Em entrevista exclusiva ao Correio Braziliense,
o presidente eleito Jair Bolsonaro fala da montagem de seu governo,
reafirma o papel dos militares no ministério e sinaliza reformas, a
começar pelas mudanças na Previdência. Também fez críticas aos petistas e
ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso:
Em entrevista exclusiva, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, avisa
que seus ministros terão carta branca para nomear seus secretários,
diretores das delegacias regionais e por aí vai. “O que estou cobrando
dos ministros é produtividade”, diz ele, sentado na pequena varanda
improvisada na entrada de sua casa, com uma mesa redonda de madeira
transformada em cenário para a entrevista à Rede Vida de Televisão, com
tempo cronometrado: 15 minutos. “Precisa de terno? Não, né?”, pergunta
ele, à vontade com a camisa de manga curta amarela, uma das cores da sua
campanha, e calça jeans. A Embaixada do Brasil em Cuba parece estar com
os dias contados: “Qual negócio podemos fazer com Cuba?”, pergunta, ao
criticar a forma como os profissionais da ilha ficam apenas com parte
dos salários do programa Mais Médicos. Antes de começar a gravação,
avisa: “Não posso errar, senão o PT volta”.
As críticas, agora, não se restringem ao PT. Ao falar da importância
que dará ao Ministério da Defesa, Bolsonaro emenda com uma crítica
direta ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O simples fato de
colocar um general de quatro estrelas (Augusto Heleno) para ocupar o
posto, diz, dará aos militares garantia de um assento em reunião
ministerial: “A criação do Ministério da Defesa foi para tirar os
militares da mesa ministerial”, acusa. O presidente eleito garante que
as Forças Armadas, “o último obstáculo para o socialismo”, serão
chamadas a participar da concepção de políticas públicas e propostas em
várias áreas do governo.
Esta semana ainda, apesar do feriado, Bolsonaro pretende indicar mais
um ministro, mas não tem pressa em anunciar todos. Também decidiu não
mais juntar as pastas de Meio Ambiente e Agricultura. Porém, isso não
significa que colocará na primeira alguém com o perfil de Marina Silva
ou Sarney Filho: “Quem vai indicar é o senhor Jair Bolsonaro”.
Na semana que vem, ele estará em Brasília, a cidade que lhe deu mais
de 70% dos votos. Será a primeira vez que virá à capital da República
depois da eleição. Vai cuidar da transição e visitar os presidentes dos
Três Poderes, mas na quinta-feira retornará ao Rio de Janeiro. Quanto à
posse, o mais provável é que desfile em carro fechado, uma vez que
decidiu seguir “religiosamente” as determinações dos serviços de
inteligência da Polícia Federal, da Abin e do Exército.
Durante a campanha, o foco na segurança pública foi muito grande. O
governador do Rio de Janeiro fala em atiradores de elite. É por aí que
temos de encarar o crime no Brasil?
A forma de engajamento do Exército Brasileiro no Haiti era exatamente
essa. Elemento armado com um fuzil passa a ser um alvo. Temos
vivenciado aqui no Rio momentos parecidos, verdadeiro bonde de pessoas
armadas com fuzil. Como enfrentar esse tipo de gente? Não vai ser com
flores nem com “entregue suas armas”. Agora, estamos numa área urbana.
Numa troca de tiro aqui, o efeito colateral seria desastroso. O que eu
defendo é uma retaguarda jurídica para o policial ou para o homem das
Forças Armadas, uma vez em operação de GLO (Garantia da Lei e da Ordem).
Que não se preocupe com uma possível condenação na frente por estar
cumprindo a missão. E, para o cidadão comum, tenhamos também garantia da
posse de arma de fogo, levando-se em conta o referendo de 2005. Dois
terços da população decidiu pelo direito de comprar armas e munições.
Então, o presidente ou quem quer que seja não tem o direito de frustrar
essa vontade popular. Obviamente, a posse de armas de fogo com alguns
critérios. Ficha criminal, estar em dia com a Justiça, exame
psicológico, exame prático e o registro da arma passa a ser definitivo e
não temporário, como é no momento.
O senhor disse que o ministro Sérgio Moro terá liberdade para
nomear secretários e cargos dentro do Ministerio da Justiça e da
Segurança Pública. A mesma carta branca será dada a outros ministros?
O que estou cobrando dos ministros é produtividade. Igual ao Paulo
Guedes: sentei à mesa com ele. Quando eu falei que não entendia de
economia, pensei que a imprensa fosse levar para o lado da minha
humildade, e é verdade. Ou será que eu tenho que entender de medicina
para nomear o ministro da Saúde? Então, é inflação baixa, dólar
compatível para exportação-importação, a taxa de juros, é não aumentar a
dívida interna, que está chegando próxima a R$ 4 trilhões, não aumentar
a carga tributária. Perguntei: é possível? Ele falou: é. Bem, ele é uma
pessoa renomada dentro e fora do Brasil. Nunca integrou governo nenhum.
Nós temos que acreditar nele. Não temos alternativa, porque, como está o
Brasil, a tendência é quebrar, é se transformar numa Grécia. Então,
essa carta branca ele tem.
O ministro Marcos Pontes cuidará também do ensino superior,
deixando o Ministério da Educação só com o ensino médio e fundamental?
Essa é a ideia: as universidades têm que produzir. Você pega as 200
melhores universidades do mundo, o Brasil não está nesse bolo. As nossas
universidades têm que produzir mais. O que falta aí? O que acontece em
grande parte com a total independência dos reitores? É um inchaço de
funcionários. É uma missão difícil para ele. Mas nós temos que começar a
mudar essas coisas e ele tem competência, no meu entender, e retaguarda
e liderança para isso. Quero ver qual a produtividade deles. A mesma
coisa quando se fala em educação no Brasil. Vamos abolir a filosofia do
Paulo Freire. Não deu certo. Em 13 anos de PT, dobrou-se o gasto com
educação e a qualidade diminuiu. Então, é sinal de que está dando
errado.Se estivesse dando certo, seguiríamos nessa linha.
Como o senhor tratará os partidos de oposição?
Tenho falado o seguinte: se alguém tiver alguém melhor que o Paulo
Guedes, que o Heleno, que o Moro, apresente. Nós vamos discutir. Quero o
melhor para o Brasil. Tenho conversado muito com os parlamentares,
antes inclusive de entrar em campanha. Ultrapassamos em 120 o número de
parlamentares na reta final, tivemos o apoio das bancadas da
agricultura, evangélica. Então, temos tudo para ter um pacotão de
medidas no início do mandato, que o Congresso venha a aprovar sem
maiores percalços. A não ser os partidos tradicionais de esquerda que,
ao que parece, vão fazer oposição pela oposição, como sempre fizeram ao
longo dos 28 anos que em estou dentro da Câmara.
O senhor já disse que quer votar alguma coisa da reforma da
Previdência neste ano, mas ouvimos de muitos parlamentares que esse
Congresso perdeu a legitimidade para aprovar emenda constitucional,
porque a renovação foi de 47%. O que dá para aprovar, se é que dá para
aprovar alguma coisa?
Vou ver o último relatório, analisar o que dá para brigar para que
seja votado, ou que podemos tirar. O que eu tenho dito para todo mundo é
que alguma coisa tem que ser aprovada. Tem que dar um passo, por menor
que seja. Já facilita a vida de quem vai assumir no início do ano que
vem.
A estrutura do seu governo está sendo montada para pelo menos três
ministérios fortes. Queria saber sobre a Defesa. O que será agregado de
funções novas?
A intenção da criação do Ministerio da Defesa, no fim do milênio
passado, era tirar os militares da mesa ministerial, no governo Fernando
Henrique Cardoso. Tirar da mesa porque os militares presentes ali
incomodavam os ministros, alguns ministros, de Fernando Henrique
Cardoso, que nunca demonstrou qualquer respeito para conosco. Tanto é
que nosso sucateamento se agravou muito no governo FHC e continuou em
parte no governo Lula. É uma questão de revanchismo, aquilo, até mesmo a
criação da comissão de desaparecidos, a Comissão da Verdade. O objetivo
de bater nos militares é que, na verdade, nós somos o último obstáculo
para o socialismo. Então, é na intenção ideológica o que vinha sendo
feito. A mudança agora começa com um general de quatro estrelas à frente
dele.
O senhor já fechou o número de ministérios? Fica em 15 mesmo?
No máximo 17, porque talvez Agricultura e Meio Ambiente não se
fundam. A gente quer o melhor. Sempre houve uma briga entre esses dois
ministérios, com o Meio Ambiente sofrendo pressões de ONGs
internacionais, gente de fora. A questão de licenças ambientais. Vai
você querer fazer uma pequena central hidrelétrica na sua fazenda, vai
levar 10 anos para ter a licença. Isso tem que acabar. Essa briga, essa
forma xiita de procedimento por parte do Ministério do Meio Ambiente,
tem que deixar de existir. Hoje em dia, parte dos fiscais, não são
todos, chega numa propriedade e arranja uma multa para cima do produtor
rural. Isso tem que deixar de existir. Uma das ideias seria a fusão, mas
como estou vendo que está dando uma certa reação, até mesmo por parte
do homem do campo, a tendência é manter os dois ministérios. Mas quem
vai indicar o ministro do Meio Ambiente será o senhor Jair Bolsonaro.
O senhor já disse que haverá mudança na politica externa, para
colocar o Itamaraty sem amarras ideológicas. O senhor vai fechar
embaixada em Cuba, na Venezuela?
Olha, respeitosamente, qual o negócio que podemos fazer com Cuba?
Vamos falar de direitos humanos? Pega uma senhora que está aí de branco,
que veio no programa Mais Médicos. Falei “senhora” porque não sei se
ela é médica, não fez programa de revalidação. Pergunta se ela tem
filhos. Já perguntei. Tem dois, três, estão em Cuba. Não vêm para cá.
Isso para uma mãe, não é mais que uma tortura? Ficar um ano longe dos
filhos menores? Quem vem para cá de outros países ganha salário
integral. Os cubanos ganham aproximadamente 25% do salário. O resto vai
para alimentar a ditadura cubana? Foi acertado há quatro anos, quando
Dilma era presidente, que se alguém pedisse exílio seria extraditado. Dá
para manter relações diplomáticas com um país que trata os seus dessa
maneira? Queremos o Mais Médicos? Podem continuar. Revalida, salário
integral e traz a família para cá. Eles topam? Queremos reciprocidade.
Embaixada da Venezuela: o embaixador já veio para cá, a embaixada já foi
desativada, não temos mais contato. Agora, veio no governo do Michel
Temer, porque no governo do PT… Essa decisão teria que ter sido tomada
há mais tempo: chamar o embaixador, conversar.
O senhor anuncia mais algum ministro nesta semana?
Não tenho pressa. Você não pode anunciar o Zé hoje e amanhã dizer
“não é mais você”. Tem que ter plena certeza, porque o que está em jogo é
a minha credibilidade e a vida dele. Ele vai falar o que para os
amigos, para a família? “Olha, ele me convidou e deu agora um cartão
vermelho pra mim”? Talvez essa semana a gente anuncie mais um.
O senhor vai desfilar em carro aberto na posse?
Vou seguir religiosamente a orientação das inteligências, Polícia
Federal, Abin, Exército. Vou seguir essas orientações aí, porque estou
sendo um governo completamente diferente dos outros e desagradando muita
gente. Conseguimos entrar na máquina para quebrá-la. E só quebraremos
comigo vivo.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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