Não tenho liberdade para correr nua na rua, conduzir sob o efeito do álcool ou colocar a vida de outras pessoas em perigo. Embora a obrigatoriedade das vacinas me incomode, creio ser um mal necessário. Teresa Roque para o Observador:
No
momento em que escrevo, a Covid-19 já fez cerca de 5.35 milhões de
vítimas no mundo, 800.000 só nos EUA. Quando a pandemia disparou pela
primeira vez, o jornal The Economist fez uma previsão que apontava para
um número entre 1 e 2 milhões de fatalidades pela Covid-19 nos EUA.
Lembro-me de ter ficado chocada com esse número e, durante algum tempo,
cheguei a julgar que essas conjecturas estariam exageradas. Quase dois
anos depois, estamos perto de atingir o limite inferior dessa previsão.
Apesar
de todos os esforços, os EUA continuam a ter uma percentagem
relativamente baixa de pessoas com o plano completo de vacinação. Em
média, o número situa-se nos 61%, ainda longe do necessário para se
obter a imunidade de grupo. Além disso, este número esconde diferenças
entre a realidade dos estados. Alguns como Ohio, Tennessee, Indiana e
Geórgia estão na casa dos 50%, enquanto Mississippi, Idaho e Wyoming
estão na casa dos 40%. Metade ou mais de metade da população desses
estados recusa-se a ser vacinada.
Na
Europa, a situação é um pouco melhor, embora, mais uma vez, varie entre
os diversos países. Mesmo naqueles onde a população se tem mostrado
mais relutante em relação à vacina, como a Alemanha, a Áustria, o Reino
Unido e a Holanda, já quase 70% das pessoas estão totalmente vacinadas.
Agora, no momento em que assistimos à entrada em cena de uma nova
variante e testemunhamos uma nova subida exponencial do número de
mortes, os governos começam a recorrer paulatinamente à solução da
obrigatoriedade total ou parcial de vacinação.
No
início deste mês, a Áustria deu um passo que, até aí, teria sido
considerado inconcebível numa democracia ocidental: anunciou que a
vacinação contra a Covid-19 passaria a ser obrigatória para toda a
população elegível. Este acto extraordinário da Áustria surgiu poucos
dias depois de ter instituído um confinamento obrigatório para os não
vacinados – uma restrição que foi bem mais longe do que a de qualquer
outra nação europeia ao discriminar aqueles que têm vindo a provocar um
aumento preocupante de hospitalizações.
A
vacinação obrigatória foi já parcialmente introduzida para certas
faixas etárias ou profissões em diversos países. A França foi a primeira
a iniciar a vacinação parcial obrigatória no passado mês de Setembro.
Não apenas para os profissionais de saúde, mas também para as forças
policiais e bombeiros. Na Grécia, onde o número de infecções está a
aumentar, o primeiro-ministro Kyriakos Mitsotakis anunciou recentemente
que a vacinação contra a Covid-19 passará a ser obrigatória para todos
os cidadãos com mais de 60 anos. Até mesmo a presidente da Comissão
Europeia, Ursula von der Lyen, veio sugerir que todos os Estados-membro
deveriam seguir-lhes o exemplo e impor a vacinação obrigatória aos seus
cidadãos. O facto de a UE não ter jurisdição sobre a forma como os seus
Estados-membro gerem os seus sectores de saúde parece ser agora de
somenos importância.
Escusado
será dizer que tudo isto gerou um grande clamor. Nas últimas semanas,
assistimos a uma onda de protestos contra a vacinação obrigatória por
toda a Europa. A questão de puxar ou não o gatilho da obrigatoriedade
tornou-se uma dúvida existencial especialmente na Europa, orgulhoso
bastião da democracia liberal. A Áustria abriu o caminho e outros países
provavelmente seguir-lhe-ão o exemplo. Se alguns acolheram bem esta
postura; outros acreditam que acabámos de abrir a caixa de Pandora.
Afinal até onde podemos ir para alcançar a imunidade de grupo?
Na
origem das nossas discordâncias em relação a estas questões está a
nossa postura face aos valores éticos. Estas questões envolvem a forma
como encaramos os direitos dos indivíduos, os deveres envolvidos nas
relações que os indivíduos estabelecem uns com os outros, a concepção
daquele que deverá ser o papel do Estado e, em última análise, a forma
como julgamos que a sociedade deva ser organizada.
Quer
os indivíduos, quer as sociedades, enfrentam dilemas morais todos os
dias. Sempre que se perguntam “que devo fazer?” tanto os cidadãos como
aqueles que os governam colocam questões morais. Algumas mais fáceis de
responder do que outras. Se a decisão a tomar residir na escolha entre
assistir a outro episódio da série “The Office” ou cumprir obrigações
profissionais ou parentais, todos sabemos muito bem o que deveremos
fazer, e, mesmo que tenhamos optado por assistir a outro episódio dessa
comédia aprazível, no fim de contas, temos consciência do que deveríamos
ter feito.
No
entanto, nem todos os problemas são de tão fácil resolução. A vida nas
sociedades democráticas está repleta de diferendos entre o que é certo
ou errado, entre justiça e injustiça. Basta ver as recentes discussões
sobre a vacinação obrigatória, a eutanásia ou o aborto: todas questões
difíceis. O mesmo acontece com a biogenética, as barrigas de aluguer, a
lei das quotas, a tortura de suspeitos de terrorismo, o recrutamento
obrigatório e assim por diante.
Os
filósofos políticos e da ética não conseguiram até hoje resolver estas
divergências de uma vez por todas. Eles próprios discordam sobre aquilo
que é correcto fazer. Alguns acreditam que devemos ter por objectivo
maximizar o bem-estar, outros, que deveremos salvaguardar os direitos
individuais, e, outros ainda, que há que promover a virtude cívica. Cada
uma destas correntes de pensamento aponta para uma maneira diferente de
ponderar sobre o que deve ser feito e, por sua vez, implica uma posição
diferente face a questões morais complicadas. Para simplificar,
discutirei aqui apenas as duas primeiras abordagens: a maximização do
bem-estar por oposição aos direitos individuais.
O
facto de os próprios filósofos morais não chegarem a acordo, não
significa que as considerações de moralidade ou de justiça sejam
irrelevantes. Num mundo em rápida mudança, pleno de tecnologias
disruptivas e potencialmente letais, e onde o homem enfrenta várias
ameaças existenciais, as discussões morais nunca foram tão pertinentes.
Ainda que não nos forneçam uma só resposta indiscutível, enformam os
argumentos que temos e trazem clareza moral às alternativas que
confrontamos enquanto cidadãos democráticos.
Consideremos
agora o movimento anti-vacinas. É importante saber que crenças morais
fundamentam esta causa, pois só assim poderemos estruturar melhor os
argumentos para a combater. A identificação destes códigos éticos pode
ajudar a moldar estratégias de persuasão mais eficazes e até ajudar a
responder à questão de até onde poderemos ir no combate a esta pandemia.
Até
há pouco, os governos de todo o mundo rejeitavam a ideia de uma
obrigatoriedade universal da inoculação de uma vacina contra o
coronavírus, optando por incentivos e outros “empurrõezinhos” para levar
as pessoas a vacinarem-se. Pessoas não vacinadas enfrentam restrições
de movimento severas. Na Grécia, em Itália e em França, os empregadores
não podem despedir trabalhadores que não tenham tomado a vacina, mas
podem suspendê-los sem remuneração – um empurrãozinho “amigável”. O
governo dos EUA determinou que todos os empreiteiros estatais
apresentassem prova de vacinação do seu pessoal. Também os empréstimos
nacionais a estudantes estão agora sujeitos a prova de vacinação. Estas
medidas podem ou não constituir uma política sagaz: os incentivos são
geralmente mais eficazes do que as penalizações na mudança de
comportamentos individuais. Todavia, são medidas que visam disseminar a
mensagem do que as pessoas devem fazer, nos mesmos moldes que sanções
contra a condução embriagada, a fuga aos impostos ou a discriminação
injusta no local de trabalho, o fazem.
Em
termos gerais, há duas formas de abordar a questão das vacinas
obrigatórias. A primeira abordagem, conhecida como doutrina do
Utilitarismo, diz que a moralidade de uma acção depende unicamente das
suas consequências: a acção correcta é a que produz os melhores
resultados. A segunda abordagem diz que as consequências são
irrelevantes, moralmente falando, e que certos deveres e direitos devem
merecer o nosso respeito, independentemente das suas consequências
sociais. Por outras palavras, certos direitos são fundamentais – sejam
eles naturais, sagrados, inalienáveis ou categóricos.
Alguns
dos debates que têm vindo a lume reflectem profundas divergências sobre
o que deve ou não ter precedência: maximizar o bem-estar social ou
respeitar os direitos individuais. Outros envolvem ideias opostas sobre
qual o melhor caminho a seguir, quando estes ideais entram em conflito,
melhor dizendo, o direito que me assiste de salvaguardar a minha saúde
(e vida) e evitar futuros confinamentos, versus o direito dos outros de
escolher o que fazer com o seu próprio corpo.
O
conceito principal em que os maximizadores de bem-estar se baseiam é
simples: o princípio mais elevado da moralidade será tudo aquilo que
maximizar a utilidade, ou seja tudo o que produza menos dor e mais
felicidade. Jeremy Bentham, o pai do Utilitarismo, desprezou a ideia dos
direitos naturais, chamando-lhes “tolices sem sentido”, um epíteto que a
maioria dos democratas liberais encararia com grande incómodo.
Os
“anti vax” (nome clonado do inglês, já em uso comum) põem vidas em
risco, evitam que a sociedade alcance a imunidade de grupo e,
consequentemente, prolongam as medidas obrigatórias como a do uso de
máscara, o trabalho em casa, mandar as crianças da escola para casa,
fechar o comércio – acarretando, com isto, um grande custo para a
maioria da população que voluntariamente se vacinou. Além do mais,
quando sucumbem à doença, tendem a ser um fardo maior para o sistema
público de saúde, pois como não têm imunidade, obrigam o Estado a
canalizar mais recursos para os manter vivos, recursos esses, que
poderiam ser dirigidos ao combate a outras doenças.
A
Covid-19 tornou-se uma pandemia dos não vacinados. A maioria das
pessoas que estão hospitalizadas hoje não foi vacinada. Contudo, os
custos da vacinação são minúsculos. Muito poucas pessoas apresentam
reacções adversas ou mesmo fatais, a vacinação é gratuita e funciona.
Não há dúvida de que os benefícios da vacinação superam em muito os
custos, logo, nesta perspectiva, é compreensível que qualquer governo
considere que o caminho correcto a tomar seja o de tornar a vacinação
contra a Covid-19 obrigatória.
Aqueles
que se recusam a ser vacinados são antiéticos porque arriscam causar
sérios danos a outras pessoas sem motivo válido; são irresponsáveis
porque vão contra as responsabilidades individuais e colectivas de
contribuir para importantes objectivos de saúde pública. Alcançar a
imunidade colectiva – o ponto em que uma população tem um número
suficientemente elevado de vacinados que assim permita evitar que um
vírus consiga encontrar novos hospedeiros e o surgimento de novas
mutações – agora, exigiria que cerca de 90% das pessoas tomassem as
vacinas. Com a maioria dos adultos imunizados, novas e mais infecciosas
variantes do coronavírus não teriam por onde se espalhar. A vida poderia
voltar ao normal muito mais cedo e seria provável que surgissem menos
variantes (algumas das quais podendo acabar por vir a ser resistentes às
vacinas que foram desenvolvidas). Outros efeitos prejudiciais,
provocados pelo prolongamento desta pandemia, como os que afectam a
economia, a educação efectiva e a saúde mental, seriam minimizados.
As
estratégias de mitigação – uso de máscara, distanciamento social,
frequente lavagem das mãos, e testes regulares – são eficazes para
desacelerar a disseminação da Covid-19. Porém, constituem medidas não
tão eficazes e muito menos apelativas do que as estratégias de longo
prazo. À medida que mais variantes surgem, os Estados vêem-se forçados a
voltar a exigir o uso de máscaras e o distanciamento social, práticas
que inibem a liberdade pessoal e têm repercussões socioeconómicas
significativas. Permitir que algumas pessoas escolham permanecer não
vacinadas, limita severamente a mobilidade de todos e ameaça a segurança
de outras pessoas, o que faz com que essa opção seja não só injusta,
como perigosa, para aqueles que são especialmente vulneráveis e que
podem não ter outras opções para se proteger.
Num
mundo ideal, seríamos capazes de convencer todas as pessoas a escolher
livremente tomar as vacinas. Embora, em tese, as pessoas devam ser
livres para se comportarem como quiserem, restringir o seu comportamento
pode por vezes justificar-se, particularmente quando as suas acções
podem causar danos a terceiros. John Stuart Mill, outro utilitarista,
veio propor o princípio do menor dano. Regra geral, é melhor usar os
meios menos invasivos necessários para encorajar o comportamento
desejável. A melhor abordagem seria alcançar a imunidade de grupo
através da educação, da persuasão, de incentivos e da crença na ciência.
Se isto não funciona, há que implementar proibições e restrições. Se
também estas falharem, há que tornar as vacinas obrigatórias.
No
tipo de sociedade altamente polarizada em que actualmente vivemos,
propensa a politizar a maioria das questões, e onde o bom senso, ou
mesmo qualquer tipo de senso, é às vezes escasso, os governos tiveram de
adoptar medidas mais drásticas. As pessoas não vacinadas estão agora
sujeitas a medidas discriminatórias. No entanto, o número de pessoas não
vacinadas em alguns países permanece persistentemente alto. Deverá o
próximo passo ser o da obrigatoriedade da vacinação?
Os
defensores dos direitos individuais argumentam que esta decisão está
apenas a um passo de prender as pessoas e vaciná-las à força – o
argumento do terreno escorregadio. Se permitirmos, hoje, a
obrigatoriedade das vacinas, que garantias teremos de que o Estado se
fique por aí e de que não venha a obrigar as pessoas a submeterem-se a
imunizações indesejadas no futuro? As vacinas obrigatórias, nesta linha
de argumento, abrem a porta a políticas futuras do tipo das que causaram
o Holocausto – a razão pela qual muitos “anti vax” usam a estrela
amarela de David.
A
maior fragilidade do Utilitarismo é o facto de não respeitar os
direitos individuais. Ao centrar-se apenas na soma das satisfações, pode
atropelar os direitos dos indivíduos. Todos aqueles que são contra as
vacinas dizem que torná-las obrigatórias é desrespeitar a sua dignidade
intrínseca enquanto seres humanos, argumentam que são soberanos,
autónomos e que têm todo direito de o ser. Quem melhor do que eles
próprios para decidir se querem ou não ser vacinados? De certo modo,
poder exercer a sua livre escolha de não ser vacinado é um sentimento
profundamente americano e liberal: é a crença teimosa de que os
indivíduos sabem melhor do que o governo o que é melhor para eles. Além
de tudo isto, o direito que assiste qualquer paciente de controlar o que
se passa com o seu corpo é um princípio fundamental para as comunidades
médicas em todo o mundo.
Os
activistas dos direitos liberais acreditam que estamos a atravessar um
período arrepiante que põe em causa toda a relação entre o estado e o
indivíduo, que confere ao estado um poder de tal forma extraordinário
que até lhe permite agora decidir que substâncias os seus cidadãos podem
ou não injectar nos seus corpos, e que fragiliza politicamente e de tal
forma o indivíduo, que não só o torna desprovido de direitos, como o
faz perder o direito de soberania sobre si mesmo, sobre aquela minúscula
parte do mundo constituída pelo seu próprio corpo e mente. Acreditam
que estamos a assistir à morte violenta do liberalismo europeu e a
sofrer as dores do parto de uma era nova e profundamente autoritária.
Para
eles as vacinas obrigatórias significam o fim da liberdade como a
conhecemos. A autonomia física é a pedra basilar da autodeterminação e a
autodeterminação é o que dá sentido à liberdade. Se nos sentimos
privados do poder de soberania sobre o nosso próprio corpo e sobre a
nossa mente, então não somos de facto livres de forma significativa. As
regras instituídas pelo estado, que determinam que apenas aqueles que
recebem uma certa forma de tratamento médico possam desfrutar da
liberdade, condicionam a própria liberdade tornando as nossas acções
dependentes de permissão governamental.
Há
aqui duas liberdades em rota de colisão: a liberdade dos
“anti-vacinas”, contra a liberdade do resto dos membros da sociedade que
são vacinados (a maioria em certos casos). Mas, e se os “anti-vax”
estiverem certos? E se estas vacinas acabarem por vir a ter
consequências funestas a longo prazo que os cientistas e virologistas
desconhecem e não podem prever agora? Este argumento ganha um peso
especial quando discutimos a vacinação de crianças a partir dos cinco
anos de idade. Se esta faixa etária tem menos probabilidade de adoecer
gravemente devido à Covid-19, será que se justifica que sejam vacinados
para proteger a população mais velha? Será que não estamos a usar a
vacinação infantil como um meio para atingir um fim (o de proteger os
idosos e os enfermos) em vez de encararmos as crianças como fins em si
mesmo?
Terão
os governos o direito de exigir legalmente maior cooperação das suas
populações em termos de saúde pública? Afinal, aquele que optou pela não
vacinação, decidiu infligir um dano evitável e injustificável à sua
família, amigos, vizinhos, comunidade, país e planeta, infringindo assim
não só o direito dos outros à sua própria saúde, mas também o direito
de não ter de suportar confinamentos futuros que lhes restringem os
movimentos e poderão custar-lhes o sustento. Mesmo que acreditemos que
os indivíduos sabem, melhor do que os governos, o que é melhor para si
mesmos, será que este é um argumento válido para ser levado em
consideração quando a sociedade como um todo enfrenta uma pandemia?
Quando
o direito de escolha de uma pessoa pode prejudicar as outras,
limitar-lhe esse direito poderá constituir uma posição ética. Por isso
mesmo, temos limites de velocidade e sinais de stop; ambos limitam o
nosso direito de conduzir como desejamos, mas são necessários para a
segurança pública. Outros exemplos incluem leis sobre fumar em aviões,
disparar uma arma numa área urbana e assim por diante. É, pois, o risco
de prejudicar outras pessoas – interferindo na sua liberdade de se
sentirem seguros ao volante, no direito de respirarem ar puro ou de não
levarem um tiro – que torna ético impor limites às escolhas pessoais.
Além do mais, esta não seria a primeira vez que se instituiriam vacinas
obrigatórias. A maioria das escolas públicas não admite crianças que não
tenham o seu esquema de vacinação completo. Foi assim que conseguimos
erradicar o sarampo, a varíola e outras doenças igualmente
desagradáveis. Então por que razão é polémica a obrigatoriedade da
vacinação contra a Covid-19 e porque é contestada pelos militantes
anti-vacinas?
Os
“anti vax” argumentam que o estado não tem o direito de ditar os riscos
que as pessoas decidem correr com os seus corpos e vidas. Todavia,
sabemos que os seres humanos nem sempre são muito bons a calcular
riscos. Se considerarmos que a probabilidade de contrair paralise facial
por causa da vacina contra a Covid-19 é de 8 em 10.000, e que, desde o
início a Covid-19 matou cerca de 1.5 em cada 100 portugueses, o
exercício de aritmética mortal é muito fácil de fazer – e argumenta
fortemente a favor das vacinas, mas muitos dos que as contestam
continuam a preferir fixar-se no argumento dos riscos da vaçina e
ignorar completamente que têm uma probabilidade muito maior de morrer se
não se fizerem vacinar.
Outros
temem a vacina por não confiarem na indústria farmacêutica, que
acreditam ser corrupta, e por acharem que esta desenvolveu uma vacina
contra o coronavírus perigosamente rápida demais. Alguns até suspeitam
de que está de conluio com médicos e governos, num ciclo sombrio de
lucro e sigilo. Este medo da medicina nefasta talvez até seja
compreensível num mundo onde as mentiras e a ganância das empresas
farmacêuticas geraram, uma epidemia de opiáceos que matou quase meio
milhão de pessoas. Compreensível, sim, mas não totalmente racional. Faz
sentido que percamos a fé absoluta em todos os cientistas, virologistas e
médicos, por erros cometidos no passado?
Outros
ainda apontam a questão da eficácia. As vacinas não impedem que se
contraia o vírus. É verdade. Mas, também é verdade que, aqueles que são
vacinados têm menos probabilidades de contrair o vírus, e que se forem
infectados, terão muito menos possibilidades de apresentar sintomas
graves, que exijam hospitalizações e, em algumas circunstâncias, à
morte.
Aqueles
de nós que, como eu, são pró-vacinação e liberais, deveriam temer e
permanecer vigilantes face à possibilidade do estado prepotentemente
poder vir a invadir áreas antes consideradas invioláveis. No entanto, a
vida em sociedade obriga ao estabelecimento de limites. A minha
liberdade termina onde a sua começa. Não tenho liberdade para correr nua
em praça pública, conduzir sob o efeito do álcool ou colocar a vida de
outras pessoas em perigo. Embora a obrigatoriedade das vacinas me
incomode, acredito que é um mal necessário para garantir o bem-estar
social e os direitos inalienáveis à vida, à liberdade e à persecução
da felicidade.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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