MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 3 de junho de 2018

O Judiciário e a opinião pública


Joaci Góes

Tribuna da Bahia, Salvador
17/05/2018 08:40
   


Ao advogado e jornalista Luiz Holanda.
Vem de muito longe, no tempo, o preceito segundo o qual as decisões do Judiciário não devem se subordinar aos humores cambiantes e não raramente volúveis das ruas. É igualmente antigo, porém, o entendimento de que esse princípio geral seja suficientemente flexível para aconselhar os juízes a auscultarem as aspirações populares em busca da identificação daqueles momentos em que a “voz do povo é a voz de Deus”.
A reflexão vem a propósito da postura condenável de alguns membros da Suprema Corte que têm primado pelo afoito aforçuramento na defesa de alguns dos mais notórios bandidos da vida pública brasileira, autores de crimes cujas consequências caracterizam verdadeiros genocídios, ao desviarem recursos da bolsa popular fundamentais à salvação de centenas de milhares de vidas que se perdem por falta de infraestrutura física e social imprescindível à sua segurança. Um desses ministros, de tão afinado com os criminosos, a ponto de libertá-los a mancheias, está sendo chamado de O Libertador pelos próprios colegas, em acrimoniosa ironia, como lembrou Luiz Holanda, em recente artigo.
Análises retrospectivas dos fatos revelam que se os alemães tivessem protestado, Hitler não teria levado adiante o Holocausto, de que são prova vários episódios em que o Fuhrer recuou diante da resistência da opinião pública, como expusemos em nosso livro de 2001 - A inveja nossa de cada dia. Para lembrar um desses episódios, quando mulheres alemãs fizeram passeata, por três dias, nas ruas de Berlim, exigindo a libertação de seus maridos judeus, recém-encarcerados, o governo cedeu e os seis mil prisioneiros foram soltos, sem que as esposas sofressem qualquer tipo de retaliação.
A força da opinião pública levou o pensador e historiador escocês David Hume a sustentar que o objeto da história se resume em demonstrar a importância da opinião pública como agente modelador da sociedade humana, porque até mesmo os mais sanguinários ditadores não podem prescindir dela para alimentar o ânimo dos que calam as baionetas (David Hume, History of England, 1771). Antes de David Hume, John Locke, o primeiro grande defensor do governo das maiorias, viu esta questão, assim: “O corpo político deve caminhar na direção apontada pelo poder maior que é o consenso da maioria” (Two Treatises on Government, 1690). Um pouco antes de Locke, Pascal (1623-1662) explicava que “seguimos a maioria, não porque esteja correta, mas porque tem mais poder” (Blaise Pascal, Pensées, 1670). A formulação clássica desse princípio coube ao jurista e orador romano, no segundo século antes de Cristo, Públio Múcio Scaevola, frequentemente citado e louvado por Cícero como um grande defensor público, ao enunciar: “O que a maioria do conselho decidir deve ser considerado como decisão de todos” (Quod maior pars curiae effecit, pro e o habetur, ac si omnes egerint, Digesto, Livro 1). Valendo-se dessa lição, disse Talleyrand a Napoleão: “Com as baionetas, Senhor, pode-se fazer tudo, menos sentar-se sobre elas”. Com essas palavras Talleyrand queria ensinar a Napoleão que o poder, mesmo despótico, só vale a pena quando exercido com tranquilidade, sentado no trono ou em outra cadeira qualquer. Isto é: com respaldo popular. “O mando é menos uma questão de punhos do que de nádegas” (Ortega y Gasset, La Rebelion de las Masas, 1929).
Pensamos que cada brasileiro incomodado com o modo como vêm decidindo alguns membros de nossa Suprema Corte deve manifestar sua indignação, por qualquer dos tantos meios disponíveis, se não quiser ver o nosso País entronizado como a sede de um povo, em si mesmo, essencialmente corrupto, como observou o jornalista Roberto Pompeu de Toledo.
Apoiar a Operação Lava Jato e a prisão a partir da condenação em segundo grau são requisitos fundamentais ao processo de restauração da dignidade nacional.

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