Gabriel Boric vai ter que decidir se veste manto completo da nova esquerda, com forte identidade ecológica, ou mostra jogo de cintura. Vilma Gryzinski:
“Meu
compromisso é cuidar da democracia todos os dias da minha vida”. Foram
as palavras mais promissoras do discurso da vitória de Gabriel Boric.
Ele
também disse que “o crescimento econômico que se assenta na
desigualdade profunda tem pés de barro”. Quem pode discordar? Não existe
nenhum país de primeiro mundo com níveis extremos de desigualdade como
os da América Latina, um dos mais complexos problemas que temos.
Resolvê-lo,
obviamente, tem propostas divergentes e os chilenos – principalmente as
chilenas, que na faixa abaixo dos 30 anos, deram 70% de seus votos a
ele – endossaram as propostas do presidente eleito.
Algumas das ideias de Boric, em suas próprias palavras, principalmente numa ótima entrevista ao Bloomberg:
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“Diante dos incêndios na Amazônia, Bolsonaro se autodenominou ‘capitão
motosserra’ e culpou as ONGs pela catástrofe. Bolsonaro é um perigo para
o meio-ambiente e para a humanidade”.
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“Quando a Amazônia está queimando e sendo desflorestada e Jair
Bolsonaro diz que ninguém me fala o que fazer em meu país, eu digo a
ele: ‘Companheiro, não é só o seu país, você está destruindo o que
pertence a toda a humanidade”.
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“Eu me sinto parte de uma tradição de esquerdismo na América Latina e
espero que consiga fomentar uma nova cooperação, a partir do sul, para
enfrentar os desafios que toda a humanidade tem pela frente. E a
prioridade número um para a humanidade é o aquecimento do planeta”.
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“No nível político e sócio-econômico, o Chile dos anos oitenta foi o
berço do experimento neoliberal. Quando se redemocratizou, não mudou o
sistema. Seus excessos foram controlados, mas não sua essência.
Precisamos de um novo modelo de desenvolvimento em que a criação de
riqueza não se baseie primordialmente na mineração”.
. “Precisamos quebrar e descentralizar a concentração de riqueza e incluir uma perspectiva ambiental”.
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“Visitei a Venezuela em 2010 e não é este o rumo que quero seguir. Eu
quero um lugar onde as regras sejam claras e onde possamos redistribuir
as riquezas de forma melhor. Hoje, no Chile e no mundo, precisamos mudar
a forma como entendemos o desenvolvimento”.
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“Aos investidores estrangeiros, eu digo que qualquer um que deseje
investir de forma ambientalmente sustentável, com boas condições
trabalhistas, que produza transferência de tecnologia e de cadeias de
produção, é mais do que bem-vindo”.
Problema:
o dinheiro estrangeiro já está saindo do Chile, tanto de investidores
de fora quanto de chilenos que querem proteger seu patrimônio. A bolsa
despencou e o dólar subiu depois da vitória do candidato esquerdista.
São reações previsíveis, imediatistas, mas não dá para prever dias
tranquilos pela frente para os chilenos nem muito menos para o próprio
Boric.
O
cientista político argentino Héctor Schamis, professor em Cornell,
escreveu no Infobae um resumo do que está à espera dele quando se tornar
presidente:
“Terá
que resolver uma posição fiscal complexa, recuperar a confiança do
investidor estrangeiro, motor do crescimento econômico sustentável,
definir um sistema de aposentadorias equilibrado, abordar as frustrações
dos jovens, tragédia de hoje no Chile e em todas as partes”.
“Terá
que gerar governabilidade sem a leis das leis, a nova constituição está
em processo. E terá que ser presidencial, além de ser presidente,
neutralizando as tentativas do Partido Comunista de governar dos
bastidores. Se o PC pudesse, o comeria cru”.
Sem contar salvar a Amazônia e o mundo, tarefas que ele também, indiretamente, se atribui. Vai ser uma jornada e tanto.
BLOR ORLANDO TAMBOSI
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