MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

segunda-feira, 25 de dezembro de 2023

Se o juiz é amigo do réu, não pode julgá-lo.

 

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

 

Não pode, ministro. Carlos Alberto Sardenberg para O Globo.


Há algum tempo, tive uma conversa telefônica com o ministro Gilmar Mendes , a respeito da “Corte brasiliense”, assunto de que tratara coluna numa no GLOBO. O ministro foi designado para questionar vários pontos, um em especial — o julgamento de políticos importantes no Supremo Tribunal Federal. Argumentava Gilmar: o fato de ser amigo de um político não impede que ele, ministro, julgue com autorização um caso que envolva aquele político.

Se bem me lembro — e lembro —, o ministro ainda levantou questão de caráter pessoal: por acaso se estava duvidando da sua imparcialidade? Meu argumento era e continua sendo: não pode julgar. Ponto. Não se trata de ética pessoal. Se o juiz é amigo do réu, convive com ele em jantares, festas e até viagens — e ainda participa de articulações políticas —, não pode julgá-lo.

Isso me parece tão óbvio que é difícil argumentar.

Mas vamos lá, porque tem mais. Se o juiz é amigo, convive festivamente com um advogado, também não pode julgar casos do referido causídico. Mais: se a participação do magistrado é sócio do escritório de advocacia, o magistrado não pode julgar casos dessa banca.

Dirão: se assim for, no limite das Cortes brasilienses, ninguém pode julgar, ninguém importante pode ser julgado, nenhum advogado pode advogar. Juízes, advogados, políticos, empresários, lobistas — com abordagens para todos os casos — convivem abertamente. Dirão que sempre foi assim. Aí o problema: como tudo se passou como se normal fora, a Corte passou dos limites.

O ministro Alexandre de Moraes foi o presidente do Tribunal Superior Eleitoral na última eleição presidencial. Ele mesmo proclamou o resultado. Depois da festa de comemoração de Lula, na hospedagem do advogado Kakay, figura frequente dentro e fora dos tribunais.

Não pode, ministro.

Moraes deveria ter telefonado para Lula — cumprimentos formais e boa sorte. Também deveria ter ligado a Bolsonaro, que obviamente não seria atendido, mas Moraes teria cumprido o rito formal.

Kakay é conhecido pelos dons de hospedagem, além da capacidade de encontrar saídas para casos complexos no STF , prédio cujo frequenta como se fosse da casa. Faça seu trabalho. Ministros tomaram seus vinhos “Grand Cru” — aí não estão fazendo seu trabalho. Não pode. Aliás, Kakay, pelo especial que sugerimos, não poderia defender nenhuma causa. Não raro, ele é advogado de um réu que é amigo do juiz, este também do convívio com Kakay.

A banalidade do fato de que isso ainda tem levado a extremos frequentes. O exemplo desta semana: em decisão monocrática — outro absurdo normalizado —, o ministro Dias Toffoli suspendeu uma multa de R$ 10,3 bilhões que a J&F vinha pagando ao Tesouro. A multa resulta de um acordo de leniência amplamente negociado, com uma bateria de advogados e procuradores.

Toffoli baixou sua decisão no recesso, não sendo ele plantonista. A coisa só vai a colegiado lá por 2024 e tanto, sabe-se lá. Como várias outras decisões monocráticas que permaneceram engavetadas — como um liminar de Lewandowski permitindo a nomeação de políticos para as estatais — em meio a pedidos de vista. Há prazos, mas não se cumprem.

Outra coisinha: a esposa de Toffoli advoga para a J&F. Outro caso, certo, mas isso elimina a suspeita? Mais: corporativo, Toffoli derrubou decisão do TCU que cancelou aumentos automáticos a juízes federais. Vai custar perto de R$ 1 bilhão.

Eis por que, com interpretações das leis que eles mesmos fazem, juízes ganham de R$ 200 mil, R$ 300 mil — o que faz do Judiciário brasileiro o mais caro do mundo.

Ao longo da carreira, conheci juízes, advogados, políticos e promotores de elevado espírito republicano. O Grupo Globo patrocina o Instituto Innovare, dedicando-se a boas práticas do Poder Judiciário. Todo ano, surgem iniciativas notáveis.

Ainda bem, temos onde buscar saídas.

Finalmente: não misture estes meus comentários com os golpes de Bolsonaro e sua turma. O ex-presidente queria ser dono do STF. Lula, sem golpes, na palavra, também quer controlar o STF. Sabe que lá está o poder único.

Cabe a perguntinha ao presidente do STF, ministro Barroso: tudo bem.

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