Apesar de de pouco apelo popular, agenda centrista de responsabilidade social e fiscal deve ser influente nas eleições de 2022. Fernando Dantas para o Estadão:
O
candidato, ou a candidata, de terceira via para a eleição presidencial
de 2022 ainda não surgiu, e há dúvidas se haverá algum nome competitivo
fora da polarização entre bolsonarismo e petismo.
De
qualquer forma, há indiscutivelmente uma agenda socioeconômica de
terceira via, que é um parâmetro forte para formadores de opinião e o
establishment em geral, e que estará presente na eleição do próximo ano –
caso haja ou não um candidato decidido a apoiá-la.
Na
verdade, Lula e até Bolsonaro podem, na campanha de 2022, endossar
parcial ou totalmente a agenda socioeconômica da terceira via. Não se
quer dizer que é provável que isso ocorra, mas sim que o debate político
no Brasil é tão pouco programático que mesmo adversários ferozes podem,
se quiserem, reclamar para si a mesma plataforma.
E
qual é a agenda socioeconômica da terceira via? Basicamente, é a de
retomar o fio da meada dos melhores momentos de gestão pública da
redemocratização, que ocorreram em distintos governos.
Foi
quando se procurou combinar responsabilidade fiscal e social, com
políticas macroeconômicas sólidas e foco em reduzir a pobreza e a
desigualdade.
O
auge dessa agenda foi atingido no primeiro mandato de Lula, o que o
torna em tese um candidato que poderia facilmente abraçar a plataforma
da terceira via, mesmo sendo visto como representante de um dos polos
hoje em combate.
Existe,
porém, um complicador na agenda da terceira via: o crescimento
econômico. Sem um ritmo acelerado de expansão do PIB, o combate à
pobreza e à desigualdade como objetivo sustentável de médio e longo
prazo se torna inviável. Isso implica, claro, que o crescimento forte
tem igualmente que ser sustentável.
Não
foi à toa, portanto, que o melhor momento do governo Lula foi
justamente quando o superciclo de commodities acelerou o crescimento
brasileiro para um ritmo bem superior ao da média das últimas décadas.
Há
um debate entre os economistas sobre os caminhos para o Brasil acelerar
o crescimento econômico. Na ponta mais ortodoxa, acredita-se que a
receita é arrumar a casa macro e microeconômica e “deixar a coisa
acontecer”.
Já
economistas heterodoxos creem na necessidade de um “algo mais”, que vai
de um mix mais estimulante de políticas fiscal, parafiscal e monetária
até políticas industriais.
Quando
se pensa na agenda socioeconômica de terceira via, o que define a
inclusão nesse campo não é o lado do debate descrito acima, mas sim a
razoabilidade do que se propõe.
É
possível pensar em mudança do teto de gastos, alguma gestão de demanda,
ampliação e ordenamento do investimento público e políticas de
incentivo tecnológico combinando-se com ajuste fiscal de médio e longo
prazo e controle da inflação.
Por
outro lado, pregar a volta do Estado desenvolvimentista (à la Ciro), a
inexistência de restrição fiscal, “mágicas” com a dívida pública e o fim
do sistema de metas de inflação é claramente uma postura hostil à
terceira via socioeconômica no caso brasileiro.
No
campo oposto, propostas de um liberalismo radical e antiquado, caras ao
ministro Paulo Guedes, mas que ele nunca conseguiu emplacar, também se
afastam da razoabilidade centrista. Aqui se podem citar iniciativas
privatizantes de serviços tradicionais do Estado como saúde e educação
básica.
A
terceira via de políticas econômicas e sociais tem baixo apelo
eleitoral no Brasil, ainda mais se considerando o momento de polarização
pelo qual passa o País.
Entretanto,
como já mencionado, depois de hecatombes econômicas, como a recessão de
2015-16 e a estagnação que se seguiu, e políticas, como a experiência
do bolsonarismo no poder, existe no establishment, nas elites política e
econômica, na mídia mais respeitável e em boa parte dos formadores de
opinião um consenso a favor de moderação, racionalidade e combinação de
responsabilidade fiscal e social.
Quer
queiram ou não, os candidatos em 2022 serão medidos por essa régua. Não
será preciso se submeter a ela para se eleger, porque o eleitorado
estará consumido por outras paixões, mas será muito difícil governar com
sucesso ignorando-a.
Há
pelo menos a esperança de que algum ou alguns dos candidatos
competitivos no próximo ano, mesmo que não façam da terceira via uma
arma de campanha, busquem não se distanciar dessa visão socioeconômica
que marcou os melhores momentos do País desde a redemocratização.
A terceira via pode não ser um sucesso estrondoso de público, mas ela está longe de morta em termos políticos.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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