Agora no “rastro do dinheiro”, a CPI da Covid obteve documentos
mostrando que a empresa Precisa Medicamentos, que atuou como
intermediadora na negociação entre o Brasil e a Bharat Biotech para a
aquisição da vacina Covaxin, recebeu R$ 500 milhões do contrato de R$
1,6 bilhão fechado pelo governo brasileiro com o laboratório indiano, ou
seja, um terço do valor total previsto no documento, firmado em 25 de
fevereiro.
Mesmo antes de ter qualquer tipo de aval regulatório, a vacina já era apontada pelo presidente Jair Bolsonaro como escolhida para integrar o Programa Nacional de Imunização (PNI), enquanto outras candidatas mais adiantadas, mais baratas e com estudos no Brasil, ficaram fora.
NÃO FEZ PAGAMENTO – Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que não realizou o pagamento dos imunizantes, “pois é realizado somente após a entrega das doses contratadas, conforme consta em contrato com o laboratório Precisa Medicamentos”.
O Correio entrou em contato com a Precisa Medicamentos, mas não recebeu resposta até a última atualização. A empresa firmou uma parceria no ano passado com a Bharat e tornou-se a representante oficial da farmacêutica no Brasil. Em janeiro deste ano, a Bharat assinou um acordo com a Precisa para fornecimento da Covaxin ao Brasil.
A informação sobre os valores envolvidos na compra da Covaxin foi obtida pelo Correio e confirmada pelo senador Alessandro Vieira (sem partido-SE).
MAIS ESCLARECIMENTOS – “A gente está, inclusive, convocando pessoas ligadas à Precisa para que possam prestar mais esclarecimentos para a gente entender”, afirmou.
“A negociação da Precisa é totalmente diferente de todas as outras. É a única que tem intermediação; é por um valor mais elevado do que a média das outras e é muito mais rápida do que as outras. A gente tem de aguardar mais dados para aprofundar, mas é uma contratação que chama muita atenção.”
Relator da comissão, o senador Renan Calheiros (MDB-AL), questionado sobre a Precisa, também afirmou que a empresa atuou como intermediadora entre o governo e a farmacêutica indiana, obtendo R$ 500 milhões do total do contrato.
QUEBRA DE SIGILO – Nesta semana, a comissão aprovou a quebra de sigilo telefônico e telemático de Francisco Emerson Maximiano, sócio da empresa, e do representante dela, Túlio Silveira.
A vacina ainda sofre restrições de importação, ficando permitido, no início de junho, somente o uso sob condições controladas, concessão que pode ser suspensa “caso o pedido de uso emergencial em análise pela Anvisa ou pela Organização Mundial da Saúde (OMS) seja negado, ou ainda com base em informações provenientes do controle e do monitoramento do uso da vacina Covaxin no Brasil”, como informa a Anvisa.
CAIU EM EXIGÊNCIAS – A autorização restrita ocorreu após dificuldades de aprovação. No fim de março, o certificado de Boas Práticas e o uso emergencial foram negados pela Anvisa. Na justificativa, o relator da 5ª diretoria e relator do processo, Alex Machado Campos, apontou inconsistência na documentação.
Segundo ele, “a área técnica identifica riscos e incertezas no uso da vacina Covaxin nas condições atuais”, de maneira que não foi possível determinar “a relação benefício risco com as informações disponíveis até o momento”.
A vacina estava programada para chegar em março, mas somente esta semana teve a Certificação de Boas Práticas de Fabricação das plantas aprovadas, um dos primeiros passos para a regularização do imunizante.
OPÇÃO MAIS CARA – Mesmo assim, o governo escolheu fechar contrato de 20 milhões de doses da Covaxin, a R$ 80 cada, a mais cara entre as opções mais adiantadas: CoronaVac e Pfizer. Além disso, o acordo ocorreu com dispensa de licitação “para facilitar o processo de aquisição”.
As negociações já estavam avançadas em janeiro, quando Bolsonaro, em carta enviada ao primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, afirmou que a Covaxin estava “entre as vacinas selecionadas pelo governo brasileiro”, citando, também, o imunizante da AstraZeneca com a Universidade de Oxford.
A carta é de 8 de janeiro, foi divulgada pela imprensa, à época, e nela o presidente pede urgência no envio de 2 milhões de doses da AstraZeneca.
INTERMEDIÁRIA – Os senadores apontam que a Precisa chama atenção por ter atuado como “intermediadora” ou “facilitadora” da aquisição da Covaxin. Analisam com estranheza, também, o fato de Bolsonaro ter feito um movimento direto em busca dessa vacina.
Questionado pelo Correio se existe uma relação entre Bolsonaro e representantes da Precisa que demonstre qualquer benefício monetário ilícito, o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) respondeu ser uma hipótese com a qual a comissão trabalha.
“Já ficou evidente a contradição do tratamento do senhor presidente da República com a Precisa para com os outros imunizantes”, disse. O senador ressaltou que o chefe do Planalto fez uma intervenção direta apenas para essa vacina.
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