MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

sábado, 2 de setembro de 2023

Cenários para a eleição presidencial argentina: um turbilhão de mudanças.

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

O clima de velório no peronismo é apenas um dos aspectos do que o tsunami Milei criou num quadro eleitoral em que o impossível acontece. Vilma Gryzinski:


O triunfalismo foi perfeitamente justificado nas declarações de Javier Milei depois de ser o candidato mais votado nas prévias presidenciais, com 30% das preferências.

“Tínhamos como primeiro objetivo ir para o segundo turno, mas face a esse número imponente, temos mérito para poder ganhar no primeiro turno”.

A euforia da vitória tem, certamente, muito a contribuir para esse tipo de declaração. Mas Milei não pode mais ser tratado como um maluco que capricha nos maiores absurdos imagináveis.

A vitória no primeiro turno acontece quando o candidato tem o mínimo de 45% dos votos válidos. Milei ganhou as primárias em 16 das 24 províncias argentinas e foi bem votado em todas as classes sociais, inclusive nas regiões mais pobres, consideradas voto cativo do peronismo pela chuva de benefícios que viram ilusão quando a economia se desmancha.

Essa coisa de voto cativo já era, principalmente se o candidato peronista é o ministro de uma economia que vai para os 112% de inflação e estonteantes 685 pesos o dólar — o oficial foi congelado em 365, recurso dos desesperados.

O ambiente fúnebre entre os partidários de Sergio Massa retratou à perfeição a reação na frente agora chamada de União pela Pátria. Massa teve 21% dos votos e o ultraesquerdista católico Juan Grabois, 6%. Juntos, ficaram atrás de Milei e também dos dois candidatos da oposição tradicional, Patricia Bullrich (15%) e míseros 11% para Horacio Rodríguez Larreta, o sensato administrador que é atualmente prefeito de Buenos Aires.

Pelo menos nessa primeira etapa, os argentinos mostraram que não querem saber de sensatez. E que um defensor de ideias ultraliberais — esqueçam a bobagem de extrema direita — pode ter pelo menos uma noite com sabor de vitória num dos países mais estatizantes do planeta.

“Acho que nós fizemos um diagnóstico e as pessoas entenderam”, comemorou Milei. “Fizemos o trabalho da melhor maneira que pudemos e com os recursos que tínhamos. Falamos à sociedade com verdade, com o que acreditamos, e isso passa para as pessoas. Não somos um focus group, defendo as ideias da liberdade porque é nisso que acredito”.

“A Argentina se tornou um país miserável, com 45% de pobres”.

“Aqui não é um problema de cozinheiro, mas de receita. Se não fizermos uma guinada de 180 graus, a Argentina vai virar o país mais pobre do mundo. Nós propomos essa guinada. Os únicos que resistem a entender isso são os políticos. Porque, para eles, nada vai mal. Para quem vai mal é para os argentinos. A Argentina dos últimos quarenta anos foi um desastre”.

O discurso de um candidato exótico agora se transformou em palavras que devem ser levadas em consideração — mesmo que, na hipótese mais extrema, Milei seja eleito presidente, propostas radicais como dolarização, fim do Banco Central, eliminação progressiva dos “ministérios sociais” e vasta abertura econômica para atrair investimentos que criem uma realidade de prosperidade quase mágica na Argentina jamais passariam pelo legislativo.

Obviamente, ele teria uma ampla legitimidade se ganhasse no primeiro turno. Isso é possível? Teoricamente, não é impossível.

Os cenários de segundo turno agora são de Milei contra Bullrich ou Milei contra Massa. Não pode ser totalmente eliminada a hipótese de Bullrich contra Massa caso algum grande escândalo aflore e engula o candidato alternativo.

Nessa hipótese, nada garante que Milei aconselhasse seus eleitores a votar em Patricia Bulllrich, com quem tem um agravo pessoal, considerando que ela e o marido tramaram revelações constrangedoras contra ele. Apesar do bom relacionamento com Mauricio Macri, uma aproximação entre os dois candidatos oposicionistas no momento parece impossível.

Muitos analistas argentinos disseram, depois da penúltima eleição presidencial no Brasil, que na Argentina acontecia muita coisa, mas “jamais aconteceria um Jair Bolsonaro”.

Pois é, agora aconteceu Javier Milei.

“A sociedade argentina mudou e não é a dos últimos dez anos”, disse ao La Nación o consultor Alejandro Catterberg. “Não é mais kirchneerismo contra antikirchnerismo. Isso ficou velho. A onda de desencanto é o que alimenta Milei. Se essa onda continuar crescendo, pode transformá-lo em presidente”.

Pode ser exagero, pode ser uma avaliação objetiva.
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