BLOG ORLANDO TAMBOSI
O pacote, recorde na Inglaterra, inclui segurança para proteger os filhos da princesa Haya do próprio pai, o emir de Dubai. Vilma Gryzinski:
Nem
os ex-casais russos que eventualmente disputam milhões nos tribunais
ingleses conseguiram competir em matéria de revelações escandalosas – ou
apenas estonteantes, pelas quantias envolvidas – com o divórcio da
princesa Haya e do xeque Mohammed Bin Rashid Al-Makhtoum, que além de
reinar sobre Dubai também é primeiro-ministro dos Emirados Árabes
Unidos, a constelação de micropaíses do Golfo Pérsico movidos a
petrodólares.
A
decisão já saiu: o xeque vai ter que participar com 700 milhões de
dólares para manter o padrão de vida de Haya e dos dois filhos menores,
Jalila, de 14 anos, e Zayed, de nove. E que padrão. Um exemplo: durante
umas férias em que as coisas ainda corriam bem, o casal gastou o
equivalente a 2,6 milhões de dólares só em morangos.
Entre
outros pertences, Haya, que é filha do falecido rei Hussein da Jordânia
e deu um salto quântico em matéria de status financeiro quando se
tornou a sexta mulher – concomitante – do xeque, pediu a devolução de
suas roupas de alta costura avaliadas em 85 milhões de dólares. As joias
são mais modestas: só 25 milhões de dólares. Empregados para servir mãe
e filhos, 80. Mesada das crianças, 13 milhões de dólares por ano.
Haya
saiu escondida de Dubai em 2019 e se instalou em seu palacete em
Londres, dizendo temer o marido, acusado de mandar sequestrar duas de
suas próprias filhas para impedir que escapassem de sua esfera de
influência.
Na
época, o xeque, que faz poesia pela internet, insinuou deslealdades.
Muito possivelmente já sabia que Haya havia tido um caso com um
segurança da equipe inglesa, Russell Flowers, um ex-militar bonitão.
Durante o processo, vieram à tona detalhes dolorosos. Haya foi chantageada pelos seguranças para que não revelassem o romance.
“Amigos”
de Flowers dizem que não foi exatamente assim: ele assinou um contrato
de confidencialidade, equivalente a 1,6 milhão de dólares, para não
falar sobre o assunto até o fim da vida.
O
xeque, que é dono da maior rede de haras do mundo e através do mundo
das corridas de cavalo se aproximou da família real inglesa, não ficou
sentando, quietinho, enquanto corria o processo, obviamente com os mais
caros advogados do mercado londrino. Mandou espionar, justamente, a
chefe da equipe contratada por Haya, Fiona Shakleton, que é membro da
Câmara dos Lordes. Seus agentes usaram tecnologia vendida pelo NSO
Group, empresa israelense já enrolada na espionagem do saudita Jamal
Khashoggi, morto e esquartejado no consulado em Istambul.
Os
advogados do xeque tentaram evitar reiteradamente que a espionagem
fosse revelada, invocando inclusive a condição de governante estrangeiro
de Al-Makhtoum. Perderam. A própria NSO, através de seus
representantes, informou ao tribunal que havia detectado um uso “não
contratual” do Pegasus, o incrível software que invade qualquer celular
no mundo e é vendido para combater terrorismo e outras ameaças à
segurança de estado.
Outra
revelação de derrubar o queixo: o emir de Dubai tentou comprar um
palacete vizinho ao da ex-mulher só para espioná-la melhor.
Por
causa dessas manobras, Al-Makhtoum foi considerado uma ameaça aos
próprios filhos e a enorme quantia destinada a segurança na sentença de
divórcio visa a protegê-los do próprio pai.
O
juiz Philip Moor disse que, de maneira “única”, a “maior ameaça” à
princesa e às crianças provém do próprio xeque e “não de fontes
externas”.
As
varas de família são extremamente favoráveis às mulheres em processos
de divórcio, em especial no que diz respeito à divisão meio a meio do
patrimônio e à manutenção do padrão de vida que desfrutavam durante o
casamento. Por isso, estrangeiras com residência no país recorrem às
cortes de Sua Majestade. Existe até uma expressão, “turismo de
divórcio”.
As
esposas de oligarcas russos e milionários árabes pegam carona nesse
sistema. No processo que era recorde até o de Haya, a mulher do magnata
russo do gás Farkhad Arkhmedov, Tatiana, ganhou exatamente 41,5% do seu
patrimônio de 1,3 bilhão de dólares. Ele não pagou e a mãe processou o
próprio filho, Timur, por conspirar com o pai para esconder a fortuna,
um caso de descrer na espécie humana, como tantos outros dessa esfera.
A
fortuna pessoal de Al-Makhtoum é calculada em quatro bilhões de
dólares, mas obviamente ele e a numerosa família desfrutam também das
benesses de estado.
O
emir, um título equivalente ao de príncipe e comandante, construiu uma
cidade-estado cheia de atrações turísticas mirabolantes e vantagens para
empresas estrangeiras, um modelo afetado pela pandemia, mas que mira no
longo prazo, num mundo pós-combustíveis fósseis.
A
modernidade de Dubai convive com o estilo de vida bem tradicional dos
muçulmanos mais conservadores, com estrita separação entre os sexos fora
da família e mulheres cobertas por um manto negro da cabeça aos pés
quando saem à rua.
Nos
velhos tempos, Haya poderia sofrer a pena capital reservada às mulheres
infiéis. Se tivesse continuado em Dubai, provavelmente seria confinada
em algum palácio sem nenhum acesso ao mundo exterior – como aconteceu
com as filhas rebeldes do xeque, agora aparentemente “reformadas”.
Em
Londres, estará livre para desfrutar o dinheiro que o ex-marido, muito
contra a vontade, terá que dar. O pacote é vitalício e inclui até 7
milhões de dólares para que a princesa jordaniana, que já foi amazona
competitiva, compre e mantenha cavalos de raça. Também vai dar para
pagar os morangos, embora seja difícil imaginar como um ser humano gasta
mais de dois milhões de dólares nisso numa temporada de férias.
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