Na semana passada, VEJA mostrou que mensagens eletrônicas encontradas
pela Polícia Federal nos computadores do Palácio do Planalto revelavam
que o ex-presidente Lula e a presidente Dilma Rousseff tiveram, em 2009,
a oportunidade de interromper a ação dos corruptos que atuavam no
coração da Petrobras — e a desperdiçaram. Chefe da Casa Civil do governo
Lula, Dilma recebeu do então diretor de Abastecimento e Refino da
Petrobras, Paulo Roberto Costa, um e-mail alertando para o risco de que
obras sob sua responsabilidade fossem paralisadas por recomendação do
Tribunal de Contas da União (TCU).
Cérebro da quadrilha que desviou
bilhões dos cofres da companhia, Paulo Roberto estava preocupado com a
ação dos auditores que começaram a farejar pistas da existência do
cartel de empreiteiras que superfaturava contratos na estatal. Para
impedir que o dinheiro parasse de jorrar no bolso dos corruptos, o
diretor sugeriu que o governo agisse politicamente para neutralizar as
denúncias do tribunal. E assim foi feito. Logo depois de receber a
mensagem, Dilma se pôs a criticar a iniciativa do TCU, e Lula vetou a
decisão do Parlamento de interromper as obras suspeitas, entre elas a de
construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.
Na esteira da apuração da reportagem, VEJA perguntou à presidente,
que também comandava o Conselho de Administração da Petrobras na
ocasião, se era comum um diretor desconsiderar a hierarquia, dirigir-se
diretamente ao Palácio do Planalto e tomar a liberdade de oferecer
sugestões políticas para um problema administrativo. Dilma não
respondeu. A presidente também não explicou por que o governo, em vez de
atuar para sanar as irregularidades apontadas pelo tribunal, fez
exatamente o contrário.
Depois da publicação da reportagem, Dilma
Rousseff preferiu, em nota oficial, atacar o mensageiro. Ela acusou VEJA
de manipulação. A revista só relatou fatos produzidos pelos governos de
Lula e Dilma. Não foi VEJA que colocou Paulo Roberto Costa na Petrobras
com o objetivo de montar um esquema de corrupção para obter recursos a
ser entregues a políticos e partidos aliados do governo. Não foi VEJA
que colocou o doleiro Alberto Youssef a serviço do esquema de Costa na
Petrobras. Quem disse que Lula e Dilma sabiam de tudo foi Youssef. VEJA
apenas revelou a fala do doleiro. Portanto, não adianta esbravejar
contra o mensageiro, quando é a mensagem que fere.
Em 29 de maio de 2007, o então advogado da estatal junto ao TCU,
Claudismar Zupiroli, enviou um e-mail à então secretária executiva da
Casa Civil, Erenice Guerra (foto). Ele relatou sua preocupação com o fato de o
TCU estar no pé da Petrobras pelo uso abusivo de um decreto que permite
gastos sem licitação na estatal (leia a entrevista com o presidente do
TCU na pág. 72). Zupiroli informa que há um “voa barata” entre os
gestores da Petrobras, que estavam “com medo do recrudescimento do
tribunal em cima deles”, por causa das contratações sem licitação.
Editada em 1998 no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, a
norma foi idealizada com uma finalidade nobre: agilizar a contratação de
serviços prioritários e urgentes a fim de evitar que a estatal perdesse
competitividade no mercado. Nas mãos de Paulo Roberto Costa e de outros
diretores corruptos da estatal, no entanto, o decreto passou a ser
usado indiscriminadamente para dispensar a licitação em praticamente
todas as obras, servindo de biombo para acobertar as maiores atrocidades
patrocinadas com o dinheiro público.
É da natureza dos corruptos não se intimidar diante de leis e
decretos que dificultam sua ação. Assim, não se pode ver na dispensa de
licitação a única causa da transformação das obras da Refinaria Abreu e
Lima no maior assalto aos cofres públicos já registrado na história do
Brasil. De 2,5 bilhões de dólares, o custo da refinaria saltou para 20
bilhões. Uma parte considerável desse dinheiro foi desviada pelo esquema
de corrupção liderado por Paulo Roberto na Petrobras.
No relatório de
2009, o TCU alertava para a existência de superfaturamento. Informava
que os negócios suspeitos eram planejados em uma sala secreta,
localizada no 19º andar do edifício-sede da Petrobras. Era lá que Paulo
Roberto dava expediente como diretor de Abastecimento. Dali ele redigiu a
mensagem a Dilma Rousseff sugerindo a bem-sucedida intervenção do
governo para que nada fosse investigado.
Zupiroli também achou por bem advertir Erenice: “Cresce a corrente
dos que se recusam a assumir cargos de responsabilidade, como cresce a
disposição daqueles que acham que devem ligar ‘o f.’ no sentido de
aplicar a Lei de Licitações, independentemente das consequências. A água
está chegando ao pescoço”.
Não há registro de que a principal
conselheira de Dilma tenha tomado alguma providência no sentido de ao
menos averiguar se havia algo errado. O que se viu foi que as
contratações sem licitação continuaram a todo o vapor. O primeiro e-mail
revelado por VEJA mostrou que o Planalto foi acionado por Paulo Roberto
Costa para não deixar o TCU interromper as obras e, claro, a dinheirama
sem licitação. A mensagem do advogado, bem mais explícita e eloquente,
mandara o mesmo recado dois anos antes.
Na semana passada, o deputado
Ronaldo Caiado (DEM-GO) apresentou requerimento pedindo a convocação de
Dilma e Lula para prestar esclarecimentos na CPI mista da Petrobras. “A
presidente disse que está disposta a aprofundar toda a investigação.
Nada mais justo do que ela ir à CPI para esclarecer, em primeiro lugar, a
acusação do doleiro e, agora, a ligação com esse diretor corrupto.”
O
parlamentar também quer que o ex-presidente e sua sucessora expliquem
como a quadrilha conseguiu se instalar na Petrobras sem que o governo
percebesse. Quadrilha que, segundo os depoimentos colhidos pela polícia,
também ajudou a financiar a própria campanha presidencial de Dilma em
2010 e alimentou o caixa do PT e de seus aliados.
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