Festa para a rainha do mar lota a praia do Rio Vermelho, em Salvador.
Fila para deixar oferendas é grande na manhã deste sábado (2).
Devoto Eloísio Teixeira oferece o presente à Rainha do Mar em Salvador (Foto: Egi Santana/G1)
O vigilante Eloísio Teixeira, morador do bairro do IAPI, fez todo um
ritual antes de entregar as suas oferendas à Iemanjá neste 2 de
fevereiro de sol forte em Salvador. Ele escolheu uma área afastada da
praia a fim de ter mais calma na hora de fazer as preces. "Primeiro eu
agradeço e depois eu faço pedidos", disse. Eloísio conta que a tradição é
herdada de mãe e pai. "Agora eu tento passar isso para o meu filho de
um ano", completa. O garoto acompanhava o pai, junto com a mãe, nas
homenagens na praia do Rio Vermelho.
Eloísio levou a família para o dia de reverências
(Foto: Egi Santana/G1)
Eloísio e a família são algumas das milhares de pessoas que foram
realizar o ponto alto da devoção à Rainha do Mar na manhã deste sábado
(2), na capital baiana.(Foto: Egi Santana/G1)
Além das belas histórias de cada um em meio à multidão, o que mais chama a atenção na Colônia de Pescadores, onde os presentes que serão lançados ao mar à tarde são recebidos, é a imensa fila que reúne os fiéis incansáveis.
O dia ensolarado é mais um convite à praia do Rio Vermelho. Muita gente prestou suas homenagens cedo e resolveu se refrescar nas águas calmas e de temperatura agradável para o banho.
Mulher aproveita o banho em meio às oferendas
(Foto: Egi Santana/G1)
Embora o mar fique tomado pelas oferendas, banhistas acharam um espaço
no casa da Rainha do Mar para aproveitar o início do fim de semana com
um dos programas preferidos do baiano: a praia.(Foto: Egi Santana/G1)
Os presentes deixados pelos devotos que encaram a fila na Colônia de Pescadores só serão levados ao mar à tarde. Mas há quem prefira conversar diretamente com Iemanjá.
As pedras da praia do Rio Vermelho são o acesso para as águas. Aos poucos, os balaios com flores, espelhos, pentes e outros utensílios de beleza são deixados para agradar a entidade que tem como maior característica a vaidade.
Por causa da tradicional aglomeração na orla, o trânsito foi modificado nas imediações do Rio Vermelho.
Até por volta das 8h40, o fluxo na Avenida Garibaldi, um dos principais acessos à festa, estava tranquilo. No entanto, a previsão é de que seja formado congestionamento na via ao longo do dia.
Eliaci (Foto: Egi Santana/G1)
Na fila de espera para entregar as oferendas, tem gente de todas as
idades. Adultos, crianças e idosos se misturam para aguardar até três
horas para deixar seus presentes.Uma delas é a vendedora Eliaci do Carmo, que saiu da cidade de Cruz das Almas, a 145 da capital baiana. Ela cumpre a tradição há 18 anos. "Apesar de na minha cidade não ter rio e nem ter mar, essa é uma tradição passada desde a minha avó e a gente tenta seguir ainda hoje em dia", conta.
Para ela, aguentar horas na fila é "tranquilo" por conta das graças que já alcançou. "A minha casa e a saúde dos meus dois filhos e dos meus dois netos", completa.
Dona Eliaci chegou às 7h30 na rodoviária de Salvador e seguiu direto para o Rio Vermelho. "Só saio depois de entregar as oferendas e tomar um banho de mar", garante.
Carolina e Carina falaram sobre a fé (Foto: Egi Santana/G1)
Para a socióloga Carolina Castro, "vivemos em uma sociedade
fundamentalista, onde é muito difícil viver sem fé. Eu me encontrei
nessa forma de ter fé, mas cada um tem a sua, e no final todo mundo fala
de Deus, só muda o formato". Já Carina Castro falou que "não tem muito
como se explicar a fé. Essas coisas não são faladas, você sente a fé".
Devoção diante da Iemanjá na Colônia de Pescadores, no bairro do Rio Vermelho (Foto: Egi Santana/G1)
FestasAlém das comemorações religiosas, nas areias da praia do Rio Vermlho também são encontradas rodas de samba de roda, ou samba do recôncavo, onde os devotos dançam e batucam durante todo o dia. Para a aposentada Nanete da Silva, essa é uma característoca do "religioso baiano que vai a tudo, que se adepta a tudo e vive bem assim", disse.
Samba (Foto: Egi Santana/G1)
Além disso, as rodas de capoeira também animam turistas e devotos que aparecem na festa durante todo o dia 2 de fevereiro.
Capoeira (Foto: Egi Santana/G1)
HistóriaConhecida como uma das mais populares festas de celebração pública do candomblé, o festejo acontece desde 1923, quando houve uma diminuição na oferta de peixes da Vila dos Pescadores do Rio Vermelho. A tradição conta que eles pediram ajuda ao orixá, conhecida como a Rainha do Mar, e seguiram para ofertar presentes para Iemanjá. A oferta foi feita no meio do mar e, desde então, a festa é realizada todos os anos no dia 2 de fevereiro.
Iemanjá (Foto: Egi Santana/G1)
Devotos (Foto: Egi Santana/G1)
Flores são os presentes preferidos pelos fiéis para reverenciar Iemanjá (Foto: Egi Santana/G1)
Eloísio deixa seu presente nas águas do Rio Vermelho na manhã deste sábado (Foto: Egi Santana/G1)
Oferendas antecipadasA festa começa antes do raiar do sol do dia 2 de fevereiro. Mas há quem prefira homenagear o orixá, conhecido como "rainha do mar", um dia antes, para "evitar a muvuca de gente", como a dona Maria dos Reis, de 80 anos, que se deslocou da Liberdade, bairro distante e um dos mais populares da cidade.
Dona Maria, de 80 anos, diz que é vaidosa igual a
Iemanjá (Foto: Egi Santana / G1)
"Ano passado, nesta data, eu estava internada em um hospital, cheia de
problemas de saúde. Lembro que pedia a Deus e à nossa rainha, e hoje eu
estou aqui inteira como todo mundo pode ver, não é?", comentou bem
humorada.Iemanjá (Foto: Egi Santana / G1)
Segundo ela, a tradição herdada dos pais e dos avós é respeitada todos os anos, com agradecimentos e entregas de presentes. "Este ano trouxe pente, perfume de alfazema e espelho, porque ela é vaidosa assim como eu", relatou.
Dona Maria deixou os seus presentes no interior da "Casa de Iemanjá", localizada na Colônia de Pescadores do Rio Vermelho. As lembranças dela e de todos os fieis são colocadas em balaios e organizados em uma estrutura chamada de "Caramanchão" entre esta sexta-feira (1°) e o dia da festa, que este ano acontece no sábado (2). Os pescadores seguem para o mar e doam os presentes a Iemanjá.
"Serão cerca de 300 balaios médios arrecadados nos dois dias. As pessoas trazem pentes, alfazema, espelho, flores e presentes dos mais variados. Trazem aquilo que a fé ou as promessas pedem que tragam, até objetos pessoais", explicou Luís Gonzaga dos Santos, um dos responsáveis pela organização das oferendas.
Esse foi o caso de Roberta Pimentel, 35 anos, moradora de Itapuã. Ela, que viveu por 10 anos nos Estados Unidos, fez questão de levar os presentes na Loca, vestida de azul e branco, com direito a um banho de mar na chegada. "Como forma de agradecimento mesmo. Quando estamos fora, percebemos como o nosso povo baiano é acolhedor e é acima de tudo respeitador das outras religiões. Aqui você pode dizer a um católico ou a um evangélico que irá levar suas oferendas que eles irão respeitar. Podem até discordar, mas vão ficar com suas opiniões e o respeito será mantido", avalia. Roberta Pimentel realizou o ritual acompanhada da mãe, Nicéia, que passou para a filha a tradição.
Roberta Pimentel e a sua mãe também comparecem para garantir oferenda (Foto: Imagens / G1)
Flores e axéAlém do perfume de alfazema e de produtos de beleza, as flores estão entre os presentes mais tradicionais oferecidos a Iemanjá. "Nos dias normais, a gente vende a unidade a R$ 2, ou R$ 1,50, a depender do dia. Amanhã, a gente vai vender por R$ 3 , ou duas por R$ 5, a depender da conversa do cliente", explicou a vendedora Rita de Cássia. Há mais de 10 anos ela vende rosas, flores do campo e a chamada "sorriso de Maria" em frente à colônia dos pescadores, conforme conta.
O "axé", como chamam os integrantes do candomblé, é o ritual feito para purificar os devotos, como explica o pai-de-santo Ricardo de Oxúm. "São cerca de sete mil pessoas que esperamos atender amanhã. No ritual do arroz, que é o alimento de Iemanjá, colocamos o milho de Oxóssi, o girassol, a lentilha, a água de cheiro preparada, a aroeira e a Pemba de Oxalá para proteger, purificar e abrir os caminhos dos devotos da rainha", contou o religioso.
Devotos fazem preces na "Casa de Iemanjá", no Rio Vermelho, na véspera da festa (Foto: Imagens/G1)
ProgramaçãoPara os adeptos do Candomblé, o dia dois de fevereiro se comemora também o dia de Oxum, rainha das águas doces. Por isto, a festa de Oxum se mistura com a festa para Iemanjá. A partir das 22h30 do dia primeiro, os religiosos se dirigem ao Terreiro Oxóssi de Ojimirim, localizado no bairro da Federação.
O terreiro permanece de portas abertas para a população que queira acompanhar as obrigações religiosas. Já as 3h do sábado (2), eles oferecem um presente para Oxum no Dique do Tororó e, de lá, seguem em cortejo para o Rio Vermelho, para fazer as oferendas à Iemanjá.
Às 5h, a festa para Iemanjá é aberta oficialmente, com uma alvorada de fogos e a chegada do presente principal, oferecido pelos pescadores e que, a cada ano, é uma surpresa. O público tem até as 15h para deixar seus presentes na Colônia de Pescadores. Às 15h30, mais de 350 embarcações saem em um cortejo marítimo até o alto-mar, para a entrega das oferendas.
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