o
Reason, e por uns poucos jornalistas independentes como Glenn Greenwald,
mas faltou a solidariedade contra a censura geralmente vista entre os
jornalistas.
O
Washington Post publicou em editorial que “o Parler merece ser
derrubado”. O Guardian pediu ainda mais censura por meio de uma
regulamentação federal que restringiria “danos virtuais”, promovendo
“valores sociais como a verdade”. Na MSNBC e CNN, analistas pediam mais
ação do governo — uma espécie de nova Comissão 9/11 para investigar a
invasão do Capitólio — e mais censura empresarial.
O
repórter Oliver Darcy, da CNN, pediu que empresas de telecomunicação
como a AT&T, Verizon e Comcast deixassem de servir de plataforma
para a disseminação de “mentiras” e “teorias da conspiração” por parte
de canais conservadores como Fox News, Newsmax e One America News
Network. No programa Reliable Sources, também da CNN, Brian Stelter
mencionou medidas adicionais a serem tomadas para “conter a crise de
informação”. Sem objetar, ele propôs uma solução citada por ex-executivo
do Facebook: “Temos de tirar a capacidade dos influenciadores
conservadores de alcançar grandes plateias”.
Uns
poucos jornalistas consagrados expressaram reservas quanto à derrubada
do Parler — o Los Angeles Times disse que a medida era “problemática”,
embora “compreensível” — mas a maioria não se deu ao trabalho de assumir
uma posição. A omissão deles foi observada pela fictícia Titania
McGrath, a personagem satírica criada pelo humorista inglês Andrew
Doyle. “Se você não gosta de nossas regras, crie sua própria
plataforma”, tuitou ela. “Depois, quando a derrubarmos, basta criar
outra. Depois que derrubarmos essa também, mas criar seu próprio
oligopólio. Realmente não entendo a dificuldade”.
No
curto prazo, o silêncio dos veículos conservadores beneficia
jornalistas consagrados da mesma forma que a derrubada do Parler
beneficia o Facebook e o Twitter: eliminando a concorrência. Mas o zelo
censor não é apenas cinismo. Os jornalistas progressistas vivem numa
bolha ideológica há tanto tempo que eles acabam por acreditar na
gravidade da “ameaça direitista” — e eles ignoraram a hipocrisia clara.
Eles
fingiram que as manifestações violentas que eclodiram em todo os
Estados Unidos ano passado foram “protestos pacíficos”, enquanto a
invasão do Capitólio foi uma “insurreição histórica” e uma “tentativa de
golpe” que “pôs a democracia em perigo”. O simbolismo transformou a
invasão do Capitólio num espetáculo horrível na televisão, mas os danos
materiais e a perda de vidas foram muito menores do que os dos protestos
violentos do ano passado, que contabilizaram ao menos 15 mortes e mais
de US$2 bilhões em prejuízo.
Sim,
a multidão que invadiu o Capitólio foi inflada por meio de mentiras e
teorias conspiratórias sobre fraudes eleitorais, e alguns dos
organizadores usaram as redes sociais — não só o Parler, mas também o
Facebook e o Twitter — para motivar os manifestantes. Não por acaso, Joe
Biden e outros democratas estão chamando isso de “A Grande Mentira”,
prometendo lutar contra o “terrorismo doméstico” por meio de novas
restrições às redes sociais. Os políticos sempre querem ter mais poder.
Mas
por que qualquer jornalista sensato lhes daria apoio? A liberdade da
profissão depende da Primeira Emenda, que lhes permite publicarem
informações por mais equivocadas que sejam, e em decisões da Suprema
Corte que protegem até aqueles que fazem apologia da violência. Foi essa
liberdade que permitiu aos jornalistas passarem dois anos defendendo
uma teoria da conspiração sobre um conluio com a Rússia, mentira que
causou muito mais danos ao governo federal do que a invasão do
Capitólio. Eles estimularam as manifestações do ano passado convencendo o
público, apesar das provas em contrário, de que os negros estavam sendo
mortos a taxas desproporcionais por policiais brancos.
Os
defensores dessas mentiras supõem que não serão vítimas de censura
enquanto os democratas dominarem Washington e o Vale do Silício, mas os
precedentes darão aos republicanos motivo para revanche quando voltarem
ao poder. O resultado será a censura bipartidária. É bem melhor deixar
que a polícia e os tribunais lidem com os desordeiros — e que os
norte-americanos permaneçam livres para dizer o que bem entendem.
John Tierney é editor do City Journal e colunista de ciência no New York Times.
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