MEDIÇÃO DE TERRA

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sábado, 1 de novembro de 2014

Lula retoma atuação política e deve participar mais do governo Dilma


Nome do ex-presidente já circula nos bastidores com vistas à próxima eleição. Desempenho do governo reeleito será essencial para definições do PT

Lula retoma atuação política e deve participar mais do governo Dilma evaristo sá/AFP
Em público, Dilma e Lula devem seguir exibindo sintonia, mas avaliação da gestão pode levar a críticas Foto: evaristo sá / AFP
Faltavam quatro dias para o segundo turno. Do alto de um caminhão, com um adesivo do governador Tarso Genro e da presidente Dilma Rousseff colado no peito, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um pedido para as milhares de pessoas que acompanhavam o comício no centro de Porto Alegre.
— Já perdi muitas eleições, mas também ganhei algumas. Por isso peço: só mais esta, só mais esta, só mais esta, porque o futuro a Deus pertence — disse, acrescentando que faria 69 anos no dia seguinte ao pleito e que queria a vitória de Dilma e Tarso de presente.
O desejo de Lula foi atendido parcialmente: Dilma garantiu mais quatro anos, mas, seguindo uma tradição no Estado, os gaúchos não reelegeram o governador. Embora o petista afirme que a sua única pretensão é a de estar vivo em 2018, bastou sair o resultado das urnas para que o nome do ex-presidente voltasse a ser cogitado — inclusive pela cúpula do PT — para a próxima disputa presidencial. E o movimento "Volta, Lula" retornou com força. No Facebook, já existem pelo menos 18 grupos, páginas e comunidades pedindo o retorno do ex-presidente em 2018, quando ele terá 73 anos. Há quem acredite que a campanha seria uma estratégia do petista para ganhar tempo e evitar uma luta interna e fratricida.
— A nossa tarefa imediata é a de governar o Brasil. Quando pensamos em 2018, evidentemente que o nome maior que temos é o de Lula. Ele saiu com alta aprovação do governo, é uma pessoa querida e é a que tem mais condições de passar em 2018 — avalia o deputado federal Paulo Teixeira (SP), ex-secretário-geral do PT.

Amigo de Lula há mais de 30 anos, o escritor e religioso Frei Betto disse, em entrevista a ZH em 24 de outubro, não ter a "menor dúvida" de que o ex-metalúrgico será o candidato em 2018, o que poderia significar, se a reeleição não for extinta, a permanência da sigla por até 24 anos no poder.
Pelos corredores de Brasília, circula a informação de que Lula começa a articular apoio nos movimentos sociais e no Congresso. O ex-presidente precisaria de aprovação popular para se lançar outra vez. Para isso, deve bater forte na tecla de que o PT não pode ser um "partido de gabinete". Lula convidou a bancada petista do Senado para uma reunião na próxima quinta-feira, em São Paulo. Na pauta, análise da vitória apertada e, claro, do futuro. Questionado se 2018 entra na pauta, um senador resume e ri:
— Futuro é tudo.
A bancada acredita que encontros como esse serão mais frequentes nos próximos quatro anos. Outra possibilidade é o retorno das caravanas pelo país, com Lula passando por todos os Estados. Existe um cuidado por causa da saúde dele, ou seja, seriam viagens com largo intervalo de tempo. Nada de maratonas.
Concorrendo em 2018 ou não, o certo é que Lula será mais atuante no segundo mandato de Dilma do que no primeiro. De acordo com o cientista político Rafael Araújo, da PUC-SP, o ex-presidente deverá desempenhar papel fundamental por conta das crises que Dilma deverá enfrentar. Uma demonstração do que virá pela frente, segundo Araújo, foi a derrubada do decreto dos conselhos populares, a primeira derrota da presidente após a reeleição:
— Lula é um grande negociador, possui uma habilidade que nenhum outro político no país tem. Então, numa conjuntura difícil como a que estamos vivendo, um país dividido, com os ânimos à flor da pele, uma figura como ele vem a calhar. É um valoroso aliado que Dilma tem ao seu lado.
Uma fonte no Palácio do Planalto confirma que, se for preciso, Lula vai intervir no Congresso. Mas a influência do ex-presidente na base vai depender, também, da capacidade de ele bancar cargos para os aliados. O temor do PT é em relação aos resultados do segundo mandato, o que aumentaria a força do sentimento anti-PT.
Na bancada petista no Congresso, Lula tem apoio maior do que Dilma. Parlamentares falam com tom saudosista quando recordam da Era Lula e se queixam da "falta de carinho" de Dilma. Lula recebia, periodicamente, grupos de deputados e senadores para reuniões no Planalto. Tirava fotos, conversava, era afável. Dilma é mais fria e reservada.
— Até Fernando Henrique recebia a gente com mais frequência do que a Dilma — queixa-se um senador petista.
Publicamente, a dupla Lula e Dilma segue afinada. Eles são amigos, mantêm boa relação, mas já foram mais próximos. Lula deve ter cuidado no começo do mandato para não realizar críticas públicas à gestão de Dilma. Porém, vai opinar mais do que no atual mandato. O termômetro das aparições e críticas do ex-presidente à afilhada será a avaliação do governo e a economia.
Prós
-Lula é a grande liderança do PT, que hoje não teria um nome "natural" para a disputa.
-É a única figura com capacidade para unificar o partido e neutralizar a força da oposição.
-O ex-presidente deixou o governo, em 2009, batendo recorde de popularidade, com 87% de aprovação.
Contra
-A idade. Lula — que enfrentou um câncer em 2011 — vai completar 73 anos em 2018.
-Um possível retorno do ex-presidente seria prejudicial à renovação dos quadros do PT.
-O sentimento "antipetista" poderá aumentar, e Lula colocaria em risco seu currículo.
Outros presidenciáveis petistas
Fernando Pimentel: ex-ministro do Desenvolvimento, foi eleito governador de Minas Gerais. Para concorrer, teria de abrir mão da reeleição e fazer uma excelente gestão.
Fernando Haddad: prefeito de São Paulo, é considerado uma aposta pessoal de Lula. Mas o início de sua gestão foi marcado por uma avaliação ruim. Precisa conquistar a reeleição.
Aloizio Mercadante: é o atual chefe da Casa Civil do governo Dilma. Se permanecer no cargo e o desempenho do governo for favorável, poderá ter uma boa vitrine.
Jaques Wagner: está encerrando o segundo mandato como governador na Bahia e elegeu o sucessor. Para chegar a 2018, teria de ocupar cargo de destaque no governo.
Entrevista: Olívio Dutra, ex-governador
Uma das vozes mais críticas dentro do PT, o ex-governador Olívio Dutra afirma que o partido precisa refletir sobre seu papel. Segundo ele, a legenda não pode se contentar com cargos ou com conquistas já obtidas, pois há necessidade de avanços ainda maiores.
A cúpula do PT tem defendido Lula em 2018. O senhor acredita nessa possibilidade?
Acho que esse é um movimento equivocado. O partido é um sujeito coletivo e não pode depender de uma única pessoa, por mais importante que ela seja.
Esse movimento pode prejudicar a renovação do PT?
Acho que sim, mas essa postura é de poucos, não tem possibilidade de progredir de baixo para cima dentro do PT. Lula nunca colocou nada disso.
Ele não aceitaria?
Nunca conversamos objetivamente sobre isso. Pelo que sei, ele não estimula isso. Mas a cúpula partidária e alguns setores, particularmente em São Paulo, insistem. É uma ideia equivocada, que não contribui para o partido fazer a sua medicação, porque tem que fazer uma reflexão sobre si mesmo, sobre o seu papel e suas resistências.
Mas o partido tem outros líderes de peso? Ou esse nome teria que ser construído?
Eu não tenho essa visão de que o partido tem que ter um nome e girar em torno dele. Acho que o partido tem que dialogar muito com a sua base e com os movimentos sociais. Tem de constituir um campo popular democrático para resgatar uma dívida que a esquerda tem com o povo brasileiro. E quem é a esquerda no Brasil? O PT é um partido de esquerda, mas tem vários outros.
Qual deve ser o papel de Lula no segundo mandato de Dilma?
O papel de uma figura forte, um militante importante, mas não mais que isso. Dilma é a presidente, e o governo tem as suas dinâmicas. O partido tem que instigar seus militantes e discutir com a sociedade formas de ampliar o controle sobre governos, para que a máquina pública não seja propriedade de um governante, dos seus amigos, partidários e familiares. Não pode se contentar em ter cargos aqui e ali ou com as conquistas que já asseguramos e que são parte de um processo que tem muito ainda a avançar. Um partido como o PT jamais poderia ser um partido acomodado no poder.

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