BLOG ORLANDO TAMBOSI
O STF tem sido alvo de ataques que buscam minar sua autonomia. Mas nem todas as críticas são infundadas: se quer que suas prerrogativas sejam respeitadas, deve se dar ao respeito. Editorial do Estadão:
Na
sexta-feira, o presidente Lula da Silva recebeu ministros e
congressistas aliados no Palácio da Alvorada para um churrasco. Mais do
que mera confraternização, a festa era temática: os revezes do governo
no Congresso. Não por acaso os presidentes das duas casas legislativas
não foram convidados. Mas lá estavam dois ministros do Supremo Tribunal
Federal (STF), Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes (também presidente do
Tribunal Superior Eleitoral), além do recém-aposentado Ricardo
Lewandowski.
A
esta altura, ministros do Supremo já deveriam saber que toga não é
traje esporte fino, desses que se usam em festas informais. É evidente
que os dois ministros foram convidados não por suposta amizade com o
presidente, e sim porque integram o STF, lugar por onde trafegam
interesses do governo.
Assim,
se já seria inadequada a presença dos ministros num convescote
governista, tanto pior quando ele tem tinturas políticas. Em particular,
foi uma oportunidade para alinhar as bases após as medidas do Congresso
que evisceraram o Ministério do Meio Ambiente e outros. O caso pode
parar no STF. Como fica a percepção de independência dos ministros? Lula
aproveitou para comunicar aos comensais que indicará seu amigo e
advogado, Cristiano Zanin, para a vaga de Lewandowski.
Não
é de hoje que o Judiciário conspurca sua já precária reputação de
isonomia mantendo relações esquisitas com o poder político e econômico.
Ora, no poder público, em especial no Judiciário, a compostura é lei.
Ela exige que os juízes sejam não só seus primeiros cumpridores, mas
falem apenas nos autos, sejam conscienciosos com os limites de suas
funções, não busquem holofotes nem usem o cargo para promover convicções
pessoais. Não basta ao judiciário ser isento. É preciso parecer.
Pela
lei, juízes podem, por exemplo, exercer atividade acadêmica, mas não “o
comércio ou participar de sociedade comercial”. Há, porém, os que têm
empresas de educação. Também frequentam todo tipo de eventos e
“seminários” em resorts de luxo bancados por empresas que têm ações
multimilionárias na Justiça. Recentemente, o ministro Nunes Marques
viajou a Paris com as despesas pagas por um advogado para assistir a
Roland Garros e à Champions League. Dias Toffoli passeou na casa de
veraneio do então ministro Fábio Faria, genro do empresário Silvio
Santos e filho do ex-governador Robinson Faria, que responde a uma
investigação por corrupção no STF relatada por Toffoli.
Com
a presença de empresários e ministros do STF, a diplomação do
presidente Lula foi comemorada na mansão do advogado antilavajatista
Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay – aquele que tirou fotos
desfilando de bermuda pela sede da Suprema Corte como se fosse a
extensão de seu quintal. No dia seguinte a um almoço com Alexandre de
Moraes, Lula indicou dois aliados do ministro para o TSE. Mais cedo ou
mais tarde, a Corte se debruçará sobre os processos que pedem a
inelegibilidade do maior adversário de Lula, Jair Bolsonaro. Qual será a
percepção da população sobre sua isenção?
Por
disfunções históricas do “presidencialismo de coalizão”, há muito tempo
o STF tem sido instado a arbitrar impasses entre o Executivo e o
Legislativo ou entre as próprias lideranças partidárias. O corolário é
não apenas a judicialização da política, mas a politização da Justiça.
Consolidou-se uma tendência dos ministros de interpretar as leis e a
Constituição de modo extensivo e criativo, como se coubesse à Corte não
só aplicar a lei, mas fazer a “justiça social” que os representantes
eleitos não fazem. O ministro Dias Toffoli chegou a dizer que os
ministros são “editores de um país inteiro”, e Luís Carlos Barroso, que
seu papel é “empurrar a história na direção certa”.
Se
as críticas excessivas de “ativismo judicial” têm tanta aderência na
população é porque há um fundo de verdade genuíno nelas. O STF tem sido
alvo de difamação, intimidações e ataques frontais, como no 8 de
Janeiro, com o objetivo de tolher sua autonomia, independência e
respeito junto à população. As forças republicanas têm se esforçado por
defender essas prerrogativas. Mas é preciso que a Corte as ajude a
ajudá-la. Quem quer ser respeitado precisa se dar ao respeito.
Postado há 1 week ago por Orlando Tambosi
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