Graças à restrição a qualquer discussão sobre a teoria de que a covid-19 pode ter vazado de um laboratório em Wuhan, pessoas no mundo todo foram submetidas ao silenciamento à moda chinesa. Brendan O'Neil, da Spiked, para a revista Oeste:
Nos
últimos meses os moradores da China não foram os únicos a ser proibidos
de falar mal do regime chinês. O mesmo ocorreu com bilhões de pessoas
mundo afora. Graças ao Facebook e à sua restrição a qualquer discussão
sobre a teoria de que a covid-19 pode ter sido “fabricada” ou pode ter
vazado de um laboratório em Wuhan, pessoas nos Estados Unidos, na
Inglaterra, na França e no mundo todo foram submetidas ao silenciamento à
moda chinesa. Elas foram basicamente impedidas de dizer qualquer coisa
que pudesse constranger o Partido Comunista Chinês. Os chefões
supostamente descolados e cool da World Wide Web ajudaram a globalizar a
repressão do PCC ao pensamento livre e ao debate aberto.
Precisamos
falar sobre isso. O Facebook agora retirou as restrições a posts que
descrevem a covid-19 como “artificial” ou “fabricada” ou que dizem que o
vírus escapou de um laboratório — o Instituto de Virologia de Wuhan,
para sermos exatos. Isso pavimentou o caminho para seus 2,7 bilhões de
usuários discutirem livremente a possibilidade de a covid-19 ter surgido
em uma instalação científica, e não em uma tigela de sopa de morcego.
Mas esse não deveria ser o fim da questão. Não deveríamos casualmente
esquecer o fato de os bilionários supostamente antenados do Vale do
Silício terem passado meses apagando de suas plataformas especulações
sobre atos ilícitos ou descuidos em relação à covid-19. Porque essa
questão dramática, essa aliança tão infeliz entre os tecnocratas da
Califórnia e os autocratas de Pequim, joga luz na loucura e nos perigos
da censura on-line.
Não
vai ser um choque para ninguém que tem prestado atenção que a retirada
da proibição sobre as teorias do vazamento do laboratório coincidiu com o
pedido da administração Biden para um esforço concentrado para revelar
as verdadeiras origens do vírus. Ambos aconteceram exatamente no mesmo
dia. O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, instruiu agentes do
serviço de informação a “redobrar” seus esforços para descobrir de onde
veio a covid-19 — e, voilà, o Facebook disse que não ia mais apagar nem
acrescentar um aviso aos posts que diziam que a covid-19 foi fabricada
ou veio de um laboratório. Ninguém poderia ter pedido uma prova melhor
da relação bizarra e confortável entre o Vale do Silício e o
establishment democrático. Ou, em termos mais flagrantes — e exatos —,
entre as pessoas que controlam a esfera pública do século 21 e o
político mais poderoso do planeta: Joe Biden. Que os facilitadores da
discussão pública no mundo moderno sejam orientados sobre o que é
aceitável pensar e dizer em Washington deveria assustar qualquer um que
acredita em liberdade de expressão e diversidade de pensamento.
No
último ano, qualquer pessoa que considerasse a possibilidade de que a
covid-19 tivesse vindo de um laboratório, e não de um mercado, era
denunciada como louca. Ele ou ela corria o risco de ser enclausurado na
cadeia do Facebook — ou seja, ser impedido de postar por 30 dias — e se
tornar motivo de riso de todos os sabichões do reino do Twitter. “Idiota
que acredita em teorias da conspiração” era basicamente o nível da
discussão que se podia esperar se você quisesse saber se o novo
coronavírus veio de um laboratório, e não de um morcego, para o público
em geral. No entanto, houve uma reviravolta. Talvez as teorias dos
laboratórios não sejam tão absurdas, dizem os comentaristas. A teoria do
vazamento de laboratório está “ganhando força”, diz o Independent, um
jornal que antes colocava a conversa do laboratório sob o título de fake
news.
Claro,
ainda pode ser verdade que a ideia de a covid-19 ter vazado do
Instituto de Virologia de Wuhan não seja real. E me parece que a
afirmação que está circulando pelas margens da internet — de que a China
desenvolveu o novo coronavírus de propósito e depois o espalhou pelo
mundo para prejudicar seus concorrentes globais —, além de totalmente
maluca, não conta com nenhuma evidência. Mesmo a sugestão de que o vírus
tenha vazado acidentalmente do laboratório de Wuhan — onde ele talvez
estivesse sendo estudado, ou possivelmente até modificado e
intensificado — está longe de ser fundamentada. Nas palavras do
professor Dale Fisher, membro da equipe da OMS que visitou Wuhan para
tentar descobrir mais sobre o surgimento dessa pandemia, existem poucas
evidências concretas desse cenário. “A teoria do vazamento do
laboratório não está totalmente fora de cogitação, [mas] é preciso fazer
mais pesquisas”, disse ele.
Assim,
qualquer um que esteja furiosamente se conectando às suas redes sociais
para dizer “A CHINA INVENTOU ESSE VÍRUS” ainda está sendo um pouco
cretino. (Claro, eu defendo o direito de alguém ser cretino.) E, sem
dúvida, é triste que a teoria do vazamento do laboratório tenha sido
atrelada a um sentimento anti-China mais amplo que considera essa nação
como uma força maligna, que constantemente transforma a vida dos
ocidentais num inferno. E, no entanto, a falta de provas da teoria do
laboratório não é justificativa para silenciá-la ou desqualificá-la.
Pelo contrário, é exatamente quando as coisas estão incertas,
desconhecidas, em movimento, que precisamos do máximo de liberdade de
expressão para tentar determinar que diabos está acontecendo.
A
aparente convicção do Vale do Silício de que algo, se não foi provado,
deve ser censurado é uma idiotice retrógrada da pior forma. Como essa
gente acha que se chega à verdade? Por magia? Por decreto? Por
pronunciamentos de Wuhan ou Pequim? A liberdade de pensamento e
expressão é o meio pelo qual descobrimos a verdade do nosso mundo.
Especulação, investigação, teoria, debate, descoberta — essas são as
ferramentas que nos permitem pesar as coisas, separar os fatos da
ficção, entender o que é falso e o que pode ser verdade. A censura
explicitamente prejudica esse processo ao sufocar o questionamento livre
e reduzir o público a recebedores passivos da “verdade” elaborada pelas
pessoas no poder. Essa é a receita para um dogma, não para a
descoberta; para a ignorância, não para a iluminação.
Essa
é a triste ironia da censura criada para combater “teorias da
conspiração”, que foi a justificativa para a restrição nas redes sociais
da teoria do laboratório. A censura tem muito mais chance de inflamar e
encorajar a imaginação conspiratória do que de contê-la. A censura
incentiva a ignorância. Ao esconder certos fatos ou certas ideias e
teorias, a censura desencoraja o uso das habilidades críticas das
pessoas para descobrir a verdade, preferindo nos dizer: “Fique quieto.
Tenha paciência. Vamos contar para você quando descobrirmos”. Essa
pacificação elitista da vida pública — esse desmantelamento dos
questionamentos de massa — tem o efeito de fazer as pessoas pensarem
“devem estar escondendo alguma coisa” ou de nos convencer a não pensar
demais sobre certas questões porque elas estão além do nosso nível
intelectual. Nenhum desses estados de medo leva à busca pela verdade.
A
verdade só pode ser revelada por meio da verdade. O filósofo e
economista britânico John Stuart Mill sabia disso. Em A Liberdade, ele
argumenta que “a completa liberdade de contradizer e desaprovar nossa
opinião é exatamente a condição que justifica que assumamos sua
veracidade para propósitos de ação; e não será com base em quaisquer
outros termos que um ser com as faculdades humanas poderá ter qualquer
segurança racional de estar com a razão”. Ou seja, é só quando
submetemos nossas crenças e teorias à discussão mais ampla possível —
talvez até à ridicularização e à zombaria e às críticas ferinas — que
podemos verdadeiramente testá-las e melhorá-las e, um dia, decidir que
devem estar certas (ou erradas). Esse é o caso para a ciência em
especial, cuja força depende de processos livres e rigorosos de
refutabilidade. Ao remover a “teoria do laboratório” da discussão e do
debate de sua vasta plataforma, o Facebook revelou a curiosa combinação
de arrogância e atitude defensiva que é a essência vital da crença
mortal da censura política.
Prefiro
viver num mundo em que supostas teorias da conspiração correm soltas do
que em um mundo onde algum ricaço ou um especialista cheio de diplomas
que nunca conheci decide que preciso ser protegido dessas teorias. Os
teóricos da conspiração não fazem nada mais do que me desafiar — me
desafiar a provar que eles estão errados, a reunir os fatos, a articular
com o máximo de clareza o que considero ser a verdade sobre um assunto.
O censor, por outro lado, insulta a minha existência. Ele me transforma
em uma criança. E diz: “Não pense. Não questione. Não use suas
faculdades morais e mentais para descobrir o que é verdade e o que é
falso. Vou fazer isso por você”. Prefiro a irritação das teorias da
conspiração on-line à infantilização da censura do Vale do Silício em
qualquer circunstância.
A
censura do Facebook sobre a teoria do vazamento do laboratório foi
errada, imoral e ofensiva. Ela frustrou o questionamento intelectual
público e deu ao regime chinês um passe livre. Nossas redes on-line são
governadas por pessoas que confiam mais nas autoridades de Pequim do que
na população de sua própria nação. Isso é genuinamente assustador, e
não podemos deixar passar.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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