Flávio Quintela, dos EUA, para a Gazeta do Povo:
Tenho de interromper minha sequência de opiniões sobre os candidatos
para abordar um assunto que pede atenção imediata. Semana que vem
voltarei com as análises dos presidenciáveis, prezado leitor.
A esquerda, aquela mesma que passou 50 anos dominando o cenário
cultural brasileiro, fez um estrago maior que muitos de nós
imaginávamos. E por que digo isso nesse momento em que o foco do Brasil
está nas eleições? Porque a manifestação desse enorme estrago está sendo
vista justamente no processo de militância política para as eleições em
questão.
Cinco décadas atrás, no Brasil ou em qualquer outra nação ocidental,
não existiam “jovens” de 25 ou 30 anos de idade. A grande maioria dos
homens e mulheres, quando chegava aos 25, já estava casada e com filhos;
ou seja, já tinha deixado a casa dos pais e formado um novo núcleo
familiar, acontecimento que costuma marcar o fim da transição da
juventude para a idade adulta plena. Sob a forte influência de diversas
agendas da esquerda, foi posto em prática um processo de engenharia
social. Uma quantidade cada vez maior de mulheres entrou no mercado de
trabalho, gerando um adiamento gradual nos planos de casamento e filhos.
Acertar-se na carreira profissional tornou-se a prioridade de todo
jovem – casar-se antes disso virou sinônimo de burrice; ter filhos,
então, uma loucura impensável. Assim, aos poucos, uma multidão de Peter
Pans foi se formando: homens e mulheres em plena idade adulta, vivendo
ou com os pais ou em repúblicas de solteiros, alguns tentando vencer na
vida profissional a todo custo, muitos outros usando esse mote como
desculpa para uma vida acomodada e medíocre.
É fato que a quase totalidade das pessoas não atinge o topo
hierárquico na vida profissional. Em uma sociedade centrada na família, a
realização pessoal que se consegue em casa, no amor do cônjuge e dos
filhos, é mais que suficiente para balancear as frustrações que vêm do
fracasso profissional (ou, numa situação menos dramática, do sucesso
abaixo do esperado). Em uma sociedade centrada no dinheiro e nas
aparências, como a nossa atual – especialmente com o advento das redes
sociais e da facilidade com que se propagam imagens falsificadas de
felicidade e realização –, essas frustrações ficam latentes até o ponto
em que surge uma válvula de escape.
O assunto todo é extenso a ponto de render uma dúzia de teses e
estudos, mas o brevíssimo resumo acima é suficiente para embasar meu
ponto: a militância política de nossos tempos, em especial a militância
de redes sociais, é majoritariamente executada por jovens e “jovens” que
encontraram em seu candidato a figura ideal para pôr em prática sua
pequena revolução juvenil (agradeço ao amigo Daniel Souza pelo termo),
esta sim a válvula de escape para toda a frustração acumulada. No caso
desta eleição, destacam-se os militantes da candidatura de Jair
Bolsonaro, que têm imposto um tom crescente de confronto, intolerância e
conspiracionismo para com todas as outras candidaturas. Tacitamente
endossado pelo próprio candidato – além de Jair não combatê-lo, seu
núcleo duro de campanha faz uso constante do expediente –, esse
movimento em direção à radicalização pode causar um belo estrago
político no segundo turno. O caso que me levou a escrever este texto foi
justamente o relacionado a João Amoêdo. Bastou que o candidato do
Partido Novo aparecesse com 4% das intenções de voto na pesquisa do BTG
Pactual para que a militância virtual de Bolsonaro se engajasse em
atacá-lo de diversas formas, incluindo a disseminação de memes de mau
gosto, teorias conspiratórias sobre a formação do Novo, assassinato de
reputação do próprio Amoêdo, trogloditismo e capslockismo contra
qualquer militante do partido, e assim por diante. O resultado prático
desse modo de agir será o afastamento dos eleitores do Novo em um
eventual segundo turno com a presença de Bolsonaro, ou seja, menos ajuda
para conseguir os 50% mais um dos votos válidos.
Um bom tempo atrás, Olavo de Carvalho disse que formar uma elite
intelectual e consertar a cultura do país era muito mais importante que
ganhar a Presidência da República. O filósofo estava certíssimo, e as
eleições de 2018 serão, provavelmente, a prova material de sua
afirmação. O combate primeiro deveria ter sido voltado à falta de
maturidade intelectual, à falta de um aparato cultural balanceado e ao
baixíssimo nível de educação dessa geração que milita na base dos
xingamentos sexuais e da ridicularização de oponentes e de eventuais
aliados. Afinal, como organizar uma campanha e uma militância que sejam
alinhadas com os melhores princípios e ideias judaico-cristãos sem que
se tenha reformado a estrutura mesma que lhes provê a base de seu
pensamento? Impossível.
Com o acirramento das campanhas, a entrada das inserções televisivas e
a aproximação do primeiro turno, esse comportamento tende a piorar. A
meu ver, Jair Bolsonaro precisa falar com sua militância, pedir que
sejam um pouco mais humildes e, o mais importante de tudo, que abandonem
a certeza de uma vitória no primeiro turno. É essa “certeza” que os faz
queimar pontes com possíveis e necessários aliados em um segundo turno
que deve, muito provavelmente, acontecer. E, mesmo que trabalhem e
militem com o objetivo de levar a fatura já de primeira, não é com esse
tipo de abordagem que conquistarão os indecisos e os moderados.
Enfim, voltando ao início deste artigo, a esquerda realmente destruiu
nossa nação. O trabalho foi tão bem feito que qualquer tentativa de
elevar o nível horrivelmente baixo de nossa política acaba soterrada sob
a militância burra de todos os espectros políticos. Que Deus nos livre
do pior, ter o PT de volta ao poder, e nos dê força para continuar
lutando a boa luta. Apesar de tudo, ainda há muitas cabeças boas
tentando colocar sensatez nessa bagunça que virou a campanha eleitoral
de 2018. Que suas vozes consigam ecoar além dos gritos de truculência e
intimidação.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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